sexta-feira, 13 de outubro de 2023

Bancada evangélica avisa a Lula que Dino não terá mesmo tratamento de Zanin se indicado ao STF, Roseann Kennedy, OESP

 A Frente Parlamentar Evangélica já enviou recado ao Planalto. Se o presidente Lula da Silva indicar Flávio Dino ao Supremo Tribunal Federal (STF), o atual ministro da Justiça e Segurança Pública não terá a mesma abertura que Cristiano Zanin teve com a bancada evangélica no Senado. Quem avisa é o líder do grupo na Casa, o senador Carlos Viana (Podemos-MG), que não esconde sua preferência pelo advogado-geral da União, Jorge Messias.

O senador Carlos Viana (Podemos-MG)
O senador Carlos Viana (Podemos-MG) Foto: Roque de Sá/Agência Senado

“Flávio Dino enfrentará nossa resistência pela bancada evangélica do Senado. Nós o temos como um ‘ditador’ cujo passado no governo do Maranhão não é referência ao cargo. Jorge Messias, apesar de pouco envolvido no movimento evangélico, é batista e seria visto como um gesto de pacificação do presidente Lula com nosso segmento”, afirma Viana, à Coluna.

O senador afirma ter sido procurado por lideranças do PT, que o questionaram sobre como a bancada evangélica se comportaria com Dino. “Sempre dei a mesma resposta”. Nos bastidores os evangélicos deixam claro que não somente estão fechados ao diálogo, como trabalharão contra a nomeação de Dino. As indicações ao Supremo precisam ser confirmadas no plenário do Senado.

quinta-feira, 12 de outubro de 2023

Imperativo, como não usar, José Henrique Mariante, FSP

 

Ainda que redes sociais e mecanismos de busca condicionem títulos e textos noticiosos de maneira cada vez mais contundente, certas regras insistem em perdurar. A maioria dos enunciados da Folha, por exemplo, continua no tempo presente, o tempo do jornalismo, apesar de esforços em contrário. A lista de coisas a se evitar também continua importante, como o gerundismo e o deselegante imperativo.

"Privatize-se", escreveu a Folha em editorial na noite de terça-feira (3), após o dia de transtornos provocados pela greve de funcionários do transporte público em São Paulo. Mais do que forma verbal, como descreveu Thiago Amparo, uma ordem a um estado em que 43% recusam a proposta de privatizar empresas e serviços.

A greve é política, argumentou o jornal, como se isso bastasse para justificar a venda de qualquer coisa. O colunista notou que a greve é sim política e que isso não é um problema. Ruim é despolitizar a vida. E, pelo contrário, o que mais precisamos no inferno paulistano é buscar consensos, discutir os rumos da cidade.

A greve é ilegal, martelou o editorial e também o jornal em seus títulos principais sobre o evento. A manchete do impresso foi "Greve em SP para trens e desobedece juiz", em tom inconformado, quase editorializado. Qual greve ocorre sem embate judicial, sem flertar com a confusão, perguntou o ombudsman em crítica interna. Era muito mais fácil relatá-la como o que foi, uma manifestação pública contra as planejadas privatizações do governo Tarcísio de Freitas. Ou, melhor ainda, que o dia de caos antecipava a disputa eleitoral de 2024, como concluiu em análise Igor Gielow.

Folha, no entanto, se mostra intolerante ao tratar do assunto, que virou uma espécie de prioridade do jornal desde agosto do ano passado, quando outro editorial, com título mais polido ("Privatizar é bom"), sublinhava aos então candidatos à Presidência que o assunto era um tema importante. As ameaças antidemocráticas já faziam o país arder, mas havia um recado a ser dado. Talvez a leitora e o leitor esperassem demandas diferentes, mas aí já é outra história.

Na ilustração vemos um grande martelo preto de leilão atingindo a palavra "leitor".
Folhapress

Daquele editorial ao da última semana, 15 textos sobre privatização ou que citavam a temática foram publicados pela seção de Opinião, um por mês desde agosto último. Não é uma frequência acima do normal, ainda mais para um assunto em pauta, mas o problema não está nisso. O que distingue a defesa do sistema de outras tantas bandeiras levantadas e conduzidas pela Folha é a veemência, escancarada na escolha do último enunciado, na ordem proferida. O jornal escreveria "Legalize já"?

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Não se discute aqui as razões para tamanho esforço, mas a forma. Como no caso da cobertura da greve, seria bem mais simples ampliar o debate e conceder espaço justo para o contraditório. O próprio jornal constatou em suíte na última semana que o transporte sobre trilhos privatizado é "raro em metrópoles"; a linha concessionada da CPTM é um fracasso a olhos vistos; por que não promover um seminário sobre reestatizações de saneamento ocorridas em outros países. Sobram caminhos.

Interditar o debate é o que os dois lados da disputa política almejam. A Folha pode e deveria fazer diferente.

PRIORIDADES

Os jornais têm suas bandeiras, mas é forçoso constatar que ambiente raramente é uma delas. Em uma semana de disputas institucionais em Brasília e violência no Rio, não faltou notícia. É preciso registrar, porém, que o único diário entre os quatro grandes do país a se impor uma manchete para a calamidade da seca na Amazônia foi o Valor Econômico.

Faz lembrar "Não olhe para cima", outro título imperativo.

BARRA PESADA

chope entre amigos que virou tragédia presumidamente por um deles ser parecido com um alvo miliciano foi filmado por algumas câmeras no Rio. Na manhã de quinta-feira (5), quase todos os sites mostravam as imagens.

Na Folha, a coisa foi publicada como chegou, limpa, com toda ação captada. Em O Globo, alguns borrões nos corpos caídos. Em O Estado de S.Paulo, todo o lado das vítimas borrado, restando intacta apenas a movimentação dos atiradores entre o carro e o quiosque.

Há evidente interesse jornalístico em mostrar as imagens, mas a pergunta é até que ponto: se é de fato necessário revelar toda a carnificina ou se é suficiente transmitir uma breve noção de sua materialidade; sé é razoável, em nome da informação, revitimizar quem é próximo aos chacinados.

Folha decide a exposição de imagens assim caso a caso. Não mostrou o estupro na sala de parto e recuou na transmissão do ataque na escola. Deveria ter se contido também neste último episódio. Imagens precisam denunciar alguma coisa para serem publicadas. Apenas confirmar nossa estupidez não é requisito.


Se Congresso quer os poderes do STF, tem que criar coragem para defender a democracia, Celso Rocha de Barros, FSP

 Nesta semana, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou uma proposta de emenda constitucional que limita as decisões monocráticas dos ministros do STF e altera as regras para pedidos de vista durante julgamentos da suprema corte.

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, patrocinou esse ataque ao Supremo para garantir que seu grupo político receba os votos dos senadores bolsonaristas na próxima eleição para presidente da casa.

Mas não é só isso que está em jogo: há congressistas que acreditam que o STF vem tomando decisões que deveriam ser do Congresso.

Curiosamente, a ofensiva contra o STF prova que Alexandre de Moraes, quando combateu o golpe bolsonarista durante a campanha de 2022, atuava com a bênção não apenas dos outros membros do tribunal (que poderiam ter revertido suas decisões em plenário, mas não o fizeram), mas também do Congresso.

A Praça dos Três Poderes e o Congresso Nacional, em Brasília - Pedro Ladeira - 4.mar.2020/Folhapress

Afinal, o Congresso poderia ter feito o que fez semana passada muito antes. Poderia perfeitamente ter proposto mudanças no STF durante o governo Bolsonaro, limitando a margem de ação de Moraes.

Não o fez porque todos, repito, todos os atores políticos importantes do Brasil sabiam que Bolsonaro pretendia destruir a democracia. Por mais que isso irrite muitos congressistas, só a democracia lhes paga salário.

Em outros termos, o Congresso Nacional sancionou as decisões de Alexandre de Moraes contra o golpismo, da primeira à última.

Acho até saudável que o Congresso, ou outras instituições da República, desejem assumir para si os poderes que o STF usou para defender a democracia. Teria sido melhor mesmo se o ex-procurador-geral da República Augusto Aras tivesse feito seu trabalho. Teria sido incomparavelmente melhor se o Congresso tivesse aprovado o impeachment de Bolsonaro, não só pelo golpismo, mas, sobretudo, pelo assassinato de mais de 100 mil brasileiros durante a pandemia, crime amplamente documentado pelos próprios congressistas na CPI de 2021.

Mas, antes de defendermos que o STF devolva poderes ao Congresso, precisamos perguntar: os congressistas já criaram coragem para usá-los no caso de nova ameaça golpista? Na última vez, ficaram quietos em troca de orçamento secreto e deixaram o trabalho para Alexandre de Moraes.

É o mesmo debate do "semipresidencialismo", a proposta de oficializar e ampliar as transferências de poder do presidente para o Congresso que ocorreram entre 2015 e 2022. Antes de descobrir a doutrina dos três Poderes na semana passada, o Congresso passou sete anos tomando do Executivo poder sobre o gasto público.

O problema é que, nem no caso do poder que tomou do Executivo, nem no caso do poder que pretende tomar do Judiciário, o Congresso parece disposto a chamar para si as correspondentes responsabilidades.

Se o Congresso quiser mais poder sobre o gasto público, que instaure logo o parlamentarismo e leve a culpa se a economia for mal. Se o Congresso quer limitar os poderes do STF, que assuma ele mesmo a defesa da democracia, começando por expulsar de seu meio parlamentares que apoiaram o golpe. São algumas dezenas.

Se o Congresso quer dividir com o STF a tarefa de defender a democracia, acho ótimo. Meu medo é que a lenta erosão dos outros Poderes pelo centrão que controla o Congresso gere um semipresidencialismo com uma semiconstituição.