terça-feira, 4 de outubro de 2022

Ciro acompanha PDT e anuncia apoio a Lula, mas com críticas e sem citá-lo, FSP

 Quarto colocado nas eleições de 2022, Ciro Gomes anunciou nesta terça-feira (4) apoio a Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no segundo turno contra Jair Bolsonaro (PL), em decisão que acompanha a do PDT e que ocorreu após a campanha do petista endossar três propostas do pedetista.

pronunciamento de cerca de 3 minutos foi divulgado pouco depois de o partido formalizar o apoio a Lula, após reunião da Executiva realizada de forma virtual e presencial, na sede do partido, em Brasília.

"Frente às circunstâncias, é a última saída", disse Ciro. Ele afirmou lamentar que a "trilha democrática tenha afunilado a tal ponto que resta aos brasileiros uma opção, a meu ver, insatisfatória."

"Não acredito que a democracia esteja em risco nesse embate eleitoral, mas sim no seu absoluto fracasso na nossa democracia de construir um ambiente de oportunidades que enfrente a mais massiva crise social e econômica que humilha a esmagadora maioria do nosso povo".

Pedetista Ciro Gomes
Pedetista Ciro Gomes após votar em Fortaleza - Stephan Eilert/AFP

Ciro, a seguir, criticou a "campanha violenta" da qual foi vítima, mas afirmou que não vai se ausentar da luta pelo Brasil. "Sempre me posicionei e me posicionarei na defesa do país contra projetos de poder que levaram o nosso povo a essa situação grave e ameaçadora."

Ele disse ainda esperar que a decisão ajude a oxigenar, mesmo que temporariamente, a democracia. "Mas se não houver a busca efetiva de novos ares, de novos instrumentos, estaremos a mercê de um respirador artificial frágil e precário, limitadíssimo no tempo e no espaço."

No vídeo, Ciro ressaltou que não pleiteia e não vai aceitar cargos em um "eventual futuro governo".

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"A povo brasileiro me dirijo: fiquem certos que, como sempre fiz, vou fiscalizar, acompanhar e denunciar qualquer desvio do governo que assumirá em janeiro", disse.

Mais cedo, o presidente do PDT, Carlos Lupi, havia dito que Ciro concordava com a decisão do partido. "O Ciro não viajará, ficará aqui no Brasil e já declarou o apoio ao partido."

Como a Folha antecipou, o PDT decidiu apoiar o PT após Lupi conversar com a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, na segunda-feira (3) e sugerir a ela a incorporação de três propostas de Ciro: o programa que prevê zerar dívidas do SPC, o plano de renda mínima e um projeto de educação em tempo integral.

"Tomamos uma decisão unânime, sem um voto contrário, e eu repeti isso três vezes porque se tivesse voto contrário poderia registrar em ata, está gravado, a decisão de apoiar o mais próximo da gente, que é a candidatura do Lula", afirmou Lupi nesta terça. O presidente do PDT deve ir a São Paulo ainda nesta terça para se reunir com Lula.

Durante a campanha, Ciro fez uma série de ataques a Lula, principalmente após a pressão do PT pelo voto útil. Lupi contemporizou e lembrou das divergências entre o ex-governador Leonel Brizola e Lula.

Perguntado como Ciro faria para apoiar o petista depois de todas as declarações dadas durante a campanha, Lupi brincou e disse que a eleição já teve até "padre de quadrilha junina na campanha".

"O processo político às vezes se acirra de uma maneira, e eu vivenciei disso do Brizola com o Lula, lá em 1989. É uma coisa muito forte, mas isso não impediu o Brizola de estar com o Lula na campanha."

Lupi afirmou que derrotar Bolsonaro é prioridade absoluta do partido. "Derrotar Bolsonaro é uma causa nacional, uma causa da pátria, uma causa dos democratas."

"Essa decisão é de apoio ao presidente Lula porque ele representa uma aproximação maior com nosso ideário. Não é o nosso ideário, não é o que a gente lutou para ser, mas é o mais próximo, e principalmente um não muito grande ao Bolsonaro e o que ele representa", ressaltou o presidente do PDT.

"Bolsonaro, na nossa opinião, representa o atraso do atraso do atraso desse país, um aspirante a ditador, malversador do dinheiro público, um homem da falsa fé cristão", disse, acrescentando que não admitirá nenhum pedetista apoiando o atual presidente.

Após terminar o primeiro turno em quarto lugar, Ciro adiou por "algumas horas" o anúncio sobre seu posicionamento para o segundo turno.

"Nunca vi uma situação tão complexa, tão desafiadora, tão potencialmente ameaçadora sobre a nossa sorte como nação", disse ele na noite de domingo (2), após a divulgação do resultado do pleito.

"Por isso, peço a vocês mais algumas horas para conversar com meus amigos, conversar com meu partido, para que a gente possa achar o melhor caminho, o melhor equilíbrio para bem servir a nação brasileira", continuou o candidato, que teve cerca de 3,5 milhões de votos, ou 3% do total.

Ciro terminou a corrida com 3,04% dos votos, atrás de Simone Tebet (MDB), que teve 4,16%. Neste domingo (2), Lula recebeu 48,43% dos votos válidos e o atual chefe do Executivo, 43,20%.

Em uma situação inédita, Ciro terminou em terceiro lugar no Ceará, sua base política, e viu seu candidato ao governo, Roberto Cláudio (PDT), encerrar a disputa também na terceira colocação. O petista Elmano de Freitas foi eleito no primeiro turno com 51% dos votos.

A eleição no Ceará rachou a família Ferreira Gomes. Cid e Ivo, irmãos de Ciro, apoiaram Elmano na reta final da corrida ao governo. "Eu dei minha vida ao povo cearense e algumas lideranças, todas que ajudei a formar, se reuniram e meteram a faca nas minhas costas", afirmou o candidato do PDT à Presidência da República, no dia 26 de setembro, em entrevista ao Flow Podcast.

Durante a eleição, ele foi duramente criticado por um aceno à direita, visto em entrevistas ao programa Pânico, da Jovem Pan, emissora considerada a voz do bolsonarismo, e ao programa do podcaster e youtuber Bruno Aiub, conhecido como Monark, desligado do Flow após defender o direito de existência de um partido nazista.

Ciro também foi alvo de ataques quando postou, no último sábado (1º) em suas redes sociais, um pedido de voto em que usou, como imagem, uma foto ao lado de Jair Bolsonaro (PL). O candidato do PDT aparece na imagem fazendo com as mãos o número do seu partido, o 12.

A estratégia de buscar um eleitor de centro-direita ocorreu em reação à ofensiva do PT pelo voto útil em Lula para tentar encerrar as eleições no primeiro turno.

Vera Iaconelli - A escolha adolescente, FSP

 Para o adolescente a ideia de se sustentar pode parecer tão remota quanto o pico do Everest visto ao nível do mar. Sustentar aponta para dois sentidos: bancar as contas e bancar suas próprias escolhas. 

Quanto à escolha profissional, me refiro aos jovens que têm o privilégio de poder escolher, num país em que o índice de desemprego chega a 27% na faixa dos 18 e 24 anos. 

Os que podem se perguntam como saberão se aos 40 ainda estarão a fim do que escolheram aos 16. Ou ainda, o que escolher quando glamour e mídia —ideais vendidos nas redes sociais— parecem ser a única possibilidade de carreira de valor? Ou quando se imagina que trabalhar no que se gosta seja sinônimo de sentir-se eternamente em férias.

Do outro lado dessa história, temos adultos em análise vivendo uma profunda crise quanto à escolha profissional que fizeram na adolescência. 

Carreiras bem-sucedidas e bem remuneradas não vêm necessariamente acompanhadas de satisfação pessoal. 

Anos de faculdade, estágio, empregos ou empreendedorismo podem desembocar na difícil constatação de que “não era bem isso que eu queria” ou “deixei de querer isso”. 

Estabilidade econômica e expectativas sociais não são fáceis de descartar. Você pode depender disso para viver e ainda ter outros que dependam de você. Pode temer deixar de ser admirado se 
mudar de carreira. 

Alguns acabam aproveitando da condição familiar para se furtarem à decisão profissional 
seja porque têm outra fonte de renda, seja porque o companheiro/companheira banca a casa. Não sem frustração e culpa, por vezes descarregada naqueles que os sustentam. 

Um jeito recorrente de “lidar” com essa situação, qual seja, ganhar dinheiro e ter reconhecimento social fazendo o que não gosta de fazer, é, obviamente, adoecer. Deprimir, por exemplo, quando a profissão vai bem, é uma saída desesperada, que cria a oportunidade, nem sempre aproveitada, de parar e repensar as escolhas. 

“Não trabalho porque estou deprimido” ou “estou deprimido porque não trabalho” podem dar lugar ao surpreendente “estou deprimido porque não consigo bancar que não quero fazer isso que 
acho que devo fazer”. 

Muitas outras expressões de sofrimento aparecem no cardápio da tentativa do sujeito de ouvir seu desejo.

Nessa reavaliação das escolhas é comum o paciente constatar que em algum momento da adolescência refugou diante do próprio desejo. O gosto por literatura deu lugar à carreira administrativa, o amor pela docência se tornou advocacia, e a vocação para medicina submergiu aos negócios familiares. 

O que se escolhe, quando não se escolhe o desejo próprio? Escolhe-se satisfazer o suposto desejo dos outros. Escolhe-se a fantasia onipotente de, primeiro, saber o que o outro deseja —triste notícia, nem ele sabe— e, segundo, ser capaz de dar-lhe isso. 

Um homem se queixa de que, ao realizar o “sonho do pai” de se tornar engenheiro, percebe, inesperadamente, raiva e frustração no pai. Afinal, foi o filho que se tornou engenheiro, não ele. 

Uma senhora diz que ao encerrar uma carreira que ela só suportava à base de antidepressivo, suposta realização do desejo dos pais, viu a mãe largar um casamento torturante de décadas. “Ainda dá tempo”, teria dito a mãe diante da emancipação da filha.

Quem pensa que adolescência é uma festa ou teve amnésia ou não chegou na idade adulta. Ainda que difícil, bancar o próprio desejo o quanto antes, sem muita idealização e sem jogar na conta dos 
outros, é mais promissor.