domingo, 2 de março de 2014

O Brasil bruto, na medida - VINICIUS TORRES FREIRE


FOLHA DE SP - 02/03

Somos um dos países mais homicidas do mundo, mas estatísticas não contam a história toda


O BRASIL É UM país mais embrutecido. Mata-se por motivo fútil ou motivo algum de modo mais brutal. A brutalidade não é apenas física; evidencia-se sintomaticamente "na deseducação, no rebaixamento individual e coletivo dos costumes, em muito do que os meios de comunicação tomam como modernidade, na política. Até onde a elevação do trato entre suas excelências parecia inexaurível no Supremo".

Esse é o resumo da tese exposta por Janio de Freitas em sua coluna do domingo passado nesta Folha ("Brasil Embrutecido"). Parece difícil discordar.

No entanto, como se mede o embrutecimento? Ou, pelo menos, como qualificar essa impressão de selvageria suscitada tanto pelo linchamento de rua como pela truculência no Supremo, passando por indignidades corriqueiras de "políticos" e corrupções empresariais?

A gente pode começar pelas violências mais mensuráveis. Tiveram repercussão casos recentes de tentativas de linchamento, de meninos de rua laçados, de brigas de torcida e de assassinatos chocantes (o cinegrafista, o torcedor do Santos, a mulher empurrada no metrô).

O Brasil está mais violento? O que dizem estatísticas, que não contam a história, mas podem documentar a tentativa de escrevê-la?

O Brasil está mais homicida? Sim. Mas não faz muito sentido responder a questão levando em conta um universo vasto como "Brasil". Nem reagir à barbárie com histeria legislante autoritária.

A taxa de homicídios no Brasil está mais ou menos estável desde 1997-98, em torno de 27 homicídios por 100 mil habitantes. A taxa subiu sem parar desde os 12 por 100 mil em 1980 até 1998, parece. "Parece", pois até meados dos anos 1990 a subnotificação era mais grave, e os critérios estatísticos, piores.

Essa taxa coloca o Brasil entre as nações mais bárbaras (entre os 90 para os quais há dados), abaixo de oito países centro-americanos, Colômbia, Venezuela e África do Sul. A seguir, nós e o México. Nossa taxa é 25 vezes a da Europa Ocidental; seis vezes a americana.

Mas a violência varia pelo Brasil.

Neste século a violência homicida diminuiu muito em São Paulo, de 42 por 100 mil para 13,5 por 100 mil (até 2011), um caso de progresso, mistura de policiamento melhor com sociedade mais ativa, que merece um artigo.

Houve melhoras relativas em alguns outros Estados, que no entanto continuam com taxas assustadoras (Rio e Pernambuco).

Neste século, na média do Brasil afora São Paulo, a taxa de homicídios aumentou, em especial no Nordeste, embora Nordeste seja também variado. O Piauí é um dos três Estados menos violentos do país; Alagoas, o mais letal, tem taxa de 72 por 100 mil.

Passados quase 30 anos de democracia (o regime da lei e da civilização progressiva), 20 anos de relativa estabilidade econômica, 10 anos de renda em alta e desigualdade em queda, a brutalidade homicida cresceu.

Diminuíram a mortalidade infantil, a morte precoce de idosos, a morte por doenças primitivas. Há mais escola, ruim, mas há (antes havia menos escola, aliás pior).

Mas nosso cotidiano mostra que somos ainda não só brutos, mas ainda opressivos, desiguais, desordenados, ineficientes e deseducados.

Hidrovia 'seca' e transfere carga para caminhões


Falta de chuva reduz nível do Rio Tietê e já prejudica operações da hidrovia Tietê-Paraná

28 de fevereiro de 2014 | 2h 06

José Maria Tomazela - O Estado de S.Paulo
SOROCABA - A queda no nível do Rio Tietê em razão da falta de chuvas já reduziu em um terço a capacidade dos comboios que transportam cargas pela Hidrovia Tietê-Paraná, no Estado de São Paulo. O "apagão" ocorre num momento em que a safra de grãos no Centro-Oeste do País atinge o ponto máximo. Um grande volume de soja e milho foi transferido para a rodovia e representa mais 133 caminhões por dia chegando ao Porto de Santos, segundo o diretor do Departamento Hidroviário do Estado, Casemiro Tércio Carvalho. "Temos 20 comboios na via e estamos deixando de levar duas mil toneladas por comboio. Isso vai dar quatro mil viagens a mais de caminhão por mês."
O problema mais crítico ocorre entre as usinas de Três Irmãos, em Andradina, e Nova Avanhandava, em Buritama, no oeste do Estado. O nível do reservatório caiu de 46,35% no dia 1.º para 39,16% na quarta-feira. A cota do lago baixou para 325,05 metros do nível do mar e, se cair mais um pouco, a navegação terá de ser interrompida. O calado - parte do casco da embarcação que afunda na água com a carga - foi reduzido de 2,70 m para 2,25m.
Além da falta de chuvas, concorre para o agravamento nas condições da hidrovia o uso da água para geração de energia elétrica nas usinas de Três Irmãos e Ilha Solteira - os reservatórios são interligados. Para atender a um aumento recorde no consumo de energia, o Operador Nacional do Sistema (ONS) usa mais água na geração. "O governo federal não assume que tem problema de geração e a ferrovia paga o pato", disse Carvalho. Segundo ele, em 2001 houve um problema semelhante, mas o governo não aprendeu a lição. "Não houve planejamento para enfrentar a situação atual, em que se conjugaram fatores climáticos extremos e aumento no consumo." O ONS informou que o nível dos reservatórios é controlado pelas usinas de forma a garantir o mínimo necessário para a navegação.
Carvalho já admite o risco de parar a hidrovia por falta de água para navegar. Esse risco de paralisação ocorre num momento em que a hidrovia Tietê-Paraná vive um ritmo de crescimento de quase 11% ao ano, segundo ele. No ano passado, foram transportadas 5,9 milhões de toneladas - 40% desse total eram soja e milho.

Prejuízos do agronegócio com a seca e as chuvas já somam R$ 10 bilhões


Forte seca na região Centro-Sul e excesso de chuvas no Centro-Oeste afetaram agricultura, pecuária, provocam perdas e pressionam a inflação

01 de março de 2014 | 18h 05

Alexa Salomão e Márcia de Chiara - O Estado de S. Paulo
A forte seca que castiga o Centro-Sul e o excesso de chuvas no Centro-Oeste do País já tiraram cerca de R$ 10 bilhões de receita do agronegócio em 2014, segundo cálculos feitos por analistas. Soja, milho, café, cana, laranja, pecuária de corte e de leite registram queda na produtividade e alta nos preços – o que pode ter impacto na inflação.
A soja, que está em plena época de colheita, resume a grande confusão que o clima provocou no campo. No Centro-Sul, a lavoura penou com o sol escaldante, a falta de chuva e as altas temperaturas. Em Mato Grosso, o maior Estado produtor, é o excesso de chuvas que impede a colheita, afeta a qualidade do grão e agrava os problemas logísticos. O preço da soja voltou no mês passado ao patamar de US$ 14 por bushel na Bolsa de Chicago, revertendo as expectativas de queda que existiam por causa da entrada da supersafra brasileira no mercado.
No Paraná, o segundo maior produtor, já se sabe que com a seca houve queda média de 13% na produtividade. Dos 16,5 milhões de toneladas previstas, pouco mais de 2 milhões já se perderam. Pelas estimativas da Secretaria Estadual de Agricultura, haverá redução de R$ 2,2 bilhões na receita.
"Mais do que a estiagem em si, o grande problema foi o calor que prejudicou a formação das vagens", diz Francisco Carlos Simioni, chefe do Departamento de Economia Rural.
Chuva. Em Mato Grosso, a soja está pronta para a colheita, mas o excesso de umidade deixa o grão encharcado e a semente apodrece no pé, diz o diretor executivo da Federação da Agricultura de Mato Grosso, Seneri Paludo. Nos últimos dez dias choveu no município de Sinop, por exemplo, 225,9 milímetros, praticamente o dobro da média histórica para o período, aponta um levantamento do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea).
Para reduzir a umidade é necessário mais tempo no secador e com isso se gasta mais energia. "Tudo é custo de produção e isso impacta na remuneração do produtor", diz Paludo. Diante desse quadro climático, ele diz que o produtor de soja de Mato Grosso não tem opção: ou perde a lavoura no campo ou tem um custo maior.
A estimativa inicial era de que Mato Grosso iria colher neste ano 26,9 milhões de toneladas, uma safra recorde. O levantamento do Imea mostra que, até a terceira semana de fevereiro, cerca de 500 mil hectares deixaram de ser colhidos no tempo ideal, o que pode representar perda de meio milhão de toneladas na produção e prejuízos diretos de R$ 400 milhões. "A preocupação maior é com as áreas atingidas pela seca do que pelas chuvas", diz o secretário executivo da Associação Brasileira da Indústria de Óleos Vegetais (Abiove), Fabio Trigueirinho.
Dados do Boletim Oil World, publicação que é referência no setor, indicam quebra de 4,5 milhões de toneladas na safra brasileira de soja. Isso significa menos R$ 5,4 bilhões de receita.
A dobradinha "chuva no Centro-Oeste e calor no Centro-Sul" também afeta a produção de milho. Uma parte da colheita de milho no verão foi afetada. A perda não é homogênea e varia de região para região. No Paraná, o maior produtor de milho, cerca de um terço da colheita já foi concluída e a estimativa é que as perdas não sejam expressivas. Em Minas Gerais, cerca de 21% da produção está comprometida. A consultoria Safras & Mercado estima que ao todo 12 milhões de toneladas de milho vão se perder, o que subtrairia cerca de R$ 400 milhões da receita do agronegócio.
Mas o desarranjo climático ainda pode comprometer o plantio da chamada safrinha – safra de milho cultivada no inverno que, apesar do nome, corresponde à maior parcela do que o Brasil produz de milho anualmente – cerca de 60% do total colhido.
No Paraná e em São Paulo, a semente encontra um solo com baixa umidade. Se não chover, a planta não vai se desenvolver adequadamente. No Centro-Oeste, o excesso de chuva, quando alguns produtores ainda colhem soja, tende a atrapalhar a entrada das máquinas para o plantio do milho. "Esta semana será decisiva para o plantio da safrinha", diz Paulo Molinari, analista da Safras & Mercado.