Motos por aplicativo estão em grandes cidades pelo mundo. Em Jacarta e Bancoc, fazem parte da paisagem. Em Nova York ou Londres, existem apenas como serviços pontuais, para driblar o trânsito e chegar ao aeroporto, por exemplo. O passageiro recebe capacete e até colete com airbag.
No Brasil, eles surgiram na década de 1990 e hoje estão em toda parte, muitas vezes sem regulamentação. A polêmica em São Paulo apareceu quando os gigantes Uber e 99 anunciaram sua operação, proibida desde a gestão Bruno Covas. A 99 chegou a ignorar a proibição e a prefeitura reagiu, confiscando as motos dos conveniados. O imbróglio agora está na Justiça.
Se tem oferta é porque tem demanda
Independente da questão legal, vale a pena investigar a origem da demanda. Por que alguém se sujeita a sentar na garupa da moto de um desconhecido, pagar mais que uma tarifa de ônibus e ainda enfrentar o trânsito pesado num veículo relativamente inseguro?
Há várias respostas. Para suprir uma lacuna do transporte público. Para levar um pacote pesado pelas subidas estreitas de uma favela. Pelo medo de ficar parada num ponto de ônibus mal-iluminado à noite.
É, portanto, na micromobilidade, ou na última perna do transporte, que está nossa carência: menos de metade dos paulistanos mora a menos de 500 metros de um ponto de ônibus ou 1 km de estação de trem ou metrô. Em Paris, é quase 100%. Isso significa que as pessoas saem do transporte público e ainda têm que enfrentar distâncias, subidas e insegurança para chegar as suas casas.
Se a mobilidade é um sistema, está faltando um pedaço fundamental e a prefeitura deve repensar a função de cada modal no sistema.
Como rever as linhas de ônibus para que cheguem mais perto das casas dos usuários, principalmente nas periferias? Como melhorar o acesso de pedestres e ciclistas até o transporte público? Como incluir os aplicativos na equação? E, claro, como garantir que um serviço de moto (ou patinete, ou o que vier) possa ser regulamentado, testado, avaliado, melhorado, ou, se não der certo, proibido?
O trânsito de São Paulo já é mortal, mesmo sem motos por aplicativo
A preocupação da prefeitura com a segurança é bem-vinda. Mas esconde o fato de tê-la negligenciado nos últimos anos.
O ano de 2024 marcou mais um recorde nefasto, 1.031 mortes no trânsito. Enquanto metrópoles globais diminuem velocidades e aumentam transporte público, São Paulo anda para trás.
A resposta da prefeitura à mortalidade generalizada tem se restringido às faixas azuis. É possível que elas ajudem na fluidez, mas estão em uma fração mínima das vias. Para todo o resto, o plano de segurança viária segue abandonado e a ausência de fiscalização é um sintoma do descaso.
A curto prazo, não dá para fugir da discussão estruturada do transporte em motocicleta (e a própria Folha promoveu um seminário interessante nessa semana). Provavelmente, será melhor regular, fiscalizar e corrigir rotas do que deixar na informalidade.
Melhor, porém, será quando a gestão municipal se dispuser a rever o confuso sistema atual de mobilidade e voltar a fiscalizar as ruas para evitar que tanta gente morra no trânsito todo dia.
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