Sem causa aparente, mas de súbito e enquanto gozavam de boa saúde, as pessoas eram atacadas por intenso calor na cabeça e vermelhidão e inflamação dos olhos, e as partes internas da boca (tanto a garganta quanto a língua) ficavam imediatamente da cor do sangue e passavam a exalar um hálito anormal e fétido. No estágio seguinte apareciam espirros e rouquidão, e pouco tempo depois o mal descia para o peito, seguindo-se tosse forte."
Assim Tucídides descreve a epidemia que assolou Atenas entre 430 e 427 a.C. Ele próprio pegou a doença, se recuperou e conseguiu avançar, mas não terminar, sua única obra, o clássico "História da Guerra do Peloponeso", narrando o conflito de 27 anos no mundo helênico.
Se ao misturar fato e ficção em "Um Diário do Ano da Peste" Daniel Defoe inventou há 300 anos o jornalismo literário (bem antes, portanto, de Tom Wolfe e Gay Talese), Tucídedes foi o primeiro repórter digno do nome. Ao explicar seu método de trabalho, deixa isso claro: "O empenho em apurar os fatos se constituiu numa tarefa laboriosa, pois as testemunhas oculares de vários eventos nem sempre faziam os mesmos relatos a respeito das mesmas coisas, mas variavam de acordo com suas simpatias por um lado ou pelo outro, ou de acordo com sua memória".
Com Bolsonaro, de longe dá para sentir o hálito anormal. Useiro e vezeiro em insultar a imprensa, ele já escolheu seu lado de simpatia: o do poder econômico. Agiu para autorizar a suspensão de salários, mas teve de voltar atrás. Em briga com os governadores, está isolado como se tivesse contraído a Covid-19.
Joãosinho Trinta, profeta? Com o Sambódromo virando abrigo para a população de rua, "Ratos e Urubus, Larguem Minha Fantasia", célebre enredo da Beija-Flor de Nilópolis em 1989, deixou de ser um delírio carnavalesco. É realidade.
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