segunda-feira, 5 de março de 2018

A era exponencial e suas incertezas, por Eduardo Felipe Matias


Eduardo Felipe Matias
O iPhone acaba de completar 10 anos.
Hoje, o número de usuários de smartphones passa de 2,5 bilhões – só no ano passado, foi vendido 1,5 bilhão de unidades desses aparelhos.
Olhando pouco mais de uma década para trás, alguns aplicativos e redes sociais atualmente tão presentes em nossas vidas ainda não existiam. O WhatsApp surgiu apenas em 2009. Instagram, em 2010. Twitter, 2006. YouTube, 2005. Facebook, 2004. Skype, 2003. LinkedIn, 2002. Esses dados foram obtidos na comparativamente “vetusta” Wikipedia, criada em 2001, que hoje possui mais de 40 milhões de verbetes e está disponível em 295 idiomas.
Floresceu, desde então, uma cultura baseada no compartilhamento que levou a uma explosão de usuários dessas redes sociais – 2 bilhões no Facebook, para citar só a maior delas – e de conteúdo na internet – a quantidade de páginas da web é incomensurável... a estimativa do Google, por exemplo, é de que seriam 30 trilhões.  
Tecnologias importantes apareceram ou se popularizaram ainda nesta década. Antes disso, como observa Thomas Friedman em seu último livro, Obrigado pelo atraso, “a nuvem ainda estava no céu e 4G era uma vaga de estacionamento”. O serviço de armazenamento de dados em nuvem da Amazon é de 2006 e o da Microsoft, de 2010. O Dropbox, onde estou salvando este artigo enquanto escrevo, também acaba de cumprir 10 anos. A quarta geração de telefonia celular, que é a mais avançada hoje disponível, passou a ser adotada por volta de 2010 – e já se vislumbra sua substituição pela 5G, que promete ser muito mais rápida.
Essa evolução não seria possível sem o crescimento exponencial da capacidade de processamento dos computadores, ditada pela chamada Lei de Moore – em 1965, Gordon Moore, um dos fundadores da Intel, previu que a velocidade dos microchips dobraria a cada ano, previsão que foi depois atualizada para a cada dois anos e que se confirmou nos 50 anos seguintes. De fato, a capacidade atual de um smartphone é imensamente maior do que a dos computadores do projeto Apollo, que levou o homem à Lua em 1969.
Graças, em grande parte, a essa progressão geométrica, o futuro chegou e não é mais estranho falar em big data, impressão 3D, blockchain, nano e biotecnologia, realidade virtual e aumentada e Internet das Coisas, esta última impulsionada pela multiplicação dos sensores – dez anos atrás, havia 500 milhões de aparelhos interconectados, agora há aproximadamente 8 bilhões e espera-se que, por volta de 2020, sejam 50 bilhões.
A inteligência artificial evolui com o “machine learning” e contribui para o cenário de ficção científica com carros autônomos, como os que a Google começou a desenvolver em 2009, e computadores capazes de superar seus oponentes humanos, como o Watson, da IBM, que ganhou o jogo televisivo de perguntas Jeopardy! em 2011 ou o AlphaGo, da Google DeepMind, vencedor do desafio contra Lee Sedol, campeão mundial do jogo Go, em 2016. Muito além dessas proezas, tecnologias baseadas em inteligência artificial ganham espaço no dia a dia das pessoas – o assistente pessoal virtual Siri, da Apple, é de 2011, o Cortana, da Microsoft, de 2014, assim como a Alexa, da Amazon. Atualmente, não parece mais coisa de doido conversar com aparelhos esperando obter respostas para nossas indagações.
É difícil para a mente humana, habituada à linearidade, compreender o que o crescimento exponencial significa, o que torna seus resultados imprevisíveis.
Nos negócios, está claro que algumas novas tecnologias são disruptivas e podem levar à transformação brutal de certos setores. As indústrias fotográfica, fonográfica e editorial foram revolucionadas pela consolidação dos formatos digitais, que levou à extinção de algumas companhias. A popularização de telefones celulares com acesso à internet e GPS permitiu a ascensão de startups como o Uber, e a imensa quantidade de pessoas conectadas, aliada à cultura de compartilhamento, garantiu o sucesso de plataformas como o Airbnb. Já se tornou batida a afirmação de que o Uber é a maior empresa de táxis do mundo sem ter nenhum veículo e o Airbnb a maior rede de hospedagem sem possuir um imóvel sequer. Esse fenômeno também ganhou velocidade na última década – o Airbnb é de 2008 e o Uber, de 2009.
Porém, se muita atenção é dada às oportunidades e aos riscos que as novas tecnologias representam para os negócios, pouco tempo tem sido dedicado a entender a importância do Estado nesse contexto. Este tem um papel a exercer, seja na regulação das novas atividades – dificultada pela conhecida lentidão de seus processos decisórios, ainda mais sentida em um mundo de mudanças aceleradas –, seja no combate aos impactos nocivos dessas mudanças, como o desemprego causado pelo progresso da automação e da robótica, cujos efeitos podem ser mitigados pela educação e treinamento para valorização do capital humano, pelo estímulo ao empreendedorismo e pelo reforço das redes de proteção social.
Além disso, nem sempre a iniciativa privada está disposta a investir em tecnologias em sua fase inicial, quando estas ainda precisam superar o chamado “vale da morte” que existe entre o surgimento da ideia e sua viabilização comercial. Cabe ao poder público, nesses casos, investir em pesquisa básica e criar mecanismos de incentivo para que essas tecnologias sobrevivam. Algumas delas poderão fazer a diferença se quisermos vencer os grandes desafios da atualidade, como a mudança climática.
A era exponencial que começou pouco mais de uma década atrás gera uma série de incertezas. O processo de destruição criativa por ela iniciado pode gerar uma riqueza sem igual, mas tem efeitos negativos com os quais temos que aprender a lidar. Para alcançar um mundo mais próspero e sustentável é preciso mais tecnologia, não menos. Uma vez que não é possível – talvez nem desejável – deter o avanço da inovação, devemos nos perguntar quais formas de governança, mais ágeis e adequadas ao ritmo da transformação atual, poderiam ser adotadas. Essa é a grande pergunta do momento.
E aí, Siri?

Eduardo Felipe Matias é sócio de NELM Advogados, duas vezes ganhador do Prêmio Jabuti com os livros “A humanidade e suas fronteiras” e “A humanidade contra as cordas”, coordenador do guia “Empreendendo Direito: aspectos legais das startups”.
Twitter: @EduFelipeMatias
Artigo publicado originalmente no jornal Valor Econômico de 18 de setembro de 2017, p. A13, disponível em http://www.valor.com.br/opiniao/5122522/era-exponencial-e-suas-incertezas.

sexta-feira, 2 de março de 2018

Cenário nas bacias do Sistema Cantareira é preocupante, diz consórcio, EBC

O volume de chuvas nas bacias dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (PCJ) e a vazão dos rios que desembocam no Sistema Cantareira, um dos maiores complexos de abastecimento d'água de São Paulo, compõem atualmente um cenário muito semelhante ao de 2013, ano anterior à crise hídrica no estado. O dado, considerado preocupante, foi divulgado nesta semana pelo Consórcio PCJ, em balanço que compilou dados meteorológicos do ano passado e os comparou aos de anos anteriores. Esse deve ser um dos temas tratados no 8º Fórum Mundial da Água, que vai ocorrer entre os dias 18 e 23 de março, em Brasília.
Parte do terceiro parque industrial do Brasil, a Bacia PCJ tem uma importância muito grande, diz o secretário executivo do Consórcio PCJ, Francisco Carlos Castro Lahóz. "E é das nascentes do Rio Piracicaba que se promove o abastecimento de cerca de 50% da região metropolitana de São Paulo”, acrescentou Lahóz. O Consórcio PCJ, primeiro organismo de bacias, criado em 1989, para gerenciamento dos recursos hídricos, participa do Conselho Nacional de Recursos Hídricos.
Em entrevista à Agência Brasil, Lahóz informou que as bacias do PCJ contribuem para o abastecimento de água de cerca de 14 milhões de pessoas, das quais 5,5 milhões vivem em 76 municípios na região onde estão as bacias (entre eles, moradores das cidades de Campinas e Piracicaba] e 9 milhões da região metropolitana de São Paulo e que dependem do Sistema Cantareira.
O volume de armazenamento de água no Cantareira, destacou Lahóz, está muito próximo hoje do de 2013, ano anterior ao da crise. “Quando adentramos de 2013 a 2014, o Sistema Cantareira estava com 30% de sua capacidade. De 2017 para 2018, estamos com aproximadamente 40%. Pelo acumulado de precipitações abaixo da média histórica e pelo acumulado da falta de reposição do lençol freático, temos uma situação hoje, no Sistema Cantareira, de 43% [de volume de armazenamento]m quando o desejado seria que ele estivesse acima de 70%.”
Com esse volume, o Cantareira se encontra hoje na faixa 2, de atenção para desabastecimento. “A próxima faixa é a 3, de alerta. E estamos muito mais próximos da de alerta que da normal”, disse Lahoz.
Segundo o relatório do consórcio, caso as chuvas deste início de ano não ocorram de forma consistente, as chances de disponibilidade de água e de que a população encontre dificuldades para o abastecimento, são grandes, principalmente porque é esperada para este ano mais uma ocorrência do fenômeno La Niña, o que pode significar fortes secas na Região Sudeste.
O problema é que, desde 2012, as chuvas estão ocorrendo abaixo das médias históricas. Além disso, os lençóis freáticos ainda não se recuperaram da escassez dos últimos anos. “Entre 2015 e 2016, as chuvas foram de grande intensidade e de curta duração [o que aumentou a média histórica anual de precipitações, mas o subsolo não consegue absorver essa água], e o lençol freático não foi carregado suficientemente. Em 2014, perdemos aproximadamente 75% das nossas nascentes, que garantem os cursos de água. E não conseguimos recuperar essa perda", afirmou o secretário executivo do Consórcio PCJ.
"O que nos aflige é que teremos talvez 40% das nascentes [este ano]. Descemos em uma linear muito baixa, e a reação não foi a contento. O que aconteceu? Em 2016, novamente as precipitações decresceram. E, em 2017, chegaram a reduções próximas de 15% da média histórica. E adentramos o ano de 2018 com lençol freático ainda não preparado para qualquer fenômeno que venha a ocorrer. Se as chuvas fossem de média histórica, em cinco anos, se recuperariam [os lençóis]”, explicou.
Lahoz destacou ainda que o Sudeste é uma região de grande impermeabilização do solo, o que traz ainda mais dificuldades para o carregamento do lençol freático.
Chuvas abaixo da média
As precipitações nas bacias PCJ estão ocorrendo abaixo da média, que é de 1.500 milímetros. Desde 2012, alertou Lahoz, está havendo uma tendência de chuvas menos volumosas na região. O menor índice foi registrado em 2014, no ápice da crise hídrica, com 874 milímetros (mm). Em 2015, houve uma recuperação, quando choveu 1.283 mm. Mas, em 2017, voltou a escassez de chuvas nas bacias PCJ, com volume na ordem de 1.306 mm. Apesar de ser um mês chuvoso, nos 10 primeiros dias de janeiro deste ano choveu, em média, apenas 30% do que era esperado para o mês, lembrou o secretário executivo do Consórcio PCJ.
Na região das cabeceiras das bacias do PCJ – onde estão os reservatórios e o Sistema Cantareira – choveu acima da média nos anos de 2015 e 2016, mas a região voltou a apresentar volumes abaixo das médias históricas no ano passado, com 1.259mm, quando o volume esperado era de 1.300 mm. Segundo o relatório do consórcio, a diminuição das chuvas pode ser sentida no volume de água que chega aos reservatórios do Cantareira: em 2017, as vazões de afluência somaram 273,74 milímetros cúbicos por segundo (m³/s), abaixo dos 310,01 m³/s verificados em 2013, antes da pior crise hídrica da série histórica.
“Os eventos climáticos extremos que verificamos nos últimos anos, somados à possibilidade de ocorrência de um La Niña, causam muita atenção, especialmente porque os cenários de 2013 estão se repetindo e com tendência de queda nos volumes de chuva. Também é preocupante o comportamento do consumo de água, que, nos últimos dois anos, voltou a aumentar, depois de ter diminuído e se mantido estável por causa da crise hídrica”, disse José Cezar Saad, coordenador de projetos do Consórcio PCJ e responsável pelo Programa de Monitoramento das Águas.
Alerta
O alerta feito no relatório, destacou Lahóz, não é apenas para as bacias PCJ, mas para toda a Região Sudeste. “Não fazemos este alerta com foco nas bacias PCJ. Fizemos todos esses estudos pensando na Região Sudeste e no Brasil, porque todo esse comportamento que avaliamos para o PCJ se encaixa perfeitamente na Região Sudeste brasileira. Não se consegue fazer uma análise climática com a bacia hidrográfica de 15,4 mil quilômetros quadrados. Fenômenos como El Niño e La Niña ocorrem em uma proporção de área muito maior que essa e envolve oceanos e continentes. Então, quando se faz essa análise, não se faz em uma bacia hidrográfica, mas para uma região ”, disse.
Segundo Lahoz, o mesmo estudo foi feito em 2013, quando o consórcio enviou um ofício para diversos órgãos alertando sobre a possibilidade de crise no abastecimento para a Região Sudeste. “Fizemos um ofício em dezembro de 2013, após uma análise igual a essa, e encaminhamos para a Agência Nacional de Águas (ANA), para o Departamento de Águas e Energia Elétrica, para os governos de São Paulo e de Minas Gerais e para a União, antevendo a crise de 2014, baseado em estudos semelhantes. Na época, não falávamos em crise para o PCJ, mas para a Região Sudeste. E a crise aconteceu na Região Sudeste”, lembrou. “Uma vez avisamos que isso ia acontecer. E aconteceu. Agora, estamos analisando os dados e verificando que [o problema] poderá se repetir. E temos obrigação de avisar.”

Esse cenário de crise, ressaltou, já não pode ser evitado. “Evitar não; amenizar, sim. Uma coisa é o que aconteceu em 2013. Nós, do consórcio, fizemos o alerta [na época]. Agora já se passaram três meses e eram três meses em que a comunidade já deveria estar economizando e reduzindo o consumo”, disse.
Para amenizar uma possível crise hídrica este ano, o consórcio recomenda que as pessoas façam uso suficiente de água, sem exageros, reduzindo o tempo de banho e evitando lavar veículos e pátios. E que as empresas responsáveis pelo abastecimento revisem seus sistemas e evitem o desperdício e melhorem o armazenamento de água. O consórcio recomenda também a construção de reservatórios municipais e de bacias de retenção em áreas rurais e piscinões ecológicos em regiões urbanas, além de campanhas de sensibilização sobre o consumo racional de água, a busca por fontes alternativas, o combate às perdas hídricas no abastecimento e a proteção de nascentes e de matas ciliares.
Lahóz sugeriu ainda 1que as prefeituras comecem a pensar em cobrar dos empreendimentos imobiliários a construção de adutoras ou de recursos financeiros para cobrir os passivos que esse problema provoca. Isso ajudaria a evitar, segundo ele, a dependência da chuva como solução para a crise hídrica. “Estamos tão dependentes do clima porque existe uma burocracia muito grande no país.”
Ele defendeu também a construção de mais reservatórios para reter a água das chuvas e propôs a cobrança de uma taxa de consumo para momentos de crise. “Estamos propondo que as agências de regulação, juntamente com o sistema de gerenciamento de recursos hídricos, promova uma grande discussão para que a gente use as mesmas metodologias que o sistema elétrico utiliza. O sistema elétrico trabalha com o bolso, com recursos financeiros. Quando os rios não podem mais gerar energia pela matriz elétrica, as termelétricas entram em funcionamento, e as tarifas ficam mais altas. Esse tipo de dispositivo não existe ainda no abastecimento público. Mas ele precisa existir”, disse.
Lahoz ressaltou que a discussão sobre a criação de uma tarifa de crise deve ser levantada no Fórum Mundial da Água, marcado para março, em Brasília. “Vamos ter um stand no Fórum Mundial da Água, onde haverá vários painéis que envolvem a reflexão das práticas do setor elétrico. Temos que, pelo bolso, pelo valor financeiro – e a água tem um valor econômico, sim – atribuir valor econômico à água da mesma maneira que o setor elétrico atribui à energia elétrica.”
Lahoz disse que, se as agências de regulação começarem a cobrar uma tarifa para épocas de crise, a população sentirá o efeito da necessidade de reduzir o consumo da água pelo bolso. “Se a água não tiver valor econômico, as pessoas vão continuar achando que a água cai do céu.”
Sistema Cantareira
O Sistema Cantareira é composto por seis represas, que, juntas, armazenam quase 1 trilhão de litros de água. Segundo a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), o Cantareira é o maior sistema produtor da região metropolitana de São Paulo.
As seis represas que compõem o sistema são as de Jaguari, Jacareí, Cachoeira e Atibainha, localizadas na Bacia Hidrográfica dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí,e as represas Paiva Castro e Águas Claros, da Bacia Hidrográfica do Alto Tietê.
Outro lado
Procurada pela Agência Brasil, a Secretaria de Saneamento e Recursos Hídricos negou a possibilidade de problemas no abastecimento este ano. “As condições dos mananciais estão dentro do esperado para esta época do ano. Na Região Sudeste do Brasil, o período chuvoso fica concentrado entre os meses de outubro e março, quando o volume das represas tende a subir gradativamente, especialmente de janeiro a março.”
Segundo a secretaria, a Sabesp tem hoje um sistema de abastecimento mais robusto, “com mais interligações e maior capacidade de tratamento de água do que antes da crise hídrica”.
“Este ano entrarão em funcionamento o novo Sistema Produtor São Lourenço e a Interligação Jaguari-Atibainha, que trarão mais 11,4 m3/s para a Grande São Paulo. Além disso, o perfil de consumo da população também mudou após a crise hídrica e está abaixo do padrão de consumo anterior. Assim, a produção de água nos principais sistemas atualmente é 15% menor do que em 2013, ou seja, há menos consumo por parte dos clientes e menor retirada por parte da Sabesp”, diz a nota da secretaria.
Já a Sabesp informou que “não existe, nesse momento, razão para preocupação”. A Sabesp cita o novo sistema produtor São Lourenço e a interligação Jaguari-Atibainha e fala também na mudança de cultura da população. “Há também que se festejar a mudança do padrão de consumo da população da região metropolitana de São Paulo, atualmente em média 15% menor do que antes da crise hídrica. Esses fatores, ligados ao fato de que estamos em pleno período chuvoso, com tendência de enchimento das represas, dão tranquilidade à população”, diz a companhia, por meio de nota.

MP se joga em roda de conversa de gênero , Sonia Racy OESP

EVENTO NO MPSP
Gianpaolo Smanio, procurador-geral de Justiça de SP, gastou ontem 5 minutos e 42 segundos para citar mais de 80 entidades que contribuíram com uma roda de conversa sobre igualdade de gênero, no Ministério Público.
A longa lista reunia órgãos oficiais e movimentos sociais – alguns que até já protagonizaram embates com autoridades. Todos foram ao centro de São Paulo para falar de políticas públicas e representatividade de gênero.
Como previsível, não faltaram disputas entre os grupos. Uma delegada estimulou mulheres a denunciarem assédio sexual pelos canais oficiais e, depois, uma assistente social reclamou de mau atendimento nas delegacias. Perguntas que causaram polêmica: é possível dizer que existem mulheres machistas? E como fica a questão das mulheres transexuais, que muitas vezes não encontram espaço em coletivos feministas?
Outras questões, embora complexas, tiveram resposta. Qual é o limite entre o assédio e o flerte? A psicóloga e psicanalista Maya Foigel ofereceu uma receita para o tema: “O assédio é um ato de constrangimento que gera medo, e é isso que vai causar danos na saúde mental da vítima. Se gerou constrangimento e gerou medo, é assédio.”
A violência doméstica também foi tema de um dos painéis. “Enquanto os homens estão morrendo no trânsito ou no bar, as mulheres estão morrendo dentro de casa, onde elas deveriam estar seguras”, lamentou a delegada Margarete Barreto, que atua contra crimes raciais e de intolerância. Ela explicou que o problema atinge mulheres de todas as classes sociais, etnias, idades e escolaridade. “Na periferia e nos Jardins.”
Barreto também citou letras de músicas de diferentes décadas que têm fundo machista. Uma, de 2012, diz: “Mulher foi feita para o tanque, homem para o botequim.”
A fala mais ovacionada partiu da ginecologista Albertina Duarte Takiuti, indicada ao Nobel da Paz de 2005. Ela contou que ouviu uma piada machista – “troca uma mulher de 60 por duas de 30”… –, e rebateu: “Você não dá conta nem de uma!”
O pedido do encontro partiu de 20 movimentos, mas o evento acabou recebendo adesões até a véspera. Lidia Passos, secretária de Integração da Procuradoria-Geral de Justiça e responsável pela reunião, conduziu três painéis de discussão enquanto consultava a plateia sobre o formato das discussões. “Igualdade é fundamental para nós, toda atuação do MP têm como âncora esse fundamento”, explicou à coluna. De lá saíram sete resoluções de combate à desigualdade.
O estilo das discussões foi importado de uma roda de conversas anterior, sobre moradia. Cármen Silva, do Movimento Sem Teto no Centro e da Frente de Luta por Moradia, explicou: “O MP é um órgão de justiça, então é com ele que nós temos que ter afinidade.” / PAULA REVERBEL