O cineasta faz 90 anos amanhã, sem ninguém para ajudá-lo a soprar as velinhas
Jean-Luc Godard, o cineasta mais discutido da história, completa 90 anos amanhã (3). Seu primeiro filme, "Acossado" (1960), fez 60 anos outro dia. O título original, "À Bout de Souffle", significa sem fôlego, em francês. Mas haja fôlego para tantas velinhas, porque Godard terá de soprá-las sozinho —seus colegas François Truffaut, Claude Chabrol, Jacques Rivette, Agnès Varda, Jacques Demy, Chris Marker, Louis Malle, Alain Resnais, Eric Rohmer e Jean Rouch, as estrelas Jean Seberg, Anna Karina e Anne Wiazemski, o fotógrafo Raoul Coutard, o músico Michel Legrand e o produtor Georges de Beauregard, todos já se foram.
Entre 1958 e 1968, com as novas câmeras, mais ágeis, que permitiam filmar na rua, com luz natural, e roteiros escritos no verso de maços de Gitanes, eles fizeram do cinema uma arte incontrolável. O clima político e estético ajudava. Godard foi decisivo para aglutinar aquela turma e, bem típico dele, explodi-la. Todos, alguns para sempre, um dia romperam com ele. Como se sentirá hoje sem um único contemporâneo por perto?
O grosso de seus adoradores éramos nós, os jovens. A notícia de que um novo filme seu saíra em Paris, os artigos a respeito no "Cahiers du Cinéma" e, até que enfim, poder vê-lo no Paissandu e levar a madrugada discutindo-o nos botequins adjacentes —era quase como viver em função de Godard.
Alimentados ano a ano por "Uma Mulher é uma Mulher", "Viver a Vida", "O Desprezo", "Alphaville", "Pierrot le Fou", "A Chinesa", chegamos a 1968 sem saber que Godard estava se despedindo do cinema. Do cinema comercial, claro, porque ele nunca deixou de filmar, embora, coerente, só para mídias exóticas e obscuras. Mas 1968 foi o fim de muita coisa e, ali, nem todos o seguimos.
Eu, por exemplo, fui tratar da vida e nunca mais vi nada que ele fez. Godard também acharia isso coerente. Para ele, o cinema não precisava de plateia.
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