sexta-feira, 25 de maio de 2018

A hora da metáfora, Blog do Tupan

*Ademar Traiano
Na última terça-feira, 22 de maio, sentei na cadeira de presidente da Assembleia Legislativa do Paraná frente a um Plenário completamente diferente.
Os lugares dos deputados, as tribunas de honra e as galerias estavam tomadas por mais de 700 estudantes. Na mesma hora, pela TV Assembleia, pelo Facebook ou por telões colocados em dezenas de escolas, milhares de alunos acompanhavam atentos essa sessão fora do comum.
Todos participavam de um ‘aulão’ preparatório do Exame Nacional do Ensino Médio – o Enem. Era o “Assembleia no Enem”, que lançamos em 2015, e se transformou em uma das mais bem-sucedidas iniciativas na área da educação da história do Paraná.
Apenas um ano depois de lançado, matéria da Folha de S. Paulo, de 6 de outubro de 2016, atestava a eficácia do projeto. Segundo o jornal, mais da metade das escolas do país havia piorado sua nota no Enem. O Paraná era a exceção, conseguiu a melhor posição, superando estados como Rio Grande do Sul, São Paulo, Minas Gerais, Distrito Federal, Rio de Janeiro e Santa Catarina.
Um dos diferenciais do Paraná foi a ação da Assembleia que proporcionou, de forma totalmente gratuita, com uma equipe de altíssimo nível, aulas direcionadas para o Enem a milhares de estudantes das escolas públicas do estado.
O projeto, além da estrutura da Assembleia, conta com uma equipe de voluntários entusiastas do Grupo Eureka, e uma parceria com a Uninter. Já são mais de 500 videoaulas e todo o material didático de apoio. Todo ele disponível no site da Alep. É um trabalho insano, mas que vale muito a pena.
Esse sucesso se soma a outras iniciativas vitoriosas da Assembleia do Paraná concebidas para lançar pontes entre Legislativo e a sociedade. Alguns desses projetos, além do sucesso de público, conquistaram a crítica e ganharam prêmios.
No ano passado tivemos quatro iniciativas premiadas. Entre elas, o “Prêmio Boas Práticas Eleitorais” do TRE do Paraná. O Geração Atitude, Prêmio CNMP 2017 do Ministério Público em Brasília. O aplicativo de celular “Agora é Lei no Paraná”, criado pela equipe de comunicação da Assembleia, classificado no ‘Prêmio e-Gov’, do Ministério do Planejamento e Abep. E o Parlamento Universitário, vencedor do Prêmio Cultural ABEL, como melhor projeto desenvolvido por um Legislativo brasileiro em 2017.
No ‘aulão’ desta terça, o grande prêmio era perceber o enorme interesse dos estudantes e vislumbrar seus projetos e sonhos. Além dos jovens, maioria absoluta, alunos muito mais experientes sempre entram na luta. 
O veterano da turma deste ano foi um mecânico, Florentino Rodrigues, de 58 anos. Aluno do Cebeja (Centro de Formação de Jovens e Adultos) da Cidade Industrial de Curitiba. Sonha com uma nova carreira: quer ser médico veterinário.
Curiosamente, no mesmo momento em que o Plenário da Assembleia estava lotado de estudantes ávidos por aprender (alguns, de baixa renda, tiveram de fazer vaquinhas para pagar R$ 8,00 das passagens de ida e volta até a Assembleia), e entusiasmados mestres voluntários que davam aulas fantásticas; na praça em frente, onde fica também o Palácio Iguaçu, havia um pequeno acampamento de professores ligados a APP, sindicato ligado à CUT, dos professores da rede estadual de ensino.
Apesar de o Paraná ser o estado que melhor remunera seus professores e que, aqui, ao contrário da maioria dos demais estados, todos estão com seus pagamentos rigorosamente em dia, eles iniciavam mais uma maratona infindável com aquelas reivindicações infinitas.
Um Brasil com gana de crescer, aprender e evoluir de um lado e os empedernidos cruzados da ideologia falida do outro. Uma metáfora sobre a qual vale a pena meditar. Uma opção que, mais cedo ou mais tarde, todos teremos de fazer.
* Ademar Traiano é deputado estadual, presidente da Assembleia Legislativa e vice-presidente do PSDB do Paraná

O medo em política e nas eleições, Contardo Calligaris FSP (definitivo)




Ilustração
Mariza Dias Costa/Folhapress
Na Folha de 7/5, Vinicius Mota citou e apresentou pesquisa de Diana Mutz, da Universidade da Pensilvânia, publicada nos PNAS dos EUA (Proceedings of the National Acandemy of Sciences, anais da Academia Nacional de Ciências). Segundo Mutz, o que explica o voto nas presidenciais de 2016 (a vitória de Trump) não são as dificuldades econômicas dos eleitores, mas a ameaça de que eles poderiam perder seu status.
Mutz, usando habilmente pesquisas de 2012 a 2016, chega a essa conclusão, diferente da que parece ser hoje a opinião da maioria dos comentadores. Ela mostra que os "preditores" do voto em favor de Trump (ou seja, os fatores que permitem saber em quem alguém votaria) não são nem a ruína financeira (trabalhadores que perderam o emprego, sobretudo se suas fábricas emigraram para China, México e outros "paraísos") nem a educação apenas básica (pensava-se até aqui que os eleitores sem passagem pela universidade fossem os mais prováveis eleitores de Trump).
Não que esses fatores percam totalmente sua relevância, mas eles parecem ter sido menos decisivos para os eleitores do que a percepção de que seu status social era ameaçado —a percepção, em suma, que eles poderiam regredir social e economicamente.
Certamente, desde já, na hora de estabelecer sua estratégia (há eleições para Câmara e Senado em novembro), o Partido Democrata se debruçará sobre a pesquisa de Mutz.
Para nós, o que importa é a constatação ou, no mínimo, a hipótese de que, na hora de um voto crucial, para o bem ou para o mal, o medo de perder parece falar mais alto do que a miséria, a dureza, o nível de cultura e mesmo a esperança de alguma mudança.
Nada disso é uma novidade absoluta —o que é novo é que Mutz chegue a essa conclusão analisando pesquisas. Nas eleições que levaram o fascismo e o nazismo ao governo, por exemplo, considera-se, tradicionalmente, que o eleitorado decisivo fosse uma pequena burguesia receosa de perder o pouco que a diferenciava dos pobres e dos miseráveis. A pesquisa de Mutz confirma essa tese.
Em 1995, no filme "Meu Querido Presidente", de Rob Reiner, com roteiro do grande Aaron Sorkin, o presidente dos EUA, numa fala memorável de cinco minutos, afirmava que o político cínico que queira ganhar uma eleição deve se preocupar apenas em infundir medo nos eleitores e em lhes dizer quem é culpado por isso.
Dois anos depois, Frank Furedi inventava a expressão "cultura do medo", descrevendo um mundo em que todos parecem dedicar mais tempo e energia a se proteger —contra a doença, a pobreza, a morte..."— do que a inventar a vida segundo seus desejos.
Depois do 11 de Setembro e com a ascensão do terrorismo internacional, o medo se torna cada vez mais um dispositivo de controle e domínio.
Mas, cuidado, não na forma mais óbvia, que seria o medo das punições que viriam se a gente não obedecer direito. A esse medo, é fácil resistir.
O medo que nos torna dócil é o mesmo que ganha as eleições: o medo de perder o que temos.
Muitos anos atrás, o psicanalista René Spitz, em algumas experiências que ficaram famosas, verificou que as crianças pequenas sentiam medo diante de adultos desconhecidos porque se sentiam ameaçadas de abandono (pelos pais). Cá entre nós, aliás: não é uma boa ideia deixar crianças pequenas já adormecidas com uma babá que elas não conhecem. Vai que acordam"¦
A fonte profunda e inesgotável de nossos medos são todas as perdas mais antigas e fundamentais: separação da placenta, da mãe, do seio, da mamadeira, do cocô"¦ Crescemos nos separando, ou seja, perdendo as coisas das quais nos separamos para crescer.
Em 1984, os psicólogos Daniel Kahneman (prêmio Nobel de economia em 2002) e Amos Tversky descobriram que somos mais avessos à perda do que seria razoável.
Grosso modo, tendo que escolher entre não perder os R$ 5 que estão no nosso bolso e apostá-los com uma muito boa chance de ganhar R$ 10, preferimos quase sempre ficar com nossos R$ 5. Corolário disso: o demagogo de sucesso não é tanto quem faz promessas quanto quem consegue responder ao medo dos que se sentem ameaçados pela possibilidade de perder.
Note-se: justamente, no Brasil, saímos de um período em que muitos melhoraram de vida e estamos numa crise, em que muitos temem perder o que acabam de ganhar.
Contardo Calligaris
Italiano, é psicanalista. Deu aula de estudos culturais em NY. Reflete sobre cultura e modernidade.

Quem pode mais, Opinião FSP

Esta não é a primeira vez em que caminhoneiros aproveitam a fraqueza do governo de turno para impor perdas a toda a sociedade com greves truculentas.
Assim se deu em julho de 1999, quando o país vivia uma crise econômica e a popularidade de Fernando Henrique Cardoso definhava. Ao longo de quatro dias, promoveram-se bloqueios de estradas e o desabastecimento de produtos de todo tipo. O Planalto dobrou-se, suspendendo reajustes de preços do óleo diesel e de pedágios.
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Mais recentemente, em novembro de 2015, a categoria parou enquanto seus líderes defendiam o impeachment de Dilma Rousseff (PT) —que ainda tardaria alguns meses. Talvez pela impossibilidade de atender a tal pleito, o governo elevou as multas a motoristas que obstruíam as rodovias.
A nova ofensiva dos caminhoneiros tornou esta quinta (24) um dia de aflição para muitos brasileiros.
Faltou combustível e multiplicaram-se filas em postos de São Paulo e do Rio de Janeiro, entre outros estados; criou-se ameaça de falta de água no Rio; na capital paulista, a operação dos ônibus teve de ser reduzida, e a coleta de lixo, suspensa; o transporte de alimentos foi prejudicado em todo o país.
A tais tormentos e aos abusos dos paredistas —cujo direito ao movimento reivindicatório não se confunde com o propósito explícito de prejudicar a população— as autoridades federais reagiram de forma aparvalhada e submissa, aceitando de pronto a chantagem.
Menos mal que, depois do congelamento temporário do preço do diesel, promovido pela Petrobras, e de acenos do governo Michel Temer (MDB) e do Congresso no sentido de votar a redução de impostos sobre derivados de petróleo, anunciou-se à noite um acordo para suspender a greve por 15 dias.
Entretanto nem todas as entidades envolvidas participaram do entendimento. Mencionam-se, ademais, suspeitas de que o movimento ganhou o apoio de transportadoras de cargas e outras instâncias do patronato interessadas em pressionar o poder público.
O que se pretende é decidir de afogadilho uma questão complexa. Por efeitos do mercado global, os combustíveis encareceram de modo agudo, o que provoca danos inegáveis para o setor.
No entanto a proposta de mitigar tais custos por meio da renúncia tributária ou subsídios orçamentários afeta o conjunto dos contribuintes —todos os cidadãos.
Recorde-se que o Tesouro Nacional depende de dinheiro emprestado até para o custeio cotidiano; abrir mão de receita significa fazer mais dívida a ser paga no futuro.
Cabe à política, sem dúvida, arbitrar conflitos do gênero. Diante da pequenez mostrada até aqui por governantes e legisladores, porém, deve-se temer que essa e outras demandas acabem em regra decididas em favor de quem pode mais.