Por que é importante que a garotada volte a ter aulas presenciais? Embora a mitologia do individualismo muitas vezes faça com que pensemos em nós mesmos como ilhas de autonomia, a verdade é que somos biológica e culturalmente uma espécie hipersocial, isto é, só funcionamos direito quando interagimos uns com os outros.
O melhor exemplo, creio, é a linguagem. O ser humano já vem de fábrica com uma espécie de instinto da linguagem que faz com que ele aprenda a falar de forma quase automática. Basta lançar um bebê numa comunidade de falantes que, ao cabo de três ou quatro anos, ele se transformará num indivíduo linguisticamente competente. Não é preciso fazer mais nada, diferentemente da leitura/escrita, que requer ensino explícito.
A palavra-chave aqui é comunidade. Esse tipo de aprendizado depende de interações físicas. Se você tinha planos de ensinar inglês a seu filho deixando-o ver horas e horas de programas infantis americanos com o áudio no som original, pode esquecer. Não funciona. Pesquisadores como Susan Ervin-Tripp, nos anos 70, e Peyton Todd e Jane Aitchison, nos 80, mostraram como crianças que não eram expostas à linguagem oral de forma interativa nos primeiros anos de vida ficavam com sérias deficiências para ouvir e falar.
E não é só. O triste caso dos orfanatos romenos nos anos 80 e 90 ensinou que o próprio desenvolvimento normal de um bebê depende de interações positivas com pelo menos um cuidador primário.
Não estou, obviamente, afirmando que o ensino à distância seja impossível. Se você consegue aprender a consertar a geladeira vendo um vídeo no YouTube, também é possível aprender física quântica e hitita remotamente. Mas é preciso ter já uma certa idade, isto é, capacidade de abstração, e a motivação específica.
Vamos torcer para que, agora, as aulas presenciais não sofram novas interrupções. Especialmente para os pequenos, elas são essenciais.
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