segunda-feira, 7 de julho de 2025

Thibaut Bruttin e Oscar Vilhena Vieira - Da imunidade à responsabilidade das plataformas, FSP

 

Thibaut Bruttin

Diretor-geral da Repórteres Sem Fronteiras (RSF) e presidente do Fórum Informação & Democracia

Oscar Vilhena Vieira

Professor da FGV Direito SP e membro da Comissão Arns

A liberdade de expressão é um elemento constitutivo da própria ideia de democracia. Sem ela não há pluralismo político nem diversidade. No momento em que o Supremo Tribunal Federal decide, por 8 votos a 3, alterar o regime de responsabilidade das redes sociais em relação aos conteúdos de terceiros, devemos ter cuidado para não ceder à tentação de restringir indevidamente a liberdade de expressão.

Sabemos que movimentos de extrema direita, bem como alguns segmentos da indústria tecnológica, fazem um uso meramente instrumental e cínico da defesa da liberdade de expressão, com o objetivo de deslegitimar a imprensa de qualidade, eliminar seus adversários, tomar o poder e promover seu modelo de negócios.

Um homem está sentado à mesa com as mãos entrelaçadas. Ele usa um boné vermelho com a frase "TRUMP WAS RIGHT ABOUT EVERYTHING!". O ambiente parece ser um escritório ou sala de reuniões, com uma parede clara ao fundo e uma lareira visível.
Elon Musk durante reunião na Casa Branca, em março de 2025 - BrendanSmialowski - 24.mar.25/AFP

Como os demais setores da economia, esses gigantes devem estar sujeitos às normas constitucionais e à regulação das instituições do Estado Democrático. Esse foi o recado claro do STF. Sabemos que o modelo econômico das redes está direcionado para gerar o máximo de engajamento dos usuários, mesmo que por meio da polarização e radicalização, da disseminação de desinformação ou do discurso de ódio. Mesmo que direitos sejam violados ou que a democracia seja ameaçada. Assim, a liberdade econômica das empresas não pode torná-las imunes a obrigações decorrentes da legislação, como qualquer outro empreendimento.

No entanto, é preciso cuidar para que a nova interpretação definida pelo Supremo não seja deturpada para obstruir a liberdade de expressão de cada cidadão. Tratar as plataformas como os meios de comunicação tradicionais e Mark Zuckerberg ou Elon Musk como editores-chefes, como propuseram alguns ministros, levaria inevitavelmente a um controle drástico da informação, por meio de uma explosão de supressões automatizadas de conteúdos legítimos. Mas agora é importante zelar para que as grandes plataformas, sob o pretexto de impedir a circulação de conteúdos criminosos e ilegais, não censurem o restante que circula no ambiente online.

Os ministros acertaram ao permitir a responsabilização das plataformas por danos resultantes de conteúdos pagos, na medida em que lucram diretamente com eles. Também faz todo sentido manter no regime original do artigo 19 do Marco Civil da Internet os crimes contra a honra. Do contrário, todos aqueles que se sentissem incomodados pela imprensa poderiam exigir rapidamente a retirada de conteúdos jornalísticos, instrumentalizando a responsabilidade das empresas para automatizar a censura. Porém, os problemas da polarização dos conteúdos, da disseminação em massa de campanhas de desinformação, da marginalização do conteúdo jornalístico e do confinamento dos cidadãos em bolhas de informação não estão resolvidos.

O tribunal deu um passo importante para sairmos do preocupante estágio atual, caminhando para um regime de responsabilidade para as plataformas que guarda maior harmonia com a Constituição e a proteção dos direitos. Mas seguiremos convivendo com sistemas que determinam quais conteúdos são mais visíveis, independentemente de seus valores factuais ou de seu interesse democrático. E essa particularidade, ainda não abordada em lei, precisará ser corrigida, por ferramentas regulatórias que enfrentem o funcionamento dos algoritmos, o uso de dados e a natureza econômica dessas empresas.

É hora então de seguir para um debate equilibrado sobre esses desafios, garantindo a liberdade de expressão e respondendo à realidade da operação das plataformas e do espaço público digital.

Nenhum comentário: