O acaso gerou um dilema na Folha de quarta última (18). Neste espaço, escrevi sobre a gripe espanhola, que, entre setembro e novembro de 1918, matou cerca de 50 milhões de pessoas no mundo. E aproveitei para esclarecer que o presidente Rodrigues Alves (1848-1919) não foi uma de suas vítimas. No mesmo caderno, o leitor se deliciou com a coluna de Elio Gaspari, em que ele simula uma carta de Rodrigues Alves a Jair Bolsonaro e, em certo momento, faz Alves dizer: "Eu deveria ter voltado à Presidência em 1918, mas peguei a gripe espanhola e morri". E agora?
Leitores escreveram perguntando quem tinha razão. Alguns tomaram partido por um ou outro colunista e uma ou outra versão. Afinal, segundo as enciclopédias e wikipédias, Rodrigues Alves morreu da gripe. Mas ouso discrepar.
Em 1916, Alves era governador de São Paulo quando a recorrência de um beribéri obrigou-o a passar o cargo para seu vice, o advogado Carlos Augusto Pereira Guimarães. Alves sabia de seu estado e já antevia o fim da carreira política, mas foi convencido por seu partido, o PRP (Partido Republicano Paulista), a disputar a Presidência. Elegeu-se em 1º de março de 1918 e preparou-se para a posse em 15 de novembro.
Seus problemas renais, respiratórios, gastrointestinais, musculares e de memória, consequências do beribéri, se agravaram durante o ano. Às vésperas da posse, muito debilitado, transferiu-a para seu vice, Delfim Moreira. Àquela altura, a espanhola já estava indo embora do Rio. Mas Alves contraiu uma gripe benigna, que piorou sua condição. Morreu em 19 de janeiro de 1919, quando a espanhola já desaparecera e a cidade, rediviva, se atirava freneticamente ao Carnaval.
Significa que tanto eu como Elio estávamos certos. Elio fez Alves dizer: "Peguei a espanhola e morri". Não disse que ele morreu DA espanhola. A espanhola matava em quatro dias —e Alves levou um ano para morrer.
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