quinta-feira, 17 de maio de 2012

A dura luta contra os preconceitos econômicos



Coluna Econômica - 17/05/2012 Luis Nassif
É problemática a maneira como as ideias econômicas são revisadas - não apenas no Brasil mas na economia mundial, em geral.

Tome-se o novo papel do Banco Central.

Seu último presidente, Alexandre Tombini, além de experiência de mercado é um grande pensador econômico. Nos últimos 15 anos, o BC dispôs de alguns bons pensadores, como Armínio Fraga, Sérgio Werlang e o próprio Tombini.
São técnicos que foram beber nas águas internacionais, mas com suficiente inteligência para entender as especificidades da economia brasileira e promover ajustes - mesmo cometendo alguns erros estrondosos, como as operações casadas de hedge de Armínio em 2002.
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No entanto, o discurso econômico midiático sempre se baseou na análise econômica mais rasa, mais facilmente convertida em slogans.

Numa ponta, economistas com bons conhecimentos de números, planilhas - e nenhuma visão sistêmica de economia -, como Afonso Bevilacqua e o inacreditável Alexandre Schwartsman. De outro, economistas sem conhecimento nem de números nem de conceitos - como o ex-ministro Maílson da Nóbrega.
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Apesar da análise rasa, esse discurso torna-se tão poderoso que acaba inibindo qualquer tentativa de revisão de conceitos e de aprimoramento dos instrumentos monetários contra a inflação.
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Por exemplo, qualquer analista com um mínimo de raciocínio e conhecimento da realidade econômica, saberia que medidas de influência direta sobre o crédito (redução de prazo, exigência de entrada maior) tem mais efeito sobre a demanda do que o mero aumento da taxa Selic - que sequer arranha o custo final do dinheiro.

Mesmo assim, foram necessários anos e anos para que Tombini finalmente rompesse com o dogma e passasse a utilizar ferramentas convencionais de política monetária em lugar de recorrer meramente à taxa Selic.

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Dia desses, assisti o Bom Dia Brasil, da TV Globo. Lá, um exemplo muito interessante de como se propagam os slogans na mídia.

A comentarista econômica fala do aumento da inflação em abril - o dobro de março. Quando começa a detalhar os itens de alta, fica-se sabendo que as principais influências foram remédios e cigarros - altas pontuais, sem nenhuma relação com demanda ou câmbio. Aí aponta um conjunto de preços que teoricamente poderão subir nos próximos meses.

Ora, os índices de inflação são compostos por uma infinidade de preços. Periodicamente alguns sobem, outros baixam, dependendo da sazonalidade, de reajustes programados ou outros fatores. O que importa é a soma final. E a soma final mostra que, mesmo com essas altas pontuais, a inflação anual continuará caindo.

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Mas a comentarista deixa no ar apenas parte da realidade que interessa - os preços que aumentam. Encerra o comentário e os dois apresentadores continuam martelando a alta dos preços.
Por que fazem isso? Terrorismo? Jogadas? Nada disso. Fazem isso porque é padrão. Maílson falou nesse tom para a comentarista, que falou nesse tom para o telespectador. E os demais colegas apelam para o mesmo tom, porque é padrão.

É por aí que se cria o clima na opinião pública que acaba inibindo os ajustes necessários para a economia.

terça-feira, 15 de maio de 2012

Leonardo Sakamoto: Compro, logo existo. Os perigos do marketing terrorista






Por Leonardo Sakamoto







Gosto muito das pessoas que dizem o que pensam na cara. Sem muitas mediações. “Sakamoto, você é um idiota.” Sen-sa-cio-nal! O “deixa-disso” do brasileiro cordial, a tentativa de por panos quentes em tudo, me dá nos nervos. Pois ignoramos, dessa forma, a realidade como ela é, enquanto que entendê-la seria peça fundamental para a nossa evolução enquanto indivíduos e sociedade. Meus amigos que passam uma temporada na Europa ou mesmo na vizinha Argentina voltam mais diretos e sinceros. “Japonês, esta sua ideia é péssima. Você gastou todo esse tempo e dinheiro para elaborar isso?” Amo esses tapas na cara.
Por isso, saúdo com bastante entusiasmo a propaganda que uma montadora está veiculando com relação a um de seus modelos nobres. O corpo de um rapaz começa a desaparecer durante o trabalho. Ele não consegue nem mais segurar a xícara de café, vai ficando invisível. Então corre para uma concessionária, entra no carro em questão e volta ao normal. Ao final, quando está saindo do trabalho com um mulher bastante atraente, um homem – provavelmente seu chefe – diz que ele andava sumido.
Mais explícito que isso só duas pessoas em uma balada, um vestido de Ferrari ridicularizando o outro que está de Fiat 147, de bicicleta ou sem nada.
Se você está ficando “transparente” para seus amigos e colegas, a solução é adquirir um produto e através dele o pacote simbólico que traz consigo. Quem acha que a Coca-Cola, Apple ou Fiat vendem refrigerantes, tecnologia e carros, respectivamente, está enganado. Vendem estilos de vida. Do que somos. Do que gostaríamos de ser. Do que deveríamos ser – não em nossa opinião, necessariamente, mas de uma construção do que é bom e do que é ruim. Construção essa que vem, não raras vezes, de cima para baixo.

Como alguém vai poder compensar um emprego ruim que só traz gastrite se não tiver um carro rápido? Pois, ao adquiri-lo estou comprando um estilo de vida sem preocupações. Só velocidade. Ah, e sustentável, é claro, porque a empresa mostra no comercial que planta meia dúzia de dentes-de-leão para compensar toneladas de emissão de carbono, protege uma família de perequitos-que-dizem-ni e doa 10 estojos de lápis aquarelados para uma comunidade onde são jogados os efluentes tóxicos a cada carro comprado. Assim sua consciência sai leve.
Já comentei aqui antes que a busca pela felicidade passa cada vez mais pelo ato de comprar. E a satisfação está disponível nas concessionárias a uma passada de cartão de distância. Muitos de nós ficam tanto tempo trabalhando que tornam-se compradores compulsivos de símbolos daquilo que não conseguiremos obter por vivência direta. Através desses objetos, enlatamos a felicidade – pronta para consumo, mas que dura pouco. Porque, como os produtos que a representam, possui sua obsolescência programada para dar, daqui a pouco, mais dinheiro a alguém.
Mas há boas notícias também. Uma pesquisa da Frontier Group e o PIRG Education Fund, usando dados da Federal Highway Administration, dos Estados Unidos, mostra que o número de pessoas entre 14 e 34 anos sem carteira de motorista subiu de 21% para 26% entre 2000 e 2010. Outro estudo, da Universidade de Michigan, citado em matéria do Financial Times, traduzida pelo Valor Econômico, mostrou que pessoas com menos de 30 anos são 22% de todos os motoristas – um terço a menos que em 1983, com as maiores quedas registradas entre adolescentes.Os jovens americanos começam a preferir meios de transporte alternativos. Parte pela recessão econômica, mas não apenas, porque mesmo os empregados e ganhando bem usam mais bicicletas e transporte público que antes. O estilo de vida de liberdade e independência sobre quatro rodas pode estar ameaçado?

Uma coisa é fazer um comercial de um produto cujo prestígio esteja em alta. Outra coisa é “represtigiar” um produto, recriar a necessidade por ele. Aí a sutiliza da publicidade vai abraçar o Sputnik no espaço. Dá lugar a um marketing terrorista.


Nos EUA, isso já é uma realidade. Por aqui, na minha opinião, ainda não. Mas os movimentos pelo direito à mobilidade urbana vão martelando mudanças que se farão sentir daqui a alguns anos. E as montadoras daqui estão atentas para isso.
A definição do que seja “necessário” pode ser bastante subjetiva, ainda mais que tornamos o excesso parte do dia-a-dia. É como não saber mais o que é real e o que é fantasia ou, pior, não ter idéia de como escolher entre o caminho irreal da felicidade e a via dura da abstinência. Na dúvida entre a “pílula vermelha” e a “pílula azul” engolimos as duas e depois vemos o que acontece no estômago da Matrix.
Em tempos de Rio+20 fala-se em consumo consciente. Mas como ele é possível com esses comerciais de TV que andam por aí?



sábado, 12 de maio de 2012

Estado construirá barragens e Tietê ficará navegável a 98 km da capital


José Maria Tomazela - O Estado de S. Paulo
SOROCABA - Um projeto do governo estadual vai alterar drasticamente a geografia do Rio Tietê, em uma região em que o leito ainda não sofreu interferências. O Departamento Hidroviário do Estado vai construir cinco barragens para tornar o rio navegável da zona rural de Anhembi, a 232 km de São Paulo, até o município de Salto, a 98 km da capital.
Uma sexta barragem está projetada para o Piracicaba, afluente do Tietê, levando a via navegável até Artemis, em Piracicaba. O Sistema Tietê-Paraná passará a ter mais 255 km navegáveis e a hidrovia vai ficar próxima da Região Metropolitana. O Tietê tem, hoje, oito barragens, três delas na Grande São Paulo: Edgard de Souza, em Santana de Parnaíba; Pirapora e do Rasgão, em Pirapora do Bom Jesus.
Esse novo projeto contempla a construção de barragens nos municípios de Anhembi, Conchas, Laranjal Paulista, Tietê e Porto Feliz, segundo o Departamento Hidroviário do Estado de São Paulo. O diretor, Casemiro Tércio Carvalho, destaca que as primeiras licitações estão previstas para este ano e as obras devem alcançar um patamar bem avançado já em 2015.
Todas as barragens terão eclusas para a passagem de barcos. As de Anhembi e Conchas, com 5 e 8 metros de altura, terão a função de regular o nível dos reservatórios. As barragens de Santa Maria da Serra, Tietê, Porto Feliz e Laranjal Paulista terão ainda centrais para aproveitamento energético - a última ainda está em estudo de viabilidade. Os projetos mais adiantados são os de Santa Maria da Serra, Conchas e Anhembi.
Estão previstas ainda integrações com o corredor ferroviário de exportação Campinas-Santos em Piracicaba (Porto de Artemis) e Salto. Além disso, haverá conexão com a Rodovia Marechal Rondon em Anhembi, Conchas, Laranjal Paulista e Tietê, e com a Rodovia SP-79, ligação entre a Castelo e o Sistema Anhanguera-Bandeirantes, em Salto.
Ameaça. Ambientalistas já querem que o estudo de impacto para a construção de barragens no Tietê seja feito de forma integrada e não individual. "É preciso analisar o impacto no rio como um todo", afirmou Malu Ribeiro, coordenadora da Rede das Águas da SOS Mata Atlântica. Segundo ela, os reservatórios vão interferir na característica geológica natural que contribui para dissipar a poluição do Tietê. "O rio com barragem perde as corredeiras e os poluentes lançados ficam retidos nos lagos."
Já o diretor Casemiro Carvalho disse que os impactos serão insignificantes, se comparados com os benefícios do projeto. Para o executivo, as barragens ainda contribuem para a retenção e a retirada do lixo lançado no rio. Ele informou que os reservatórios são limpos e dragados quando ocorre o assoreamento e acúmulo de lodo, até para evitar o encalhe de navios e barcaças.