sexta-feira, 6 de junho de 2025

Censo: 'goleada' evangélica não aconteceu, diz pesquisador que previa maioria até 2032, FSP

 Anna Virginia Balloussier

São Paulo

Em 2018, o demógrafo José Eustáquio Alves havia projetado que evangélicos bateriam os católicos como maior bloco religioso do Brasil até 2032. Ele retira o que disse.

Pesquisador aposentado da Escola Nacional de Ciências Estatísticas do IBGE, ele afirma à Folha que esse prazo foi dilatado. "Pra mim vai ser próximo de 2050." Isso se esse dia chegar.

Alves reagiu à divulgação, nesta sexta (6), dos números religiosos do Censo colhido em 2022. Evangélicos são 26,9% da população acima de 10 anos, e católicos, 56,7%. Antes, especulava-se que a essa altura os crentes já beirariam um terço do país.

O placar, segundo o pesquisador, não foi a goleada aguardada por evangélicos. Estaria mais para "1 a 0" desse grupo cristão contra o catolicismo, diz.

Ele, contudo, aponta possíveis fatores que podem ter refletido num crescimento mais acanhado. O IBGE, por exemplo, decidiu desta vez trabalhar apenas com dados da população acima de 10 anos, e é sabido que evangélicos tendem a ser mais jovens do que católicos.

Para se ter uma ideia, no Censo 2010, os crentes eram 22,2% no total. Mas, excluindo crianças abaixo dessa faixa etária, iam para 21,6%. Ou seja, se a metodologia passada valesse agora, evangélicos de certo aumentariam algo perto de um ponto percentual na estatística —ainda que não alcançassem o patamar esperado.

O sr. já projetou que os evangélicos ultrapassariam os católicos em menos de uma década, até se tornarem maioria no país. Mantém a previsão?
Não. Olha, o primeiro problema é que o IBGE ficou 12 anos sem nenhuma pesquisa de religião. Então a gente ficou meio num limbo nesse período. Na minha projeção, fiz uma suposição de que a queda dos católicos ia acelerar, e a subida dos evangélicos ia acelerar também. Algumas pesquisas —Datafolha, Latinobarómetro, Pew — mostravam que essa transição estava acelerando. E também por causa do crescimento dos templos. Isso aí influenciou muito. Só a Assembleia de Deus tem hoje mais templo do que toda a Igreja Católica.

No fim, a expansão evangélica desacelerou.
É, os dados do Censo mostraram que, na verdade, católicos perderam menos [fiéis], e os evangélicos cresceram mais lentamente.

O que aconteceu?
Até que ponto a gente pode confiar nesses dados do Censo? Ainda acho que é a melhor alternativa que a gente tem, mas temos que trabalhar [os dados] com cuidado. Duas coisas que chamo a atenção. Primeiro, o Censo teve um erro de cobertura grande. Contou 203 milhões de pessoas [e projetou mais de 210 milhões na população]. Quase 8 milhões de pessoas não foram entrevistadas. A gente não sabe até que ponto isso pode ter impactado os dados de religião.

Um homem de óculos e terno cinza, com uma gravata vermelha, está falando em uma mesa de reunião. Ele parece estar explicando algo, gesticulando com a mão. À sua frente, há um copo de água e papéis. Ao fundo, um outro homem, vestido de preto, está sentado e prestando atenção. O ambiente é de uma sala de reuniões, com paredes claras e uma mesa de madeira.
José Eustáquio Diniz Alves durante audiência pública no Senado; ele prevê que evangélicos poderão ultrapassar católicos após 2050 - Edilson Rodrigues - 24.set.15/Agência Senado

Nos Censos anteriores havia ocorrido algo assim?
Foi menos. O de 2010 foram 4 milhões de pessoas [que não responderam]. Não acho que inviabilize os dados, não, mas é só um alerta, entendeu? Agora, meu segundo ponto é a mudança de metodologia. [Não consideraram no recorte religioso] as crianças com menos de dez anos.

E a tendência religiosa desse grupo é qual?
Boa parte dessas crianças era sem religião. Principalmente quando o pai é de uma religião, a mãe é de outra, quando pergunta qual que é a religião da criança, tendiam a falar que não tinha, porque não definiu ainda. Isso pode ter afetado os números dos ‘sem religião’ [9,3% do total], eu esperava uma cifra um pouquinho maior.

Evangélicos são, na média, mais jovens do que católicos. Isso pesou?
Entre os idosos tem muito mais católico. Se você pega a distribuição dos evangélicos, a proporção é maior entre os jovens, inclusive crianças. Tem que fazer um estudo melhor de qual foi o impacto dessa mudança metodológica sobre os resultados finais.

O sr. ao mesmo tempo diz que esses fatores não bastam para justificar o avanço evangélico mais lento.
Realmente é uma surpresa. Mostrou uma maior resiliência dos católicos e um menor dinamismo dos evangélicos. Tentando pensar um pouco sobre isso, acho que tem a ver até com a experiência dos Estados Unidos, de outros países, que é essa polarização. Essa identificação da extrema-direita e do bolsonarismo com o evangélico, isso acabou afastando muita gente [das igrejas], os evangélicos moderados. Essa polarização é boa para fazer like em rede social. Mas, no global, afasta muita gente que está buscando refúgio espiritual.

Acredita que a expansão evangélica vai bater um teto, ou eles ainda podem superar os católicos?
O Paul Freston [sociólogo da religião] falou que a queda dos católicos tem um piso, e a subida dos evangélicos tem um teto que está em torno de 40%. Mas vou te dar um exemplo. Seropédica [município da Baixada Fluminense], em 1991, tinha quase 70% de católicos. Hoje são 19,5%. Então, respondendo a sua pergunta, ainda acho que não existe um teto nem um piso definido. Tudo pode acontecer.

E o prazo?
Uma coisa é certa, dilatou esse prazo dos evangélicos passando os católicos. Pra mim vai ser próximo de 2050, se passar [antes ele estimava até 2032].

Que outros dados religiosos chamaram sua atenção?
A queda do espiritismo era até esperada, dado o escândalo lá do João de Deus. Tinha quase certeza que ia afetar esse crescimento dos espíritas. Agora, o crescimento da umbanda e do candomblé também acho esperado [de 0,3% para 1%], porque tem todo esse movimento de fortalecer a cultura afrodescendente.

Existe essa ideia da dupla cidadania religiosa do brasileiro. Muitos declaram a fé católica, por exemplo, mas tem algum pezinho em outra fé.
Eu tinha uma dentista que era super religiosa. Aí ela teve um problema na garganta e foi no terreiro para tratar. Agora, se você perguntar para ela, óbvio que ela vai falar que é católica. Essa dupla pertença aí é muito difícil de medir. O IBGE já tentou, mas pouquíssima gente fala que tem duas religiões.

Que grupos religiosos saem "perdendo" e "ganhando" nesse último levantamento?
O negócio é o seguinte, é igual jogo de futebol. Todo mundo pensou que os evangélicos iam dar uma goleada em cima dos católicos. Estávamos esperando o católico cair muito, ficar abaixo de 50%, e ficou com quase 57%. Os evangélicos vão ficar com o pé atrás. Não vão estourar a boca do balão, mas é o grupo que mais cresceu.

Não foi um 7 a 1 deles sobre católicos.
Tá mais para 1 a 0.

RAIO-X

José Eustáquio Alves, 71

Belo Horizonte. É doutor em demografia, autor do livro "Demografia e Economia nos 200 anos da Independência do Brasil e Cenários para o Século XXI" e pesquisador na Decifra Ensino e Pesquisa em Demografia. Integrou o time de pesquisa do IBGE até se aposentar, em 2019.

Hélio Schwartsman - Uma briga didática, FSP

 Dois egos desproporcionalmente grandes não podem ocupar o mesmo espaço de poder ao mesmo tempo. À luz da psicologia, um rompimento entre Donald Trump e Elon Musk era mais ou menos inevitável. Ainda assim, surpreendem a velocidade da deterioração da relação entre os dois e os termos fortes com os quais um qualifica o outro agora.

As divergências entre o par vinham se acumulando já havia algum tempo, mas apenas uma semana atrás eles ainda tentavam dar um ar de civilidade ao divórcio. Na sexta-feira (30), Trump organizou na Casa Branca uma despedida para Musk, que deixava o governo para cuidar de suas empresas. Ali trocaram palavras elogiosas e juraram amor eterno.

O presidente dos EUA, Donald Trump, e o bilionário Elon Musk no Salão Oval da Casa Branca - Roberto Schmidt/AFP

Na quinta (5), a eternidade acabou. A amizade inquebrantável deu lugar a asperezas, que incluíram insinuação de envolvimento com pedofilia, pedido de impeachment e ameaça de retaliações bilionárias, tudo em estilo ultra-hiperbólico. Se há algo que as redes sociais favorecem, é a escalada de conflitos interpessoais.

Eu estaria mentindo se não dissesse que estou me divertindo a valer com a contenda. Mas há mais coisas em jogo aqui do que o deleite de quem não gosta de Trump nem de Musk. Como escrevi há pouco aqui, baixaria também é informação.

A disputa escancara pontos fracos da democracia americana, em especial no que diz respeito ao financiamento de campanhas e na posterior retribuição de doadores com favores do governo. Se tivessem juízo, legisladores e magistrados começariam a repensar essas questões.

A refrega também pode ter o efeito de despertar alguns eleitores e políticos republicanos de seu sonho dogmático. Sei que estou sendo mais otimista do que recomenda a prudência, mas não é impossível que alguns indivíduos que são fãs tanto de Trump como de Musk resolvam a dissonância cognitiva que o embate entre eles impõe afastando-se de ambos. Afinal, se eles sempre dizem verdades, nenhum dos dois presta; se mentem, então não havia razão para idolatrá-los.

Sob vários aspectos, é uma briga didática.


Baixou o santo do bispo Crivella no Eduardo Paes, Alvaro Costa e Silva- FSP

 Candidato a governador, Eduardo Paes tem pressa. Antes da aprovação do projeto na Câmara do Rio, fez a convocação do primeiro processo seletivo para a Força de Segurança Armada. Explicou ao Ministério Público que a divisão com até 4.200 agentes irá agir como polícia apenas em casos envolvendo pequenos delitos e atuando em conjunto com a Polícia Militar e a Polícia Civil, sem sobrepor atribuições.

A população, sofrendo com a criminalidade, está a favor do choque de ordem com bala na agulha. Mas é uma harmonia difícil, melhor esperar para ver na prática. O maior receio é em relação ao treinamento dos guardas terceirizados.

O prefeito se movimenta para agradar os eleitores da direita, fazendo com que eles se esqueçam do aliado Lula. Apesar da vitória folgada na eleição municipal, Paes sabe que o estado ainda se mostra simpático ao bolsonarismo, sobretudo na Baixada Fluminense e em cidades importantes e populosas do interior.

É a vantagem do grupo liderado pelo governador Cláudio Castro, que, com o controle da máquina, usa e abusa do clientelismo. Ele fechou com a candidatura do atual presidente da Assembleia Legislativa, Rodrigo Bacellar, um nome ainda desconhecido. Os dois já tratam de proceder com a típica apelação eleitoreira. Mesmo com o orçamento estadual no vermelho em R$ 14,6 bilhões neste ano, querem reduzir para R$ 4,70 o preço das passagens de trem e metrô, como foi feito nas barcas, em março.

Em busca do voto conservador e evangélico, Eduardo Paes anda diferente, quase não lembrando o político que se esbalda com a Portela no Sambódromo e gosta de fazer graça nas redes. Alguns cariocas estão convencidos de que ele levou um passe poderoso e incorporou o bispo Crivella.

Após a onda de críticas e protestos contra o decreto de ordenamento da orla, Paes voltou atrás, permitindo a música ao vivo nos quiosques e a venda de bebidas em garrafas. Também recuou na decisão mais vital para a cidade: a velocidade máxima de 60 km por hora para motos não será implantada.

A imagem mostra um homem vestido com um terno azul e um chapéu branco, dançando e sorrindo em meio a uma multidão durante um evento de carnaval. Ao fundo, há pessoas vestidas com fantasias coloridas e plumas, criando um ambiente festivo. A iluminação é intensa, destacando a alegria do momento.
Eduardo Paes no desfile da Portela no Carnaval de 2025 - Mauro Pimentel - 5.mar.25/AFP