quarta-feira, 4 de junho de 2025

Zema diz que existência da ditadura militar é 'questão de interpretação' e promete indulto a Bolsonaro, FSP

 Fábio Zanini

São Paulo

Para o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), 60, a ditadura militar é uma "questão de interpretação".

Ao prometer conceder indulto ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) caso seja eleito para o Palácio do Planalto, ele relativizou o regime autoritário que vigorou de 1964 a 1985 e disse que cabe aos historiadores "debater isso".

Romeu Zema em entrevista no estúdio da TV Folha
Romeu Zema em entrevista no estúdio da TV Folha - Gabriel Moreno/Folhapress

Zema tem se apresentado como pré-candidato a presidente e busca construir uma plataforma de campanha. Na semana passada, esteve em El Salvador para conhecer o programa de segurança, que derrubou fortemente os índices de violência, mas sob acusação de abusos. Ele elogiou a política linha-dura e disse que seria modelo para sua eventual gestão.

Também promete um corte de gastos duro, inspirado no de Javier Milei na Argentina, mas diz não ver necessidade de um tratamento de choque.

Zema afirmou ainda que não disputaria a eleição contra Bolsonaro, mas não descartou sua candidatura caso um dos filhos ou a mulher do ex-presidente concorra em 2026.

O sr. voltou de El Salvador tendo o país como um modelo na segurança pública?
Sim. Visitei duas comunidades, conversei com dezenas de pessoas, e todas, sem exceção, falaram que a vida mudou da água para o vinho desde que o governo passou a equiparar facções criminosas a grupos terroristas.

É possível transplantar essa realidade para um país grande como o Brasil?
Totalmente. Se lá tem um efetivo policial, um Exército, aqui nós temos algo proporcional, plenamente viável. O que falta no Brasil é ter coragem de colocar criminosos atrás das grades.

Há denúncias contra o presidente Nayib Bukele, por perseguir e prender opositores. Isso não contraria uma coisa que o sr. defende, a liberdade de expressão?
Defendo a liberdade de expressão e o Estado democrático de Direito. As pessoas lá não tinham isso. Se alguém falasse alguma coisa, levava tiro, era executado. Hoje, eles têm liberdade de ir e vir a qualquer momento, não são extorquidos mais.

O que o senhor acha das ações que o governo Lula tem tomado nessa área, como a PEC da Segurança?
É uma PEC que não resolve o problema. O que eles estão fazendo ali é trocar o pneu de um calhambeque, de uma furreca. Hoje, Minas já troca informações com São Paulo, Goiás e Rio de Janeiro. Unificar todo o Brasil pode ajudar em alguma coisa, mas não vai na origem do problema, que é prender quem mata e quem rouba.

Há racionamento de combustíveis das viaturas policiais em Minas Gerais atualmente. Não é um contrassenso o sr. ter viajado para El Salvador usando dinheiro público?
Em Minas nós temos diversos indicadores de crimes que mostram se tratar do estado mais seguro do Brasil.

Os gastos com uma viagem dessas não seriam melhor aplicados dentro do próprio estado?
Eu fiquei lá três dias, fui com uma comitiva de mais seis pessoas e em avião de carreira. Trouxemos coisas que vão ajudar muito. Em El Salvador tem uma lei que determina que as operadoras de celular não podem ter sinal dentro dos presídios. Que maravilha seria se o Brasil fizesse isso. Se eu fui, foi para melhorar a segurança pública de Minas.

O sr. tem uma postura elogiosa ao presidente dos EUA, Donald Trump, mas ele adotou uma política de deportar imigrantes, sendo que muitos deles são mineiros. O sr. concorda com isso?
Todo país tem soberania. Acho que nós não podemos entrar em assuntos de outros países. O que lamento muito é o Brasil não ser a terra das oportunidades que nós poderíamos ser. Se tivéssemos aqui terroristas de outros países, nós íamos deixá-los soltos? Não que os brasileiros lá sejam terroristas.

Sobre a eleição, o sr. já se coloca como pré-candidato. Sairia candidato contra alguém da família Bolsonaro?
Fico satisfeito de ver que a direita tem várias opções e, quanto mais opções, mais chances, diferentemente da esquerda. Continuo confiante de que o presidente Bolsonaro possa ter os seus direitos políticos reconquistados e venha a ser o candidato. Se ele for, com toda certeza a direita vai trabalhar unida em torno do nome dele.

E se for um filho dele?
Aí eu acho que já vai ser um tanto quanto diferente. É difícil opinar nesse momento, está muito incipiente, mas continuo confiante no nome dele.

Se o Tarcísio for candidato à Presidência, o sr. manterá a sua?
É tudo muito incipiente.

O único contra quem o sr. não se candidata é o Jair Bolsonaro, é isso?
Está tudo muito verde ainda. Acho que nós temos que esperar. Temos muita coisa pela frente.

Caso o sr. seja eleito presidente, concederia indulto ao Bolsonaro?
Não foram concedidos indultos a assassinos e sequestradores aqui, durante o que eles chamam de ditadura? Agora você não vai conceder?

O sr. não tem convicção de que foi uma ditadura?
Não sei, eu não sou historiador, nunca me aprofundei.

O sr. tem dúvida?
Acho que não. Tiveram sequestradores e assassinos que receberam anistia, não foi? Nós temos que olhar para o futuro. Quando você está fazendo política e só procurando atacar, diminuir seus adversários, acho que isso prejudica muito o andamento da gestão.

Para não haver mal-entendido: quando o sr. diz "acho que não", acha que não houve ditadura ou é porque não tem dúvidas de que houve?
Acho que tudo é questão de interpretação.

Qual é a sua interpretação, houve ou não ditadura?
Eu prefiro não responder, porque acho que há interpretações distintas. E houve terroristas naquela época? Houve também. Então fica aí. Acho que os historiadores é que têm de debater isso. Eu preciso me preocupar, hoje, com Minas Gerais.

Podemos entender, então, que o senhor daria o indulto ao Bolsonaro?
Sim, daria.

Recentemente, o senhor mudou a sua maneira de se comunicar, tem feito vídeos chamativos, colocou Lula como bebê reborn, comeu banana com a casca para denunciar a alta dos alimentos. Por que a mudança?
Em 2015 e 2016, o Brasil viveu a maior recessão da história, provocada pelo PT. Nós estamos vendo a repetição. Antes, eu era um mero empresário. Agora, tenho uma responsabilidade maior como governador. Tenho de mostrar, até para a minha consciência, que a repetição está acontecendo. É um governo que só quer gastar, viajar com comitiva de 200 pessoas para fora, não está nem aí para juros, ainda quer mais IOF para cobrar do setor produtivo. Se eu ficasse calado, seria omisso.

Mas o sr. não tem receio de que esse tom tire um pouco da sua credibilidade como um governador sério? Não vejo nenhum constrangimento. O que a oposição em Minas faz comigo é muito pior. Já me enterraram não sei quantas vezes. Acho que faz parte do jogo da política e acaba fazendo com que as pessoas tenham um pouco mais de interesse.

O sr. falou muito sobre o governo Lula, mas ainda falta um ano e meio para a eleição. Acredita que ele possa recuperar popularidade?
Se o problema dele fosse só popularidade, poderia se recuperar. O problema dele é execução. Esse governo não entrega nada a não ser inflação, aumento de juros, de impostos e eventos demais. Toda hora é só anúncio e nada de entrega.

Como o sr. pretende explorar os pontos vulneráveis do governo?
Lamento que o governo parece querer ficar só entupindo a população de baixa renda de auxílio isso, auxílio aquilo. O que o brasileiro quer é ter dignidade, um salário, uma renda adequada, poder prosperar. O brasileiro está cansado de viver de esmola do Estado. Vive porque não tem alternativa. Nós temos de viabilizar a produção e a geração de renda do brasileiro.

O sr. citou o Bukele como um modelo de segurança. O Javier Milei é um modelo na economia?
O que está acontecendo na Argentina está muito no início ainda, mas há uma queda drástica na inflação e é o que todos os manuais de economia responsáveis recomendam. Não é imprimindo papel que você resolve os problemas. A Argentina está trilhando o caminho que vai colocá-la novamente na prosperidade. Leva-se tempo e muitas vezes as pessoas são imediatistas, mas nenhum país se tornou desenvolvido em 10, 20 anos.

Uma medida de choque é necessária para o Brasil?
Acho que não. Se fizermos aqui o gradualismo corretamente, o Brasil avança muito. Não precisamos de nenhuma revolução. Nós não temos uma inflação de 200% ao ano. Temos uma inflação alta que incomoda principalmente quem ganha menos. Uma redução no gasto público, uma reforma administrativa, seria muito bem-vinda e ajudaria aqueles que ganham menos.


RAIO-X | ROMEU ZEMA, 60
Governador de Minas Gerais em segundo mandato, após ter sido reeleito no primeiro turno em 2022, é pré-candidato a presidente pelo partido Novo. Natural de Araxá (MG), é empresário e dono do Grupo Zema.

Como carro elétrico de R$ 39 mil com um único assento virou grande sucesso no Japão, FSP

 Nicholas Takahashi

Bloomberg

A KG Motors desenvolveu um carro elétrico de um só assento que se parece mais com um carrinho de golfe futurista do que com um veículo elétrico moderno —muito menos com um carro tradicional. E, mesmo assim, mais da metade das 3.300 unidades que a empresa planeja entregar em 2027 já foram pré-vendidas.

Isso coloca a startup no caminho de vender mais carros elétricos no Japão do que a maior montadora do mundo, a Toyota Motor Corp., que comercializou cerca de 2.000 desses veículos em todo o ano de 2024. Em um país onde carros elétricos ainda são raridades, a KG Motors tenta derrubar um mito crescente: o de que maior é melhor.

"Os carros são simplesmente grandes demais", disse o fundador e CEO Kazunari Kusunoki. "Ver tantos carros enormes circulando pelas ruas estreitas do Japão — foi aí que tudo começou para mim."

Um carro pequeno e estilizado, predominantemente amarelo, com janelas pretas e rodas brancas. O design é moderno e minimalista, com uma forma quadrada e linhas suaves. O fundo é de uma cor amarela sólida, complementando o veículo.
O mibot, carro elétrico de um só assento que se parece mais com um carrinho de golfe futurista - Divulgação/KC Motors

Com menos de 1,5 metro de altura, o mibot da KG Motors tem autonomia de 100 quilômetros, tempo de recarga de cinco horas e velocidade máxima de 60 km/h. Ele custará 1 milhão de ienes (cerca de R$ 39,5 mil) antes de impostos, quando a produção começar em outubro na nova fábrica da empresa, a leste de Hiroshima. Isso equivale a cerca da metade do preço do carro elétrico mais popular do Japão, o Sakura, da Nissan.

Até hoje, montadoras nacionais e estrangeiras têm enfrentado dificuldades para conquistar o mercado japonês de veículos elétricos. Esses carros representaram cerca de 140 mil unidades —ou cerca de 3,5% do total de vendas de veículos no país em 2023—, muito distante da média global de 18%, segundo a BloombergNEF. A gigante chinesa BYD, por exemplo, vendeu 2.223 automóveis no Japão em 2024 — uma fração dos 4,3 milhões entregues mundialmente.

Enquanto isso, a Toyota e suas concorrentes japonesas divergem de outras montadoras tradicionais que apostam exclusivamente nos elétricos.

A Toyota defende há tempos uma abordagem "multirota" para um futuro mais verde, no qual veículos elétricos, a gasolina, híbridos e movidos a hidrogênio têm papéis complementares. Como resultado, os híbridos a gasolina-elétrico —uma inovação das montadoras japonesas— ainda dominam o mercado.

"A Toyota disse que os veículos elétricos não são a única solução e, como é a Toyota, os japoneses assumem que isso deve ser verdade", afirmou Kusunoki. "Muita gente no Japão parece acreditar que os EVs nunca se tornarão populares."

Ao menos nesse ponto, o Japão tem sido mais lento em aderir à tendência global de veículos maiores e mais espaçosos. Carros pequenos sempre foram parte do cenário local, e os leves kei cars japoneses até conquistaram fãs cult fora do país. Nos últimos anos, eles passaram a liderar o mercado doméstico de EVs, respondendo por 55% das vendas em 2023.

O Sakura, da Nissan, é um kei car, com pouco menos de 23 mil unidades vendidas em 2024. Em abril, a BYD anunciou planos de produzir um kei car totalmente elétrico, voltado especificamente para o mercado japonês, na segunda metade de 2026.

Já a Hyundai lançou neste ano o Inster, veículo de 2,9 milhões ienes (R$ 110 mil) que a empresa afirma ser o EV mais barato do Japão —ao menos entre os modelos de passageiros de tamanho convencional.

Carros elétricos compactos também ajudaram a estimular a aceitação do consumidor por EVs fora do Japão. Na China, maior mercado de EVs do mundo, o Hongguang Mini, da SAIC-GM-Wuling, chegou a liderar as vendas no país.

A imagem mostra o interior de um veículo com um design moderno e minimalista. O painel é predominantemente amarelo, com detalhes em preto. O volante é circular e há um display digital que indica a temperatura, mostrando '34'. As portas têm um design simples com alças amarelas. O fundo da imagem é amarelo, criando um ambiente vibrante e acolhedor.
Carros pequenos sempre foram parte do cenário local, e os leves kei cars japoneses até conquistaram fãs cult fora do país - Divulgação/KG Motors

Ainda assim, com seu design de apenas um assento, o mibot da KG Motors pertence a uma categoria quase exclusiva. Os primeiros 300 devem ser entregues a clientes em Hiroshima e Tóquio até meados do próximo ano; os outros 3 mil serão enviados para todo o país, segundo Kusunoki.

A KG Motors diz que terá prejuízo com o primeiro lote, mas deve atingir o ponto de equilíbrio com o segundo. Depois disso, a meta é produzir cerca de 10 mil unidades por ano. A empresa está atualmente em processo de obtenção da certificação de segurança veicular necessária para comercializar o mibot.

O tamanho da startup e sua estratégia de produção sob demanda podem funcionar a seu favor. Veículos elétricos usam muito menos peças do que os carros a gasolina ou híbridos, mas o mibot leva isso a outro nível: é basicamente composto por uma bateria, um motor e eletrônica básica conectados por cabos dentro de um chassi monobloco com quatro rodas, reduzindo consideravelmente os custos de produção.

Até mesmo o marketing da KG Motors se apoia no passado de Kusunoki como criador de conteúdo no YouTube.

A empresa publicou vídeos em seu site mostrando o mibot sendo testado nas estradas geladas de Hokkaido, passando por becos entre casas apertadas nos bairros históricos de Hiroshima e colidindo contra paredes de concreto em alta velocidade para garantir que atenda aos rigorosos padrões de segurança do Japão.

Um carro elétrico compacto e moderno, pintado de amarelo, está em movimento em uma estrada. O veículo possui um design distinto com janelas grandes e uma forma arredondada. O fundo apresenta um campo verde e um céu azul com algumas nuvens.
Com menos de 1,5 metro de altura, o mibot tem autonomia de 100 quilômetros, tempo de recarga de cinco horas e velocidade máxima de 60 km/h - Divulgação/KG Motors

Kusunoki, de 43 anos, fundou a KG Motors em junho de 2022. Ele cresceu em Higashihiroshima, uma cidade suburbana cujas ruas às vezes são estreitas demais até mesmo para um sedã japonês. Assistiu à infraestrutura de transporte público do país se deteriorar à medida que a escassez de motoristas de táxi se agravava com o envelhecimento e encolhimento da população.

Com o êxodo dos jovens para os grandes centros urbanos, também está se tornando mais difícil para os idosos se locomoverem. Por isso, a KG Motors vê uma demanda crescente por carros compactos de um ou dois lugares, com custo acessível. Até o início de maio, a empresa havia recebido 2.250 pedidos, com mais de 95% vindos de pessoas que já têm pelo menos um veículo.

"Nas áreas rurais do país, o transporte público está em frangalhos", disse Kusunoki. "Isso pode ser difícil de entender para quem vive em Tóquio, mas chega um momento em que se torna necessário ter um carro por pessoa — não apenas por família.

Cientistas no Japão desenvolvem plástico que se dissolve na água do mar, FSP

 Irene Wang

Waka (Japão) | Reuters

Pesquisadores no Japão desenvolveram um plástico que se dissolve na água do mar em questão de horas, oferecendo uma potencial solução para um flagelo moderno que polui os oceanos e prejudica a vida selvagem.

Embora cientistas há muito experimentem plásticos biodegradáveis, pesquisadores do Centro RIKEN para Ciência da Matéria Emergente e da Universidade de Tóquio afirmam que o material proposto se decompõe muito mais rapidamente e não deixa nenhum resíduo.

Plástico desenvolvido por pesquisadores é dissolvido em águia com sal em laboratório em Wako, no Japão - Manami Yamada /Reuters

Em um laboratório na cidade de Wako, próximo a Tóquio, a equipe demonstrou um pequeno pedaço de plástico desaparecendo em um recipiente com água salgada após ser agitado por cerca de uma hora.

A equipe ainda não detalhou planos para comercializar o produto, mas o líder do projeto, Takuzo Aida, disse que a pesquisa atraiu interesse significativo, inclusive do setor de embalagens.

Cientistas em todo o mundo estão correndo para desenvolver soluções inovadoras para a crescente crise de resíduos plásticos.

A poluição plástica deve triplicar até 2040, estima o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, adicionando por ano de 23 a 37 milhões de toneladas de resíduos aos oceanos do mundo.

"As crianças não podem escolher o planeta em que viverão. É nosso dever como cientistas garantir que deixemos para elas o melhor ambiente possível", afirmou Aida.

O pesquisador disse que o novo material é tão resistente quanto os plásticos à base de petróleo, contudo se decompõe quando exposto ao sal. Os componentes originais podem então ser processados por bactérias em um processo natural, evitando assim a geração de microplásticos que são prejudiciais à vida aquática.

Como o sal também está presente no solo, um pedaço de aproximadamente cinco centímetros se desintegra na terra após mais de 200 horas, acrescentou o pesquisador.

O material pode ser usado como plástico comum quando revestido, e a equipe está concentrando sua pesquisa atual nos melhores métodos de revestimento, disse Aida. O plástico é não tóxico, não inflamável e não emite dióxido de carbono, ainda segundo ele.