terça-feira, 2 de janeiro de 2018

Nos 40 anos de Lei do Divórcio, 1/3 dos casamentos acaba em separação



Desde 1984, os dados do IBGE apontam que os casamentos avançaram 17% e os divórcios aumentaram 269%. Na prática, o Brasil conta com 3 gerações de casais legalmente separados




Fábio de Castro, Felipe Resk e José Maria Tomazela, O Estado de S. Paulo
30 Dezembro 2017 | 16h00

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Wilson Dias Batista 85 anos, Cleonice Lagemann 47 anso e a Sra Martinha Batista 100 anos, todos da mesma familia e juntos apesar do divórcio

SÃO PAULO - Quarenta anos após a instituição da lei do Divórcio no Brasil, um a cada três casamentos termina em separação no País. É o que mostram os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Um balanço feito com dados do instituto entre 1984 e 2016 aponta ainda que o número de dissoluções disparou com o passar dos anos. Em 1984, elas representavam cerca de 10% do universo de casamentos, com 93,3 mil divórcios. Essa correlação saltou para 31,4% em 2016 – com 1,1 milhão de matrimônios e 344 mil separações.
Apesar de a Lei do Divórcio vigorar desde 1977, os dados sobre o tema só começaram a ser incluídos nas estatísticas anuais de Registro Civil na década seguinte. Até aquele ano, o desquite era o dispositivo legal, mas não possibilitava uma nova união formal. O levantamento aponta mais de 7 milhões de dissoluções registradas no País entre 1984 e 2016, ou 580 divórcios por dia, ante 29 milhões de matrimônios. 
No período, os casamentos subiram 17%. Já os divórcios aumentaram 269%. Na prática, o Brasil passou a contar com três gerações de casais legalmente separados. É o caso da família Dias Batista, de Sorocaba, que coleciona três divórcios concluídos e outro em andamento – e ainda assim permanece unida.
O patriarca da família, Wilson Dias Batista, de 85 anos, se divorciou duas vezes. A primeira foi em 1978. Já seu filho, o advogado Cláudio Dias Batista, de 51 anos, se divorciou da ex-mulher Cleonice Lagemann, a Cleo, de 47, em 2014. E um filho deles também está em processo de divórcio. 
No primeiro divórcio do pai, Cláudio era um menino de 12 anos. Wilson conta que, na época, a separação era difícil. “Precisava que um cônjuge alegasse alguma coisa contra o outro”, lembra. Também tinha de realizar a separação judicial e, só após o prazo, convertê-la em divórcio. 
“Era tanta dificuldade que as pessoas pensavam muito antes de iniciar um processo”, afirma Cláudio, que hoje atua na área do Direito da Família. A exigência do período de carência só caiu em 2010. No segundo divórcio do pai, neste ano, nem foi preciso levar o caso ao juiz. 
Apesar do próprio histórico de separações, Wilson lamenta o divórcio do filho. “Gosto muito dela, me deu sete netos”, diz. O mais velho tem 25 anos. A mais nova, 11. Cláudio e Cleo se conheceram em São Roque, no interior. Ele, locutor de rádio, foi apresentar um evento no qual ela era modelo. “Foi paixão imediata”, conta o advogado. Hoje, o casal compartilha a guarda de três filhas menores.
Neste Natal, Cláudio viajou com os filhos para o Guarujá, enquanto Cleo ficou em Sorocaba, cuidando do ex-sogro e da tia do ex-marido, Martinha Batista, de 99 anos. “Não faço por obrigação, mas por amor. Continuam sendo minha família”, diz Cleo.
Cláudio tem uma namorada que já foi apresentada à família. Cleo também está em um novo relacionamento, que mantém sob discrição. Mas isso não a impede de cuidar da tia do ex. 
“Ela é a filha que não tive. Não tinha nenhuma obrigação de cuidar de mim, mas me trouxe para morar com ela”, diz dona Martinha, prestes a completar 100 anos. Lúcida, ela se aposentou como meteorologista e nunca quis se casar. “Fui ao cardiologista e ele disse que meu coração aguenta mais uns 20 anos. Isso porque eu nunca tive marido.” 
Um dos filhos do ex-casal está em processo de divórcio, após três meses de união. O período curto não surpreende Claudio. “Na sociedade contemporânea, os relacionamentos começam e se desfazem com muita rapidez, mas nem sempre a legislação acompanha”, afirma. “A guarda compartilhada, por exemplo, é um grande avanço, mas pressupõe que o casal tenha um relacionamento bom.” 
Divorciada há quase dois anos, a bancária Mariana Pereira, de 42, compartilha com o ex-marido a guarda de um gato, o Eddie, que sempre trataram como filho. “Foi um acordo bem natural para nós dois”, conta. O acordo, segundo afirma, fez da separação menos dolorosa. “O Eddie é parte da nossa família e a solução para que nenhum de nós ficasse sem vê-lo fez bem para nós dois.”



Fortalecimento. Para especialistas em Direito da Família, uma das razões do “boom” de divórcios é o recuo do preconceito. “As pessoas desquitadas, especialmente as mulheres, eram extremamente estigmatizadas”, diz Luiz Kignel, sócio da PLKC Advogados. “Houve uma mudança cultural em que se compreendeu que o divórcio não é um mal. Os casais que se separam não optaram pela solidão, mas pela felicidade.” 
O avanço da legislação – que permitiu divórcio em cartório e retirou o prazo de separação – é outro motivo para a alta, segundo defende Mário Luiz Delgado, diretor do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp). “Isso não significa o enfraquecimento do casamento como instituição, mas sim o fortalecimento”, diz. “Com esse cenário, nenhum casamento vai continuar por conveniência, medo ou dificuldade de ser dissolvido.” / COLABOROU ISABELA PALHARES 

Ela foi a primeira divorciada do País e faria de novo

Hoje com 78 anos, divorciada se tornou juíza de paz

Roberta Pennafor, O Estado de S. Paulo
30 Dezembro 2017 | 16h00

RIO - "Eu já me casei pensando na separação”, diz Arethuza Figueiredo Henrique Silva de Aguiar, a primeira mulher a se divorciar no Brasil. Hoje com 78 anos, juíza de paz ainda em atividade, sustenta o que pensava à época. “Ninguém deve fingir nada, nem por patrimônio nem pelos filhos. Nenhum filho prefere ver um matando o outro em seu nome”, defende. “Você não pode ser infeliz com medo do que os outros vão dizer, seja em 1977, seja em 2017.”  
Então estudante de Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF), filha da classe média de Niterói, a jovem Arethuza se uniu ao primeiro marido, a quem não amava, induzida pela mãe. Tinha 23 anos e disse o “Sim” na Igreja da Porciúncula de Sant’Ana, em Niterói, em fevereiro de 1963. Teve duas filhas, nascidas em 1964 – ano de sua formatura na universidade – e em 1967. Em março de 1970, já estava desquitada.
Em plena ditadura, o divórcio foi sancionado em 26 de dezembro de 1977. No dia 29, Arethuza, aos 38 anos, se divorciou, sob as lentes ávidas da imprensa. Era a mulher mais citada no noticiário então. “Minha mãe teve de aceitar. Aquele fim de ano foi muito especial para mim. Faria tudo outra vez. O que vi de gente infeliz no Direito de Família, doente, por causa de casamentos malditos...”
Em 1978, ela se casou de novo. Separou-se 16 anos depois. Mãe de duas filhas e avó de quatro netas, ela segue realizando casamentos e “acreditando piamente no amor”. “É uma instituição maravilhosa, apesar de eu não ter encontrado a felicidade no casamento”, afirma.
 

Promessa de vida e reconstrução, FSP


Vinicius Torres Freire – Folha de S.Paulo
O ano que começa daqui a pouco é de aniversários políticos e econômicos tristes, datas de lembrança da morte da sensatez e da civilidade na conversa pública brasileira, se é que restou alguma conversa. Conviria fazer um luto rápido e tentar logo e outra vez recuperar o tempo e as oportunidades perdidas. Até porque a reconstrução vai demorar.
Vai fazer cinco anos que se destampou de vez o tumulto político lavado em ódio. Todas as flores do pântano floresceram a partir de Junho de 2013, embora não bem por causa das manifestações ou da maioria delas.
Vai fazer dez anos que começou o desatino econômico que em boa parte foi o responsável por nos enterrar nesta crise, rara até para este país primitivo e volátil.
Mais difícil do que restabelecer a economia será refazer a política. Jamais fomos governados por tanto tempo por tanta gente ao mesmo tempo tão desclassificada, descarada e incompetente como nesta década. Embora a política tenha se tornado especialmente podre por escolha própria, note-se que foram coalizões político-sociais que ampararam o saque do Estado, a bandidagem, o desatino econômico e o oportunismo político odiento.
As alternativas de lideranças seniores são quase nulas. Na melhor das hipóteses, podemos aspirar a uma mediocridade estável no próximo quadriênio. Seria um tempo para reparar o que está arruinado, arrumar as bases da economia e tentar recriar partidos, correntes e lideranças políticas, da esquerda à direita.
Reconstrução é a palavra adequada. Passamos por uma devastação que em geral apenas guerras costumam produzir.
O país ficou quase 9% mais pobre de 2013 a 2016. Dadas as expectativas atuais de crescimento, voltaremos ao nível de 2013 apenas em algum momento de 2022; na expectativa mais otimista, em 2020. Isto quanto a recuperar o que perdemos, a voltar ao mesmo nível de PIB per capita do encantado ano de 2013.
Mas isso é pouco. Quanto deve demorar para recuperarmos também o que deixamos de ganhar? Isto é, recuperar também o que a economia poderia ter crescido nos anos perdidos. Digamos que o país pudesse ter continuado a crescer à medíocre taxa de 2,7% ao ano (média do crescimento de 1996 a 2015). Deixemos um ano, 2015 ou 2016, para lá, um ano perdido mesmo de recessão feia, coisa que volta e meia acontece, é
inevitável, "está no preço".
Se crescermos sem parar à taxa de 3,6% ao ano, ritmo que no momento parece bom além da conta, vamos recuperar o tempo perdido em 2026. Esse é o tamanho do desastre, uma medida da miséria que governos dementes e uma oposição sabotadora produziram. Quando voltarão os empregos perdidos e aqueles que a economia deixou de criar? É bem mais complexo especular, neste caso. Mas, se tudo der muito certo, não antes de cinco ou seis anos.


Faz já 40 anos, cometemos besteirões que nos têm condenado a ser o país do futuro medíocre, talvez sombrio. Vivemos intervalo de relativos progresso, estabilidade e sensatez nos anos de 1995 a 2008, nada brilhantes, mas animadores. Dá medo de pensar que esses 14 anos tenham sido exceção. Mas a estupidez, a violência, a pobreza e a desigualdade não são destino. São escolha

Os nomes das pessoas, Leandro Karnal, O Estado de S.Paulo



Nunca encontrei alguém chamado Lúcifer, ainda que tenha topado de quando em vez com indivíduos com seu comportamento







31 Dezembro 2017 | 02h00
Sem a corrida de hoje em São Paulo, o papa que lhe empresta o nome seria bem mais obscuro para o grande público. Silvestre I é o pontífice da transição para uma igreja triunfante sob o imperador Constantino. Governando entre 314 e 335, ordenou a construção de obras monumentais que começaram a redesenhar a paisagem romana. No seu governo, ocorreu o Concílio de Niceia (325), para o qual enviou representantes. Naquele encontro, princípios basilares como a divindade de Cristo foram definidos. Um novo papa para um novo momento: foi tornado santo sem ser mártir. 
O dia 31 de dezembro assinala o enterro de Silvestre na catacumba de Priscila, na Via Salária. Na Itália, a refeição de ano-novo é chamada de “cena di San Silvestro” em homenagem ao prelado que, segundo a tradição medieval, teria curado Constantino de lepra. 
Silvestre encerra o ano e amanhã ocorre a festa do Santíssimo Nome de Jesus. Como todo menino judeu, Jesus sofreu circuncisão e recebeu um nome no oitavo dia do nascimento. A tradição estabeleceu a data (desconhecida do Evangelho) de 25 de dezembro para a natividade. Oito dias depois, deu-se a Brit Milah do filho de Maria. A partir de 1º de janeiro, Jesus tem um nome próprio, algo muito significativo na tradição do povo do Livro. Só para lembrar, seu primo João, para receber um nome que não constava da tradição familiar, necessitou da intervenção de um anjo e da mudez do pai Zacarias. 
Nomes são fundamentais na Bíblia. Carregam significados como o do primogênito de Abraão, Ismael, que contém a ideia de que Deus ouviu ao chamado do fiel. A intervenção divina muda o nome das pessoas: Saulo para Paulo, por exemplo. Papas assumiram nome distinto do que tinham recebido no batizado para ocupar o cargo. Quem pensaria no papa Pio XII como Eugênio ou João Paulo II como Karol? O bom papa João XXIII teria a fama idêntica se o nome Ângelo tivesse sido mantido? Alguém pensa no atual papa a não ser como Francisco? Ele nunca foi Jorge Mário! Certamente tinha o rosto de Francisco desde 17 de dezembro 1936, seu nascimento.
Coisa curiosa: os nomes tradicionais da Bíblia (como Davi, Salomão, Isaac e outros) multiplicam-se na comunidade judaica. Jesus tornou-se barreira poderosa e o nome desapareceu da tradição dos hebreus. 
A ficha corrida de alguns colabora para exaltar ou destruir um nome. Lúcifer quer dizer “portador da luz”, solene e bela etimologia. A rebeldia do arcanjo arrastou para a lama sua luminescência. Nunca encontrei alguém chamado Lúcifer, ainda que tenha topado de quando em vez com indivíduos com seu comportamento. 
Origem dos nomes é um bom tópico para conversa inicial, ao menos superior ao tema meteorológico. Brinco com isso quando pergunto a toda Cláudia se manca, aos Filipes se amam cavalos e a qualquer Rafael se sente que Deus o cura. Para comprovar como o nome é tudo, lembro que o meu faz composição greco-latina com o significado de “homem leão”, haja vista a juba que ostento. Todo Teófilo amaria Deus? 
A tradução dos nomes é outro caso digno de nota. Uma das que mais parecem fugir de nossa compreensão imediata é a dos dois apóstolos Tiago dos Evangelhos, que viram Jacques em francês ou James em inglês. Quando nos lembramos que (T)Iago vem de Jacó, fica mais fácil entender a miscelânea. Em português, Diogo tem a mesma etimologia. Há também os apelidos que fogem da compreensão de alguém que não é nativo, como chamar William (Guilherme) de Bill no mundo anglófono ou José de Pepe em espanhol. Da mesma forma, que brasileiro adivinharia que todo Pancho é, originalmente, um Francisco? Efeito reverso: tente explicar aos de língua castelhana como derivamos do mesmo nome o apelido Chico. 
Para quem vai gerar vida nova em 2018, ouçam o conselho de um velho professor. Nomes com letra A serão os primeiros da chamada, momento de certa balbúrdia na sala. Nomes com Z terão de prestar atenção a dezenas de outros antes de ouvirem o som libertador do seu. Denominações que implicam soletrar, explicar a presença de uma letra dobrada, um acento exótico ou um Y engastado à força em alguma sílaba terão o destino de repetir as indicações todos os dias até o túmulo, com o risco de terem seu onomástico inscrito errado na lápide. Nomes com muitas sílabas geram apelidos. Nomes que rimam com coisas jocosas são uma sina. Cuidado!
Combinar a denominação do pai e da mãe raramente resulta em beleza sonora. Os que optam por nomes da moda devem pensar: a onda passa, o seriado acaba, a novela desaparece, mas o nome de seu rebento, não. Iniciais com a mesma letra ou sons similares para os filhos mostram que os pais não pensam neles individualmente, porém em uma sequência industrial. 
Não existe um ideal, todavia nomes eufônicos, curtos, sem acento ou letras dobradas, e sem necessitarem de bula explicativa tendem a causar menos incômodo aos proprietários. Sempre: menos criatividade na escolha tende a tornar o futuro adulto mais satisfeito e sem ódio mortal ao impulso dos pais. 
Por fim, questão menor: a geração do século 21 será mais internacional do que a nossa. Muitos circularão entre várias línguas e culturas. Belos nomes com nossa sílaba “ão”, impronunciável em todos os idiomas, causarão um pequeno obstáculo social ao portador. Há poucas chances de o português ser a língua dominante do atual milênio. Sem perder a identidade da língua materna, é interessante levar em conta a possibilidade de algo possível em outros passaportes.
Enfim, bom ano-novo para todas as pessoas de todos os nomes. Nome é importante, porém não é tudo. Silvestre passou para a história mesmo sendo Silvestre. Sempre teremos esperança. Feliz 2018!