segunda-feira, 16 de setembro de 2024

Bobo da corte é coach de idiotia política, Muniz Sodré. FSP

 Ante a admissão de Pablo Marçal de que surfa na idiotia, cabe perguntar se parte da Paulicéia está fora de si, ou desvairada para além dos versos modernistas de Mário de Andrade. A resposta comporta uma distinção entre idiota e bobo da corte, nisso ajuda a ópera "Rigoletto", de Verdi. Na corte de um Duque veneziano, Rigoletto, o bufão, não é nenhum parvo, mas alguém que sabe o que quer e, no caminho, combina intrigas com crime. Idiotas são os alvos de suas tramoias, exatamente como os seguidores de Marçal, por ele assim, aliás, referidos. Marçal está mais para Rigoletto do que para um microcéfalo bolsonarista.

É que o bobo da corte divertia por meio de verdades espirituosas, mas também incômodas, no que punha em risco o próprio pescoço. Era o avesso tolerado do rei. Agora, no universo paralelo das redes, sem centralização monárquica, desenha-se uma espécie de corte composta por financistas, empresários, evangélicos, gente do agronegócio e pacóvios "libertários", abertos à novidade de um esperto com pele de bobo.

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O candidato a prefeito de São Paulo, Pablo Marçal (PRTB) faz caminhada na favela do Jaguaré, na zona oeste da cidade - Bruno Santos - 25.ago.2024/Folhapress/Folhapress

Novidade em rede, e não ruptura, é o abre-te-sésamo da extrema direita. Troque-se o barrete pelo boné de Bukele, a roupa de guizos por um terno ao gosto da Faria Lima e a botina por um sapatênis, para compor o figurino de bufão na corte virtual de ricos, ou aspirantes, desvairados. O que atrai é o nada: nula experiência prévia, repetição de não-assuntos, nenhuma proposta viável.

Mas ressurge o maquiavelismo de Rigoletto contra os evangélicos. Encastelado numa mansão de 900 metros, seu "Quartel do Reino de Deus", Marçal ataca o dízimo, argumentando que a religiosidade dos crentes é independente da religião organizada por templos. Incrível que pareça, está próximo do sociofilósofo alemão Georg Simmel, para quem religiosidade não provém de religião. Seria de outra natureza, uma mescla de devoção e de vida própria como vetores psíquicos das condutas religiosas. Em suma, a relação com Deus não é definida por igrejas.

Destrambelhos à parte, o bufão emergente emplacou dois ardis. Primeiro, arrebatou do capitão Bozo o berrante metafórico com que ele arrebanhava o gado. Segundo, ao expor o trambique financeiro dos pastores, convida ao cristianismo como lifestyle, sem religião. Para isso investe em "templos de garagem", núcleos de oração celulares, velha estratégia do comércio de cosméticos. "Oração" é eufemismo para cabalar voto nas igrejas-palanques. O que caracterizou a incipiente criação digital nos EUA, aqui desponta como criatividade beata.

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Nada assegura a Marçal a gestão da maior cidade do país. Mas qualquer que seja o resultado das urnas, ele sai vitorioso na arena da ultradireita, por ter desbancado a idiotia bozolóide com a estratégia de Rigoletto: detrás da fachada de bobo da corte, a nostalgia da lama e o choque "redentor" de cursos afins à sua imersão na criminalidade de fraudes bancárias. O capitão Bozo foi superado no apetite por destruição que caracteriza o espírito extremista.

De todo modo, ai de ti, Paulicéia, por esse novo tipo de ópera-bufa, em que personagens reais ocupam palco, libreto e plateia para o desvario político numa sociedade que parece doente. A ópera séria sugere que Rigoletto seria uma figura do dia a dia. Mas a experiência mostra que bobo arrisca perder a graça: malandro demais se atrapalha. Talvez a proximidade com o colega Milei não leve a entoar nenhuma ária operística, mas a tocar um tango argentino, recomendação do poeta Manoel Bandeira (em "Pneumotórax") como epitáfio para uma doença terminal.

Trabalho duro e bebidas gasosas: conheça histórias de mulheres que viveram além dos 110 anos, NYT FSP

 

THE NEW YORK TIMES

Um dos homens mais velhos do mundo morreu em agosto, aos 111 anos. John Farringdon nasceu cerca de um ano depois do naufrágio do Titanic. Foi uma das poucas pessoas que viveram o suficiente para ver o mundo evoluir por mais de um século.

O mesmo aconteceu com algumas mulheres que morreram nos últimos anos. Kane Tanaka sobreviveu a duas guerras mundiais, ao surto de gripe de 1918 e a dois cânceres. Também sobreviveu a todos os seus filhos.

Mamie Kirkland, na época com 107 anos, durante uma reunião na sede da Prefeitura de Ellisville, no Missouri, cidade de onde sua família fugiu há um século, ameaçada de linchamento, dez de setembro de 2015.
Mamie Kirkland, na época com 107 anos, durante uma reunião na sede da Prefeitura de Ellisville, no Missouri, cidade de onde sua família fugiu há um século, ameaçada de linchamento, dez de setembro de 2015 - Andrea Morales/The New York Times

A infância de Mamie Lang Kirkland foi marcada por linchamentos e pela presença perigosa da Ku Klux Klan. Cresceu e se tornou vendedora porta a porta da Avon, distribuindo produtos de beleza e conselhos de vida.

Hester Ford viveu o suficiente para ter 120 tataranetos.

Maria Branyas Morera, espanhola nascida nos Estados Unidos, que viveu a guerra civil e o regime brutal de Francisco Franco, era considerada a pessoa mais velha do mundo. Morreu esta semana aos 117 anos.

Cada uma dessas mulheres era uma supercentenária, isto é, uma pessoa que viveu além dos 110 anos. Aqui estão trechos dos obituários do The New York Times para elas e outras supercentenárias que morreram recentemente. Quem sabe você ache a vida delas tão interessante quanto nós achamos.

RUTHIE TOMPSON (1910-2021)

Trabalhou em animações da Disney por mais de 40 anos e morreu em uma casa de repouso, na Califórnia, aos 111 anos. Quando criança, Ruthie Tompson passava todo dia em frente ao estúdio de cinema da Disney, a caminho da escola, e espiava seus escritórios. O próprio Walt Disney a viu e a convidou para assistir ao processo de animação.

Anos depois desse primeiro encontro, a Disney a convidou para trabalhar no estúdio como desenhista e pintora. Mais tarde, foi promovida para ajudar a editar e aperfeiçoar os milhares de desenhos que compunham os filmes de animação.

Durante mais de quatro décadas, trabalhou em quase todos os filmes de animação da Disney, de "Branca de Neve e os Sete Anões", lançado em 1937, a "Bernardo e Bianca", lançado em 1977.

A gravação feita pela Disney nos anos 40 revela detalhes do histórico de trabalho de Ruthie Tompson no estúdio - Disney/via The New York Times

LOUISE LEVY (1910-2023)

Ela era a pessoa viva mais velha conhecida no estado de Nova York quando morreu aos 112 anos. Louise Levy viveu tanto que se tornou objeto de pesquisa genética, mas acreditava que o segredo para uma vida longa não tinha nada a ver com genética. Preferiu creditar sua resistência a uma dieta de baixo colesterol, à atitude positiva e a uma taça diária de vinho tinto.

Sua idade e sua saúde, consideradas relativamente boas até seus últimos dias, despertaram o interesse de cientistas que a convidaram, em 1988, para um estudo genético sobre sua longevidade.

O Instituto de Pesquisa sobre o Envelhecimento, da Escola de Medicina Albert Einstein, no Bronx, recrutou 700 indivíduos, todos judeus asquenazes, para avaliar possíveis razões genéticas para sua vida excepcionalmente longa e saudável. A pesquisa descobriu mutações genéticas na população que ajudaram a protegê-la contra o colesterol alto, doenças cardíacas, diabetes e doença de Alzheimer, e que retardaram o impacto do envelhecimento.

MAMIE KIRKLAND (1908-2020)

Testemunhou a violência racial na juventude. Morreu aos 111 anos em sua casa no interior de Nova York.

Mamie Kirkland sobreviveu a algumas das histórias mais sombrias do Mississípi. Tinha sete anos, em 1915, quando acordou assustada com o pai contando à família que um grupo de homens brancos planejava linchá-lo e a um amigo seu. Ambos escaparam durante a noite e o resto da família fugiu pela manhã.

Deixaram o Mississípi, mas não conseguiram se livrar do racismo que ameaçava sua casa e sua vida. Em 1917, em East St. Louis, no Illinois, Kirkland viu homens brancos incendiarem casas e atirarem em pessoas em um bairro para onde moradores negros haviam se mudado recentemente.

Quando a família chegou a Alliance, em Ohio, anos depois, membros da Ku Klux Klan foram até sua casa, prontos para queimar uma cruz. Mas um vizinho branco, armado, afugentou os agressores.

Quando tinha 15 anos, Kirkland se casou e se mudou para Buffalo, no estado de Nova York, onde vendia produtos de beleza da Avon. Seu filho disse que o trabalho dela como vendedora evoluiu para ser uma coaching que dava lições de vida porta a porta.

As histórias de sua juventude inspiraram a criação do documentário "100 Years from Mississippi" (Cem anos de Mississípi). Pouco antes de morrer, deu uma palestra memorável no Museu do Legado e Memorial Nacional para a Paz e a Justiça, em Montgomery, no Alabama.

KANE TANAKA (1903-2022)

Trabalhou em uma base militar no Japão para sustentar a família. Quando morreu aos 119 anos, era a pessoa mais velha conhecida no mundo.

Kane Tanaka, nascida em 1903, em fodo tirada em janeiro de 2020 - Kyodo/Reuters

Kane Tanaka sobreviveu a guerras, pandemias, tratamentos de câncer e outras doenças. Não obstante, manteve a mente afiada e o raciocínio rápido até o fim da vida. Viveu mais que muitos membros da família, incluindo o marido e os filhos. Trabalhou em vários empregos para sustentar a família dentro de uma base militar no Japão, até o fim dos seus 70 anos. Era conhecida por manter o humor em alta, apesar das muitas dificuldades por que passou na vida. Adorava bebidas gaseificadas e chocolates, que pedia com frequência em seus momentos finais.

IRMÃ ANDRÉ (1904-2023)

Sobreviveu a duas pandemias e a uma infecção por Covid. Morreu aos 118 anos.

Irmã André foi uma freira católica romana que dedicou décadas de sua vida a cuidar de órfãos e de pessoas necessitadas quando foi designada para trabalhar em um hospital em Vichy, na França.

Em seus últimos anos, quando estava prestes a completar 117 anos, ganhou manchetes na imprensa por sobreviver a uma infecção por Covid-19. Quando morreu em 2023, um ano depois de Tanaka, irmã André era a pessoa mais velha conhecida do mundo. "O trabalho me manteve viva", disse aos repórteres um ano antes de sua morte.

HESTER FORD (1904 OU 1905-2021)

Cresceu cultivando campos e colhendo algodão em uma fazenda na Carolina do Sul. Morreu aos 115 ou 116 anos.

Hester Ford era a matriarca de uma árvore genealógica com centenas de ramos espalhados. Deixou 12 filhos, 68 netos, 125 bisnetos e, pelo menos, 120 trinetos. Viveu de forma independente até os 108 anos, quando os familiares se mudaram para perto dela, depois que ela caiu na banheira e machucou algumas costelas.

A família disse que a rotina matinal que ela seguia era, basicamente, comer metade de uma banana e tomar ar fresco. Ford não tinha um segredo para a longevidade. Quando lhe pediram que desse conselhos sobre como viver uma vida longa, declarou a um jornal local: "Eu só vivo direito, é tudo que sei."

VIRGINIA MCLAURIN (1909-2022)

Ela chamou a atenção por dançar com os Obama na Casa Branca em 2016. Morreu aos 113 anos, segundo os próprios registros.

Virginia McLaurin na Casa Branca com o ex-presidente dos Estados Unidos Barack Obama e a primeira-dama Michelle Obama em fevereiro de 2016, durante o Mês da História Afro-Americana - Lawrence Jackson/The White House

Virginia McLaurin foi convidada para entrar na sala e cumprimentar o presidente Barack Obama e a primeira-dama, Michelle Obama, em uma recepção comemorativa do Mês da História Negra, na Casa Branca, em 2016. Ela disse "Olá!" bem alto, aproximou-se do casal com entusiasmo, dançou com cada um deles e disse que estava muito feliz por ter um presidente e uma primeira-dama negros. "Achei que nunca viveria para entrar na Casa Branca", afirmou em um vídeo que registrou toda a visita.

McLaurin nasceu na Carolina do Sul durante a era das leis Jim Crow (legislação estadual e local que impunha a segregação racial no Sul dos Estados Unidos). Cresceu caminhando 16 quilômetros até a escola com o único par de sapatos que ganhava a cada ano. Por volta de 1939 se mudou para Washington como uma entre milhões de pessoas negras que se mudaram do Sul para os estados do Norte, Centro-Oeste e Oeste durante a chamada Grande Migração Negra, que ocorreu entre 1916 e 1970.

Trabalhou em vários empregos diferentes e viveu uma vida tranquila. Aos 106 anos, quando o vídeo que a gravou na Casa Branca foi compartilhado online, ela ganhou uma plataforma de onde falar. McLaurin usou a fama recém-adquirida para encorajar os americanos a votar.

Rita Hayworth não tinha testa, Ruy Castro - FSP

 Outro dia, folheando uma revista de sala de espera numa sala de espera, li que os procedimentos estéticos mais procurados pelos homens e mulheres que querem ficar bonitos são o peeling de diamante, o microagulhamento, a lipocavitação, a criolipólise e a carboxiterapia. Não entendi, mas fui em frente. Em outra página, deparei com a descrição de um novo tratamento para aquele velho terror das mulheres, a celulite: "A emissão sinérgica de radiofrequência monopolar e energia de pressão direcionada permite o tratamento das causas básicas em vez de suprimir os sintomas. Indicado para barriga, glúteos, braços e posterior de coxas."

 Rita Hayworth, numa cena clássica de ‘A Dama de Shangai’, com vestido preto tomara que caia
Rita Hayworth, numa cena clássica de "A Dama de Shangai", filme de 1946 de Orson Welles, então seu marido - Reprodução

Continuei no escuro, mas achei fascinante essa nova língua. Ela explica por que se vê tanta gente bonita atualmente. Só me pergunto como seria se os astros da era de ouro de Hollywood trabalhassem hoje. Algumas de suas características, que então ninguém notava, talvez fossem agora consideradas defeitos, a serem corrigidos por aqueles procedimentos.

Rita ("Gilda") Hayworth era linda e não tinha testa. Elizabeth Taylor quase não tinha pescoço. Raquel Welch, bumbum. Marlene Dietrich, os sisos, molares e pré-molares. Bette Davis era sampaku. Sophia Loren e Gina Lollobrigida não raspavam as axilas. Judy Garland era quase corcunda. Liza Minnelli, também. Marilyn Monroe era barrigudinha. Shirley MacLaine, olhos muito pequenos. Audrey Hepburn, zero de peitos. Barbra Streisand, por que era mesmo?

Os homens não ficavam atrás. Frank Sinatra, Humphrey Bogart, James Stewart, Gary Cooper, Gene Kelly, Fred Astaire, Bing Crosby, Burt Reynolds e Sean Connery usavam peruca. Além disso, Bogart era lingüinha (ciciava) e Astaire, Crosby e até Clark Gable, orelhudos. Richard Burton tinha pernas curtas. Rex Harrison, um olho de vidro. Marlon Brando não tomava banho. Kim Novak tinha cabelo preto e o tingia de louro. Elvis Presley era louro e o tingia de preto. E Marilyn, também loura, tingia-o de platina.

As colunas de fofocas de Hollywood falavam de tudo isso, mas ninguém dava bola. OK, Rita não tinha testa, Liz Taylor, pescoço, e Raquel, bumbum. E precisavam?