quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

'Cuidar das pessoas', Ruy Castro FSP

Crivella deve explicações às que votaram nele e hoje estão sem atendimento médico

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O bispo Marcelo Crivella, pior prefeito do Rio em todos os tempos, insiste em seu exercício de ódio contra tudo que caracteriza a cidade. Neste último sábado (14), não se deu ao respeito de prestigiar a inauguração da árvore de Natal da Lagoa, atração mantida por particulares, que recebe gente do país inteiro e não custa um real à prefeitura. Há meses, ignorou o Rock in Rio, evento que, durante duas semanas, faz a festa do comércio, hotéis, restaurantes, táxis, ambulantes. Ainda neste ano, Crivella agrediu a Bienal do Livro, a maior do país, despachando um bufão para proibir um gibi e se tornando motivo de chacota internacional. E, desde que assumiu a prefeitura, faz o que pode para sabotar o Carnaval e o Réveillon, festas que só voltarão a ser o que eram quando ele deixar o cargo e se retirar, como sugere um amigo meu, para o raio que o parta.
O notável é que todos esses eventos —que qualquer cidade do Brasil daria tudo para hospedar— revertem em impostos diretos e indiretos para a prefeitura, e que ele aceita sem constrangimento. Donde deveria ser de seu interesse até promover esses eventos, para aumentar seu faturamento. Mas Crivella, ao contrário, dedica-se a torpedeá-los, como se portador de uma espada divina, destinada a expulsar os infiéis do templo —do seu templo. Só que o Rio votou nele para prefeito, não para pastor.
Nas diversas vezes em que diminuiu a verba do Carnaval —ou, como agora, em que ameaça negá-la de todo—, Crivella alegou que a destinaria à saúde e à educação. Mas algo deve ter acontecido com ela a caminho dos hospitais, postos de saúde e clínicas da família, porque o Rio vive neste momento a pior crise de sua história no setor. 
Como centralizou sua campanha no mote "cuidar das pessoas", Crivella deve explicações àquelas que votaram nele e hoje se veem sem atendimento médico. 
As que sobreviverem, claro.

Aborto, uma solução simples, FSP

Argumento do presidente argentino é um dos melhores

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Para quem é contra o aborto, uma solução simples, não aborte". O argumento do presidente da Argentina, Alberto Fernández, pode parecer simplório, mas é um dos melhores que existem --quase definitivo, eu acrescentaria.
Em sociedades abertas e plurais, boa parte dos controles sociais, particularmente os morais, é delegada ao próprio indivíduo. Não gosta de pornografia? Não a consuma. O programa de música sertaneja que passa na TV o irrita? Acione o controle remoto. Eu, por exemplo, não tenho muito apreço pela religião, mas nem por isso defendo o fechamento de igrejas. Exerço minha liberdade me mantendo a distância segura dos templos.
Com o aborto é diferente, dirão os que se opõem à legalização, já que realizá-lo implica tirar a vida de um inocente. Não estou tão seguro de que o procedimento possa ser equiparado a assassinato, mas admitamos que possa. A pergunta, então, passa a ser: por que nos opomos ao homicídio?
É aqui que as coisas ficam interessantes. Existem razões objetivas e subjetivas para sermos contra assassinatos. O destaque do primeiro tipo é que o homicídio desorganiza a sociedade. O exemplo clássico é o das rixas familiares, nas quais ofensas reais ou percebidas são cobradas em sangue, criando um clima de insegurança generalizada que compromete o funcionamento do grupo. Esse mecanismo não se aplica ao aborto.
Resta o plano subjetivo. O fato de uma fatia da população julgar que o procedimento é imoral e que aqueles que o realizam cometem uma grave injustiça não deve ser desprezado, mas não tem o peso das razões objetivas.
No mais, considerando-se que parte significativa dos que se opõem ao aborto são religiosos, pode-se produzir um argumento adicional: a sensação de injustiça experimentada por esse grupo é relativa, já que eles podem contar que o Deus onisciente, onipotente e antiaborto providenciará a justa punição aos que pecaram.
Hélio Schwartsman
Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".