O presidente Bolsonaro gastou os primeiros 18 meses de seu mandato recusando-se a entender um fato elementar das democracias pluripartidárias: o único caminho para o presidente eleito cujo partido não foi majoritário é dividir o poder com outros partidos e organizar uma maioria estável no Congresso para aprovar um programa consensualmente negociado com eles.
Meteu-se na aventura de uma indefinida "nova" política, com a pior Casa Civil da história da República, sem entender que, quando a Constituição diz que todo poder emana do povo, está implícito que é impossível o Executivo governar sem o Parlamento... Agora corre para reparar o prejuízo.
O que está em jogo hoje, e que posterga perigosamente as difíceis, mas necessárias, decisões para o futuro do país, é a luta pelo controle das duas casas do Legislativo. Quem dominar o Congresso no biênio 2021/2022 terá grande poder de decisão e de pauta. Controlará a Presidência da República, pois será dono do destino dos inúmeros pedidos de impeachment que dormem nas gavetas da Câmara dos Deputados, e terá influência decisiva no destino do jogo eleitoral deste horizonte.
Não foi à toa que até o Supremo Tribunal Federal foi, mais uma vez, chamado a judicializar a política pelos que tanto disso reclamam. Espera-se que seja ele a (re)interpretar o texto cristalino do artigo 57 da Constituição Federal e , com isso, deixe a sua marca no processo.
A incerteza sobre os rumos que tomarão esses temas uma vez eleitos os presidentes do Legislativo talvez explique o jogo arriscado do Executivo em se meter nessa matéria, o que aumenta a chance de que a aposta não acabe bem. O governo finalmente entendeu que precisava de base política para se sustentar e implementar seu projeto —e agora tenta recuperar o tempo perdido.
A luta é sobre quem deterá esse poder político --e tem pouco a ver com a direção em que a economia brasileira irá caminhar. É disso que se trata. Não é sobre uma disputa em torno de um projeto mais ou menos "desenvolvimentista", ou mais ou menos "monetarista", ou sobre o sacerdote de qual igreja das crenças econômicas rezará a missa.
Enquanto esse jogo é jogado, vamos encerrar o ano sem termos sequer a Comissão Mista de Orçamento instalada, muito menos tendo claro o que se pretende fazer para reorganizar as contas fiscais após os necessários e justificáveis gastos extraordinários requeridos pelo enfrentamento da pandemia em 2020.
Durante essa disputa, corremos o risco de que o teto, sem gatilhos, acabe caindo na cabeça da sociedade.
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