sábado, 7 de agosto de 2021

Os 'facilitadores' no governo, Cristina Serra, FSP

 A maior concentração de vigaristas por metro quadrado da Esplanada gravitou (gravita?) em volta do Ministério da Saúde no momento em que mais precisávamos de gente séria e especializada para salvar as nossas vidas e as de parentes e amigos.

Os holofotes da CPI da Covid no Senado jogaram luz sobre novos personagens, mostrando como se conectam as engrenagens de um submundo de crimes e trambiques em torno das grandes compras e aquisições do governo Bolsonaro. Constata-se que havia um ministério subterrâneo, operado por “facilitadores”, autodefinição de Airton Soligo, assessor do então ministro Eduardo Pazuello.

O ex-assessor do Ministério da Saúde Airton Soligo, em depoimento à CPI da Covid - Pedro Ladeira - 5.ago.21/Folhapress

Soligo —que tem o sugestivo apelido de Cascavel— atuou durante dois meses sem nomeação oficial, sem agenda pública, sem assinatura de atos. Uma atuação clandestina e muito conveniente para quem não quer deixar rastro nem prestar contas a ninguém, a não ser ao chefe.

Outro “facilitador” é o reverendo Amilton Gomes de Paula, que abria portas com impressionante facilidade e rapidez para negociar vacinas de vento. O repórter Lúcio de Castro, da agência de jornalismo SportLight, mostrou que Amilton tem conexões com uma complexa rede de entidades fantasmas.

Uma delas, aberta na Flórida, nos EUA, registrou como diretores Bolsonaro, seu vice, Hamilton Mourão, o ex-ministro da Defesa Fernando Azevedo e Silva e um certo tenente coronel capelão Roberto Cohen. Tem todo jeito de ser picaretagem. A Presidência deve explicações, mas até agora não se manifestou.

O enredo de terror tem ainda mais um militar, o coronel Marcelo Blanco, que deixou o ministério, criou uma empresa de representação na área médica e também facilitou um atalho para o notório cabo Dominguetti.

Tais personagens ajudam a explicar como chegamos a ter 4.000 brasileiros mortos por dia de Covid. Hoje ainda choramos mil mortes diárias. É como se quatro aviões caíssem todos os dias. Sem nenhum sobrevivente.


Hélio Schwartsman - Aprender é um ato social, FSP

 Por que é importante que a garotada volte a ter aulas presenciais? Embora a mitologia do individualismo muitas vezes faça com que pensemos em nós mesmos como ilhas de autonomia, a verdade é que somos biológica e culturalmente uma espécie hipersocial, isto é, só funcionamos direito quando interagimos uns com os outros.

Volta às aulas no segundo semestre de 2021 na escola Luminova, na Barra Funda, em São Paulo - Danilo Verpa - 2.ago.21/Folhapress

O melhor exemplo, creio, é a linguagem. O ser humano já vem de fábrica com uma espécie de instinto da linguagem que faz com que ele aprenda a falar de forma quase automática. Basta lançar um bebê numa comunidade de falantes que, ao cabo de três ou quatro anos, ele se transformará num indivíduo linguisticamente competente. Não é preciso fazer mais nada, diferentemente da leitura/escrita, que requer ensino explícito.

A palavra-chave aqui é comunidade. Esse tipo de aprendizado depende de interações físicas. Se você tinha planos de ensinar inglês a seu filho deixando-o ver horas e horas de programas infantis americanos com o áudio no som original, pode esquecer. Não funciona. Pesquisadores como Susan Ervin-Tripp, nos anos 70, e Peyton Todd e Jane Aitchison, nos 80, mostraram como crianças que não eram expostas à linguagem oral de forma interativa nos primeiros anos de vida ficavam com sérias deficiências para ouvir e falar.

E não é só. O triste caso dos orfanatos romenos nos anos 80 e 90 ensinou que o próprio desenvolvimento normal de um bebê depende de interações positivas com pelo menos um cuidador primário.

Não estou, obviamente, afirmando que o ensino à distância seja impossível. Se você consegue aprender a consertar a geladeira vendo um vídeo no YouTube, também é possível aprender física quântica e hitita remotamente. Mas é preciso ter já uma certa idade, isto é, capacidade de abstração, e a motivação específica.

Vamos torcer para que, agora, as aulas presenciais não sofram novas interrupções. Especialmente para os pequenos, elas são essenciais.