segunda-feira, 7 de julho de 2025

INSS: Dataprev presta serviço ao crime, diz relator de projeto contra fraude, FSP

 Stéfanie Rigamonti

São Paulo

Relator do projeto de lei que propõe o combate aos desvios na folha de pagamento dos aposentados do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), o deputado Danilo Forte (União-CE) decidiu incluir na discussão da matéria o cerco a descontos indevidos referentes ao empréstimo consignado.

O parlamentar quer apresentar nesta terça-feira (8) o primeiro esboço do novo relatório do PL 1546/2024, que trata do tema. Após a operação Sem Desconto, deflagrada pela Polícia Federal em abril, deputados enviaram 60 projetos de lei sobre o assunto, que foram analisados e serão adicionados ao PL original.

Segundo Danilo Forte, o "modus operandi" das fraudes nos descontos de benefícios e no consignado é o mesmo, e a Dataprev segue recebendo dinheiro pela operacionalização disso na folha dos aposentados.

Um homem de terno e gravata está sentado à mesa, gesticulando com as mãos enquanto fala. Ele usa óculos e tem cabelo curto e grisalho. Ao fundo, há uma estante com livros e documentos. Na mesa, há uma folha de papel e um copo com bebida.
Deputado federal Danilo Forte (União-CE) durante entrevista à Folha em seu gabinete - Pedro Ladeira - 8.ago.2023/Folhapress

Em audiência pública na Câmara, no dia 2 de julho, o ex-presidente do INSS Leonardo Rolim disse que a operacionalização dos empréstimos consignados na folha era a principal receita da Dataprev na época em que ele esteve à frente do instituto. Afirmou ainda que o INSS tem um ganho com isso, porque reduz o custo fixo, em até R$ 400 milhões por ano, dos sistemas que o instituto antes bancava sozinho.

Consultados, Dataprev e INSS não se manifestaram até a publicação da reportagem.

Por que o cerco ao consignado deve ser tratado no mesmo projeto dos descontos ilegais do INSS?
Porque o "modus operandis" é praticamente o mesmo. E se a instituição [INSS] não tem controle sobre os descontos das associações e empresas, com certeza também não vai ter controle com relação ao consignado. O volume de denúncias de renovações automáticas do empréstimo, com manifestação inclusive indutiva para que esses aposentados continuem se endividando, é uma constante. Então, com certeza a tendência do debate e da construção do relatório final vai ser no sentido, também, de notificar as instituições [financeiras] para observância e a auditagem com relação a essa questão [o consignado].

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Além das renovações automáticas, quais outras denúncias no consignado o senhor está de olho?
Tem a questão da lei geral de proteção de dados, a LGPD. Na audiência que fizemos disseram que tem gente vendendo no setor comercial sul de Brasília chips com toda a lista de aposentados, com telefones, dados, informações, que já estão sendo vendidas no meio da rua. O INSS não tem conhecimento disso?

Mas qual é o objetivo do projeto de lei?
O intuito principal é a defesa dos aposentados. E para proteger os aposentados temos que ver por onde está se dando a sangria.

Já há um relatório final?
Tem 60 projetos de lei que foram apensados [ao PL original, de 2024]. Eu quero apresentar nesta terça-feira [8] o primeiro esboço do relatório e já quero discutir com o colégio de líderes, porque a ideia do presidente [da Câmara], Hugo [Motta], é votá-lo ainda antes do recesso.

Quais os principais pontos de consenso?
A grande maioria é contra o INSS atuar como instituição arrecadatória para as empresas e para as associações. Foi dito com todas as letras pelos representantes do INSS que eles não têm como ficar checando instituição por instituição. E isso está claro, porque acontecem algumas aberrações. Por exemplo, cada categoria profissional só pode ter uma entidade [representativa] em âmbito nacional. E tem categorias que têm três, quatro instituições se autodeclarando representantes. Nem para isso o INSS se atentou?

Ao dizer que o INSS não tem como fiscalizar, o instituto não está tirando de si a responsabilidade?
É, mas quando eles admitem que não têm controle, a responsabilidade volta para eles. Porque eles têm a obrigação de proteger o patrimônio dos aposentados.

O que o projeto deve propor nesse sentido?
Primeiro, legitimar esse consenso de que o INSS não tem condições, nem capacidade, nem competência para fazer esse tipo de acompanhamento de bloqueio [das aposentadorias]. Isso não é a função deles. Segundo, punindo quem foi conivente, inclusive os servidores públicos que contribuíam para isso. Queremos uma pena qualificada para esses servidores que estão imbuídos de papel de Estado, com responsabilidade maior para eles.

Qual seria a forma ideal de adesão legítima dos aposentados aos benefícios?
Seria uma relação unicamente privada. É uma relação entre as associações e o aposentado. Da mesma forma que a gente autoriza desconto na conta corrente para pagar boletos, isso também pode acontecer com relação aos aposentados. Agora, o que não pode é o Estado patrocinar e avalizar isso, e não fiscalizar.

Como assim, patrocinar?
Sabe o que é mais interessante e me deixou preocupado? A Dataprev recebe por essas operações. A Dataprev na prestação do serviço dela, de fazer o desconto na Folha, ela é remunerada. Isso provoca uma situação ainda mais discrepante. Porque a Dataprev, que é um órgão de Estado, uma empresa estatal, presta um serviço para o crime.

E quem deve fiscalizar, então?
No que diz respeito às operações financeiras, o Banco Central tem a obrigação de fazê-lo. O que diz respeito às relações privadas, é o Ministério Público que tem a obrigação de acompanhar.

STF aprovou um plano para devolução do que foi desviado. O senhor é contra?
Se for só transferir a responsabilidade para o Tesouro, sim. Mas, com o projeto de lei, além da decisão do Supremo, deve haver o confisco e a punição penal dos fraudadores. Exatamente para que a população não pague duas vezes essa conta. Porque o STF não pode legislar. O que ele fez ali foi uma medida cautelar para dar a oportunidade de se restituir o mais rápido possível [os aposentados lesados] e, para isso, precisa de um crédito extraordinário no orçamento.

E o que propõe o projeto de lei?
A gente quer o confisco do patrimônio, tanto das instituições como dos fraudadores, e que ele sirva de fundo financeiro, pelo menos para minimizar esse prejuízo que a sociedade brasileira terá [com o uso do Tesouro para ressarcimento] e os aposentados já estão tendo por causa dessas operações fraudulentas.

Com Diego Felix

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