sábado, 25 de dezembro de 2021

Alckmin se reinventa ao flertar com Lula, atrai críticas e deixa órfãos, FSP

 Carolina Linhares

SÃO PAULO

"Quem diria?" era o comentário geral entre políticos no jantar que uniu publicamente o ex-presidente Lula (PT) e o ex-governador Geraldo Alckmin (ex-PSDB), que caminham para formar uma chapa à Presidência da República em 2022.

O espanto se devia às transformações de Alckmin, que sorria, disse estar à vontade e foi abordado com diversos pedidos de fotos. De adversário a aliado. De derrotado em 2018 a possível vice-presidente do Brasil. De tucano a entusiasta da candidatura petista.

A reunião do ex-presidente Lula (PT) e do ex-governador Geraldo Alckmin (ex-PSDB) em um jantar, no domingo (19), promovido pelo grupo de advogados Prerrogativas - Ricardo Stuckert/Divulgação

O retrofit de Alckmin, como definiu o ex-governador Márcio França (PSB), não ocorre sem custos. Aliados mencionam, por exemplo, que Alckmin passou pelos gritos de protesto contra a aliança por parte de um grupo petista em sua chegada ao jantar.

A eventual aliança com Lula tornou-se alvo de crítica de setores da esquerda, mas também de eleitores de Alckmin e até do grupo de políticos paulistas que rodeiam o ex-governador. Bolsonaristas e apoiadores do governador João Doria (PSDB) também passaram a explorar o desgaste.

Contra os questionamentos, Alckmin retomou publicações nas redes sociais lembrando feitos no governo e também fez posts em tom descontraído, buscando atrair simpatia.

Até que a hipótese de ser vice ganhou corpo, Alckmin vinha costurando sua candidatura ao Governo de São Paulo em 2022. Segundo pesquisa Datafolha do último dia 18, ele lidera a corrida com 28%.

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Nas redes sociais de Alckmin, eleitores reclamam da aproximação com o PT. "Não faça aliança com o PT. Seja governador de SP", diz um.

"Pelo poder está vendendo a alma ao diabo", comenta outro. "Nunca mais terá meu voto. Decepção total."

Aliados de Alckmin no estado admitem que, caso o ex-governador dispute a vice, esses eleitores ficarão órfãos e que eles próprios não sabem quem apoiar na disputa paulista.

Mencionam como opções França e Fernando Haddad (PT), que lideram na pesquisa estadual em cenário sem Alckmin e que, para eliminarem seu concorrente, costuram o acerto nacional com Lula. PT e PSB não entraram em acordo sobre qual dos dois candidatos deve ser o palanque de Lula-Alckmin em São Paulo.

Um apoio ao candidato do PSDB, Rodrigo Garcia, que é vice de Doria, não é descartado por parte dos hoje alckmistas e seria, de acordo com eles, um movimento natural do eleitor. Ainda que Doria seja desafeto de Alckmin –a candidatura de Garcia foi o que empurrou o ex-governador para fora do partido que ajudou a fundar há 33 anos.

De acordo com o Datafolha, os votos de Alckmin migrariam principalmente para Haddad (30%), França (19%) e Garcia (13%). No cenário sem Haddad, vão para França (32%), Garcia (18%) e Guilherme Boulos (PSOL, 10%).

Para ser vice de Lula, Alckmin se filiaria provavelmente ao PSB, mas Solidariedade e PV também ofereceram legenda. O PSD, que queria Alckmin concorrendo ao Palácio dos Bandeirantes, já busca um plano B no estado.

Nos bastidores, tucanos do grupo de Alckmin dizem que a união com Lula é fora da curva para um político tido como de centro e que a ausência do ex-governador no pleito estadual abre um vácuo. Praticamente só sobram candidatos palanques de Lula, Jair Bolsonaro (PL) ou Doria –e há quem não queira nenhum dos três.

Segundo eles, a maioria dos apoiadores de Alckmin rejeita a aliança e o ex-governador sabe disso. Nomes próximos do ex-tucano têm recebido reclamações de todo o estado. Para eles, Alckmin vê mais chances de se eleger vice de Lula do que governador de São Paulo.

Mas há também quem apoie a chapa com Lula, mesmo admitindo haver certo estrago para Alckmin.

"Acho bom, chega de divisão. Lula vai ganhar eleição com ou sem Alckmin. Vamos amansar um pouco, puxar Lula para o centro, maneirar o radicalismo que hoje vive o Brasil. Alckmin vai ajudar Lula, vai trazer a classe média, dar confiabilidade", afirma Pedro Tobias, ex-presidente do PSDB-SP e aliado de Alckmin.

"Tem eleitor que fica revoltado, depois de votar quatro vezes [em Alckmin para o Governo de SP]. O voto da direita ele não vai ter mais. Alckmin vai perder ponto, mas para Lula é um ganho e para o país, mais ainda", completa.

"É uma decisão de alguém que está pensando no Brasil diante de um adversário comum, que é o Bolsonaro. Esse modo de governar sem direção e sem agenda que levou o país à falência", afirma o ex-deputado Floriano Pesaro, que também defende a escolha de Alckmin.

"Alckmin tem clareza do que foi o governo Lula no passado, suas qualidades e defeitos. Foi voltado para o desenvolvimento social em que pesem as muitas denúncias de corrupção. Ele acha que o futuro é melhor do que o passado, ele fala isso sempre e eu concordo. Os erros do passado não serão mais cometidos."

Depois do jantar, a aliança Lula-Alckmin serviu de munição para bolsonaristas, que passaram a resgatar falas do ex-tucano contra o petista. O ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP), comparou a um "cruzamento de porco-espinho com capivara".

Perfis de apoio a Doria também passaram a veicular que a fama de traidor e oportunista agora recai sobre Alckmin. Estrategistas do governador dizem acreditar que Alckmin cairá na irrelevância e que é Garcia quem vai se beneficiar dos eleitores desapontados com o ex-tucano.

Pesaro rebate e diz que a difamação não atinge Alckmin, que só mudou de projeto após ser impedido por Doria.

"Nossa tendência é apoiar França, porque não tem como ficar no meio dos neotucanos, a prática deles é diferente do tucano raiz. Acho que Garcia é um bom sujeito, mas tem a fraqueza de carregar o governo Doria. Eu mesmo sou vítima do dorismo", afirma o ex-deputado.

O presidente do PSDB, Bruno Araújo, classificou a aliança de Alckmin com Lula de "erro histórico". Na esquerda, a aposta é que as críticas ao chamado "picolé de chuchu" serão silenciadas pela bênção de Lula ao agora aliado.

Enquanto petistas lembram a relação conflituosa de Alckmin com professores, por exemplo, aliados do ex-governador afirmam que a aproximação com o PT não é tão esdrúxula e que o ex-tucano é humilde, toma café na padaria e sempre teve olhar social, mencionando o Bom Prato.

O Datafolha mostra que Alckmin tem mais intenção de voto entre quem tem ensino fundamental (33%) do que entre quem tem ensino superior (19%); entre quem recebe até dois salários-mínimos (31%) do que entre quem recebe mais de dez (21%). Alcança 35% entre donas de casa e 29% entre desempregados.

O ex-tucano, porém, tem dificuldade em outros setores simpáticos à esquerda, como os funcionários públicos (18%) e os estudantes (15%).

sexta-feira, 24 de dezembro de 2021

PEDRO DORIA O Brasil está sob ataque de um grupo hacker, lInk OESP

 

Imagem Pedro Doria

PEDRO DORIA

O Brasil está sob ataque de um grupo hacker

O Estado está sendo atacado concretamente em sua infraestrutura essencial e o presidente está de férias no Guarujá, dançando funk

23/12/2021 | 18h21

 Por Pedro Doria - O Estado de S. Paulo

    Druk - Mais uma Rodada é o tipo de filme que acontece quando os problemas acaba, Omelete

     O sucesso de Druk - Mais uma Rodada extrapolou as fronteiras da Dinamarca e o filme cavou uma indicação ao Oscar de melhor diretor, para Thomas Vinterberg, e ao Bafta de melhor ator, para Mads Mikkelsen. Isso dá a entender que é universal o apelo desta comédia dramática, mas talvez Druk seja mais interessante naquilo que revela das especificidades da sociedade escandinava em geral e dinamarquesa em particular.

    A premissa renova os valores do carpe diem, num contexto de crise de meia idade, e é bastante linear na sua previsibilidade. Mikkelsen lidera um quarteto de professores de colégio que testam uma teoria pra ver se funciona: beber todo dia uma certa dosagem de álcool para operar socialmente em um estado de graça, de forma segura. Basicamente Vinterberg faz todo um filme para reforçar que é preciso beber com moderação, e o fato de cativar as pessoas com essa obviedade talvez fale algo sobre as qualidades de Druk.

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    Quais são elas? Bem, antes é preciso assumir que Druk realmente cativa seu público, e parte central disso seria o carisma de Mikkelsen, um raro ator escandinavo que conseguiu fazer a transição para Hollywood sem ficar preso em tipos cerebrais, insensíveis ou estoicos. Mikkelsen já fez todos esses papéis, claro, mas ele carrega consigo uma malícia que parece dizer: “Estou fazendo o tipo bruto e dedicado aqui mas no fundo atuar não é tão difícil e pode ser inclusive divertido”. Mikkelsen é um herdeiro digno do recém-falecido Max von Sydow nesse sentido, e brilha em Druk porque este parece um filme feito para tornar essa malícia mais latente. 

    Trabalhemos, porém, com a hipótese de Druk atrair as pessoas por outro motivo: uma certa dissociação. Em psicologia se define a dissociação como um estado mental em que se bloqueiam pensamentos, memórias e afetos quando são chocantes demais para a consciência lidar. Trazendo para o contexto do filme, é como beber para (se) esquecer. Na superfície, Druk está entregando uma moral da história muito simples em favor da alegria de viver. Ainda assim, não deixa de ser também um filme sobre uma sociedade tão privilegiada que seu maior problema hoje é o enfado com o mundo - e essa verdade profunda talvez seja chocante demais para a gente lidar, nós, os não-dinamarqueses.  

    O que então tornaria Druk, metafórica e ironicamente, um filme a que se assiste embriagado. Vinterberg recorre a todo tipo de familiaridade para nos amaciar aos poucos: satiriza a política, encerra a adolescência na esfera da alienação e da inconsequência, lamenta dramas domésticos consagrados do mundo masculino como crianças trabalhosas e esposas carrascas. Tudo isso é “universal” na medida em que são alvos fáceis em qualquer lugar: toda política é “satirizável”, os adolescentes nunca estão presentes para se defender, e as mulheres continuam ocupadas lá com os problemas do mundo real. Essa é a bolha a que o filme nos convida, confortável como um conhaque.

    Estourando essa bolha, porém, revelam-se ao espectador as coisas dinamarquesas que ficaram subterrâneas por dissociação - e elas são fascinantes para nós, porque não nos dizem respeito, em absoluto. Isso vai desde a resposta escandinava à embriaguez, que é desconcertantemente anti-erótica (até o superbritânico Ou Tudo ou Nada se permite acessar pulsões secretas, enquanto em Druk o máximo da fantasia é a velha lutinha dos meninos no começo do filme) até o entendimento que se faz do desvario (“O que fulano faria agora se estivesse aqui?”, Mikkelsen pergunta, e a resposta é tão ~louca~ quanto ir a um restaurante, comer camarões sem a casca e as perninhas).

    Enquanto o mundo atravessa a pandemia, em Copenhague o assunto do momento é o papel triunfante de Churchill na guerra. A decisão de Vinterberg de cortar a narrativa com cartelas pretas até na hora de mostrar mensagens de celular - ou seja, de resolver questões dramáticas “fora do filme” - só reforça essa sensação de deslocamento e de alienação. O anacronismo chocante de testemunhar os privilégios dinamarqueses em plenos anos 2020 não deixa de ser um fator de coincidência que contribui para o apelo do filme. Ou anti-apelo, por assim dizer.

    Se tirarmos toda a dissonância, porém, talvez Druk não tenha muito mais a oferecer além das lições de moral sobre a hipocrisia escandinava, tema a que Vinterberg sempre retorna como seu porto seguro, desde que Festa de Família o projetou mundialmente no longínquo ano de 1998, quando o cinema dinamarquês ainda reivindicava para si alguma relevância no cenário dos festivais. Druk é o que acontece quando os assuntos e principalmente os problemas acabam.