quarta-feira, 25 de março de 2020

Surgem os buracos, FSP

Entre o planejado e a realidade há uma enorme diferença

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Por um momento, deixei-me iludir pela preparação razoavelmente competente das autoridades sanitárias para a epidemia. Foi bom ver que elas pelo menos tinham planos, ao contrário do comandante-mor. Mas é claro que, entre o planejado e a realidade, há uma enorme diferença. E foi só a realidade aproximar-se para os buracos aparecerem.
Falta equipamento de proteção individual para os profissionais de saúde. Eles estão, em muitas unidades, trabalhando com material menos seguro que o desejável e com estoques menores que os confortáveis. Não ignoro que haja carência mundial desses produtos, mas a distribuição do que temos deveria ter sido mais criteriosa. Se médicos e enfermeiros mais habituados a lidar com situações críticas tiverem de ser afastados da linha de frente para cumprir quarentenas, nosso desempenho em salvar vidas será pior.
Voluntários fabricam máscaras e jalecos para profissionais de saúde no laboratórios de produção têxtil da Universidade de Passo Fundo (UPF) - Leonardo Andreoli - UPF/Divulgação
Algo parecido vale para os testes. Eles são importantíssimos para tentar quebrar as cadeias de transmissão na comunidade e indispensáveis para gerenciar o fluxo nos hospitais. O pior cenário é aquele em que pacientes de Covid-19 são misturados com os de outras doenças, infectando uma população cujo risco já tende a ser aumentado.
O gargalo são as UTIs, mais especificamente os ventiladores pulmonares. O mundo inteiro corre para produzi-los, mas eles dificilmente chegarão antes de um pico de demanda. Ocorre que mesmo nessa situação desesperadora há o que fazer, se houver planejamento.
Há ao menos um trabalho acadêmico (Neyman e Irvin, 2006) referendando a repartição de ventiladores em situações de catástrofe. Desde que o peso dos pacientes e os parâmetros ventilatórios necessários sejam parecidos, um único aparelho pode ser usado por quatro pessoas. Falamos aqui de em tese quadruplicar a capacidade. É claro que, para essa medida tornar-se viável, é preciso providenciar réguas e tubulação extra para as ligações. Há alguém cuidando disso?
Hélio Schwartsman
Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".

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