Ao vedar, nas seções de votação, o uso de aparelho celular ou qualquer instrumento que possa devassar o sigilo do voto, o Tribunal Superior Eleitoral apenas exerceu a sua competência para dispor sobre o modo adequado de execução da lei.
O Código Eleitoral prevê essa atribuição em regime de correspondência com o que também é estabelecido para o Poder Executivo, que pode e deve, nas matérias de sua competência, expedir atos inferiores às leis, mas de feição normativa. Por vezes, determinada lei não prevê todas as formas possíveis de sua execução e cabe ao Poder respectivo expedir instruções, resoluções e regulamentos que venham a garantir a fiel execução da ordem legal.
A legislação, a par de estabelecer expressamente essa função do TSE, prevê também que o eleitor não pode exercer validamente o seu direito ao voto munido de filmadora, de câmera fotográfica e de aparelho celular. A vedação já consta da lei desde 2009, quando se promoveu uma das muitas mudanças da lei eleitoral. Basta ler o regramento: "Fica vedado portar aparelho de telefonia celular, máquinas fotográficas e filmadoras, dentro da cabina de votação". E as sanções possíveis também estão previstas na lei eleitoral.
Ao contrário do que sustentam os críticos, a lei ou a resolução não prevê a perda ou a cassação de direitos políticos. Entre a suspensão de direito político (que somente ocorre nas hipóteses previstas na Constituição) e a perda desses direitos (vedada sempre) há uma abissal diferença. O eleitor que se recusar a entregar a câmera fotográfica ou celular não estará habilitado ao exercício do seu direito, que segue mantido. E a recusa, com a causação de perturbação, por exemplo, pode indicar a prática de um crime. Tudo como a lei determina.
O propósito da vedação e da regulamentação que a secunda é óbvio: impedir que seja devassado o sigilo do voto. Não permitir que alguém possa ser estimulado a divulgar o próprio voto. O sigilo do voto constitui direito-dever; direito a ser observado e dever a ser mantido.
A decisão não inovou nem concedeu para a norma sentido diverso daquele já estabelecido e, por isso, não se pode falar em ativismo judicial, usurpação ou abuso. Muitos confundem o ativismo com a mera judicialização das questões levadas aos tribunais, e é o que se tem aqui. O TSE atendeu a uma consulta formulada por um partido político. Isso nunca poderá ser tido como exemplo de ativismo ou de usurpação da função de outro Poder. Ao contrário, o abuso está no incentivo à divulgação do conteúdo do voto.
Qualquer interpretação diversa significa negar o texto da lei e o sentido óbvio que dela decorre. Supor que o eleitor possa portar o celular, mas mantê-lo desligado, será um convite para a fraude, alimentado pela espetacularização que agora se deu ao tema. E se há discordância em relação à proibição, que a lei seja alterada, porque é dela que deriva a proibição.
O TSE decidiu corretamente. A democracia tem no voto a sua energia revigorante. Conspirar contra ele, permitir que sejam concebidas formas de colocá-lo em disputa, publicizando e mercantilizando o seu conteúdo, não apenas constitui crime —é também um grave e terrível atentado ao Estado social e democrático de Direito.