As batalhas na defesa contra o Covid-19 foram perdidas e o rápido aumento do número de pessoas infectadas leva a um cenário de amplo confinamento social.
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Na decisão de confinamento, os condutores de políticas públicas enfrentam um conhecido e difícil dilema: quanto maior ele for, menor o número de vítimas fatais, porém maior a contração da economia e do emprego. No Brasil, como a economia brasileira está ainda muito frágil, o custo associado será certamente elevado.
No estágio atual da epidemia, certamente a dúvida não é sobre promover ou não o isolamento, mas sim sua abrangência e duração. Não é uma avaliação simples, inclusive porque há uma dificuldade adicional. É preciso incluir nesse cálculo o drama social e suas consequências, que poderão, ao final, agravar o custo econômico da decisão.
Em um país com tantos desafios sociais, situações extremas de sofrimento e desespero das camadas mais populares terão reflexo na segurança das cidades – implicando mais custos para preservar a ordem -, prejudicando o abastecimento de alimentos e bens essenciais. Importante mencionar que os varejistas de pequeno porte trabalham com estoques baixos, o que poderá comprometer o abastecimento dessa população - fora o risco de remarcações abusivas de preços. Há relatos de falta de mercadorias em algumas regiões. Nesse cenário, o impacto na economia será maior do que o esperado pelo gestor público na sua tomada de decisão.
As fórmulas de países mais ricos para lidar com a epidemia precisam, portanto, ser adaptadas à realidade brasileira, principalmente na periferia dos centros urbanos.
Essa reflexão é particularmente pertinente na decisão de fechar escolas públicas de ensino fundamental de forma indiscriminada, abrangendo a todos, como realizado nos demais países afetados pela pandemia. Uma medida tomada diante do desastre iminente, mas com efeitos colaterais perversos em um país com parcela importante da população em situação vulnerável.
Para as camadas mais populares, onde a fertilidade das mulheres é mais elevada, é particularmente dramático as crianças ficarem em casa por período que poderá ser prolongado.
O impacto do fechamento de escolas tem sido grande. Interessante citar relatos de líderes comunitários com quem tive a oportunidade de conversar nestes últimos dias: “As famílias têm muita dificuldade em fazer isolamento, por questões estruturais: as casas são pequenas e sem ventilação, e as famílias numerosas.” “Muitas crianças ficam nas ruas.”
A elevada densidade demográfica em muitas comunidades e a falta de saneamento é combinação perigosa.
As escolas poderiam ser preparadas para cuidar das crianças, sendo um local mais seguro do que os próprios lares, muitos insalubres, e certamente, as ruas. Não é uma tarefa tão fácil, inclusive pelo treinamento dos funcionários e do corpo docente, mas possivelmente mais efetiva para conter a epidemia nas comunidades. As crianças, se bem cuidadas nas escolas, talvez sejam potencialmente menos transmissoras do vírus.
Não menos importante, as crianças ficariam menos vulneráveis à insegurança alimentar decorrente da queda brutal de renda de chefes de família, muitos em ocupações informais. Além disso, o maior estresse familiar poderá alimentar a violência doméstica contra crianças e mulheres - preocupação de líderes comunitários.
As comunidades nos centros urbanos são particularmente vulneráveis. Políticas focalizadas são urgentes para evitar situações extremas nesses grupos. Ocorre que a implementação de políticas de transferência de renda para aqueles que não estão no bolsa-família é difícil e leva tempo. Até lá - se é que essas políticas, se conduzidas, serão suficientes para a subsistência das famílias - a alimentação das crianças estará ameaçada. Crise social contratada.
Talvez seja necessário introduzir escolas em tempo integral para o ensino fundamental de regiões mais carentes. Garantir a continuidade das aulas seria algo importante, mas secundário neste momento. O objetivo é cuidar da saúde da comunidade e da alimentação das nossas crianças mais carentes.
O confinamento poderá ser prolongado. Convém repensar o papel das escolas públicas.
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