FOLHA DE SP - 02/03
Somos um dos países mais homicidas do mundo, mas estatísticas não contam a história toda
O BRASIL É UM país mais embrutecido. Mata-se por motivo fútil ou motivo algum de modo mais brutal. A brutalidade não é apenas física; evidencia-se sintomaticamente "na deseducação, no rebaixamento individual e coletivo dos costumes, em muito do que os meios de comunicação tomam como modernidade, na política. Até onde a elevação do trato entre suas excelências parecia inexaurível no Supremo".
Esse é o resumo da tese exposta por Janio de Freitas em sua coluna do domingo passado nesta Folha ("Brasil Embrutecido"). Parece difícil discordar.
No entanto, como se mede o embrutecimento? Ou, pelo menos, como qualificar essa impressão de selvageria suscitada tanto pelo linchamento de rua como pela truculência no Supremo, passando por indignidades corriqueiras de "políticos" e corrupções empresariais?
A gente pode começar pelas violências mais mensuráveis. Tiveram repercussão casos recentes de tentativas de linchamento, de meninos de rua laçados, de brigas de torcida e de assassinatos chocantes (o cinegrafista, o torcedor do Santos, a mulher empurrada no metrô).
O Brasil está mais violento? O que dizem estatísticas, que não contam a história, mas podem documentar a tentativa de escrevê-la?
O Brasil está mais homicida? Sim. Mas não faz muito sentido responder a questão levando em conta um universo vasto como "Brasil". Nem reagir à barbárie com histeria legislante autoritária.
A taxa de homicídios no Brasil está mais ou menos estável desde 1997-98, em torno de 27 homicídios por 100 mil habitantes. A taxa subiu sem parar desde os 12 por 100 mil em 1980 até 1998, parece. "Parece", pois até meados dos anos 1990 a subnotificação era mais grave, e os critérios estatísticos, piores.
Essa taxa coloca o Brasil entre as nações mais bárbaras (entre os 90 para os quais há dados), abaixo de oito países centro-americanos, Colômbia, Venezuela e África do Sul. A seguir, nós e o México. Nossa taxa é 25 vezes a da Europa Ocidental; seis vezes a americana.
Mas a violência varia pelo Brasil.
Neste século a violência homicida diminuiu muito em São Paulo, de 42 por 100 mil para 13,5 por 100 mil (até 2011), um caso de progresso, mistura de policiamento melhor com sociedade mais ativa, que merece um artigo.
Houve melhoras relativas em alguns outros Estados, que no entanto continuam com taxas assustadoras (Rio e Pernambuco).
Neste século, na média do Brasil afora São Paulo, a taxa de homicídios aumentou, em especial no Nordeste, embora Nordeste seja também variado. O Piauí é um dos três Estados menos violentos do país; Alagoas, o mais letal, tem taxa de 72 por 100 mil.
Passados quase 30 anos de democracia (o regime da lei e da civilização progressiva), 20 anos de relativa estabilidade econômica, 10 anos de renda em alta e desigualdade em queda, a brutalidade homicida cresceu.
Diminuíram a mortalidade infantil, a morte precoce de idosos, a morte por doenças primitivas. Há mais escola, ruim, mas há (antes havia menos escola, aliás pior).
Mas nosso cotidiano mostra que somos ainda não só brutos, mas ainda opressivos, desiguais, desordenados, ineficientes e deseducados.
Somos um dos países mais homicidas do mundo, mas estatísticas não contam a história toda
O BRASIL É UM país mais embrutecido. Mata-se por motivo fútil ou motivo algum de modo mais brutal. A brutalidade não é apenas física; evidencia-se sintomaticamente "na deseducação, no rebaixamento individual e coletivo dos costumes, em muito do que os meios de comunicação tomam como modernidade, na política. Até onde a elevação do trato entre suas excelências parecia inexaurível no Supremo".
Esse é o resumo da tese exposta por Janio de Freitas em sua coluna do domingo passado nesta Folha ("Brasil Embrutecido"). Parece difícil discordar.
No entanto, como se mede o embrutecimento? Ou, pelo menos, como qualificar essa impressão de selvageria suscitada tanto pelo linchamento de rua como pela truculência no Supremo, passando por indignidades corriqueiras de "políticos" e corrupções empresariais?
A gente pode começar pelas violências mais mensuráveis. Tiveram repercussão casos recentes de tentativas de linchamento, de meninos de rua laçados, de brigas de torcida e de assassinatos chocantes (o cinegrafista, o torcedor do Santos, a mulher empurrada no metrô).
O Brasil está mais violento? O que dizem estatísticas, que não contam a história, mas podem documentar a tentativa de escrevê-la?
O Brasil está mais homicida? Sim. Mas não faz muito sentido responder a questão levando em conta um universo vasto como "Brasil". Nem reagir à barbárie com histeria legislante autoritária.
A taxa de homicídios no Brasil está mais ou menos estável desde 1997-98, em torno de 27 homicídios por 100 mil habitantes. A taxa subiu sem parar desde os 12 por 100 mil em 1980 até 1998, parece. "Parece", pois até meados dos anos 1990 a subnotificação era mais grave, e os critérios estatísticos, piores.
Essa taxa coloca o Brasil entre as nações mais bárbaras (entre os 90 para os quais há dados), abaixo de oito países centro-americanos, Colômbia, Venezuela e África do Sul. A seguir, nós e o México. Nossa taxa é 25 vezes a da Europa Ocidental; seis vezes a americana.
Mas a violência varia pelo Brasil.
Neste século a violência homicida diminuiu muito em São Paulo, de 42 por 100 mil para 13,5 por 100 mil (até 2011), um caso de progresso, mistura de policiamento melhor com sociedade mais ativa, que merece um artigo.
Houve melhoras relativas em alguns outros Estados, que no entanto continuam com taxas assustadoras (Rio e Pernambuco).
Neste século, na média do Brasil afora São Paulo, a taxa de homicídios aumentou, em especial no Nordeste, embora Nordeste seja também variado. O Piauí é um dos três Estados menos violentos do país; Alagoas, o mais letal, tem taxa de 72 por 100 mil.
Passados quase 30 anos de democracia (o regime da lei e da civilização progressiva), 20 anos de relativa estabilidade econômica, 10 anos de renda em alta e desigualdade em queda, a brutalidade homicida cresceu.
Diminuíram a mortalidade infantil, a morte precoce de idosos, a morte por doenças primitivas. Há mais escola, ruim, mas há (antes havia menos escola, aliás pior).
Mas nosso cotidiano mostra que somos ainda não só brutos, mas ainda opressivos, desiguais, desordenados, ineficientes e deseducados.
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