domingo, 7 de abril de 2024

Mãos

 6.abr.2024 às 15h00

Markham Heid
THE NEW YORK TIMES

A mão humana é uma maravilha da natureza. Nenhuma outra criatura na Terra, nem mesmo nossos parentes primatas mais próximos, possui mãos estruturadas exatamente como as nossas, capazes de agarrar e manipular com tanta precisão.

Mas estamos fazendo menos trabalhos manuais intrincados do que costumávamos fazer. Muitas das atividades da vida moderna envolvem movimentos simples, como tocar em telas e apertar botões, e alguns especialistas acreditam que nossa mudança para longe de atividades manuais mais complexas pode ter consequências para como pensamos e nos sentimos.

"Quando você olha para o 'lar cerebral' —como ele é dividido e onde seus recursos são investidos — uma grande parte dele é dedicada ao movimento, e especialmente ao movimento voluntário das mãos", disse Kelly Lambert, professora de neurociência comportamental na Universidade de Richmond, na Virgínia.

Mãos brancas fazendo crochê, linha laranja e agulha dourada
Trabalhos manuais fazem bem para o cérebro - Pexels/Miriam Alonso

Lambert, que estuda recompensas baseadas em esforço, disse que está interessada "na conexão entre o esforço que colocamos em algo e a recompensa que obtemos com isso" e que ela acredita que trabalhar com as mãos pode ser singularmente gratificante.

Em algumas de suas pesquisas com animais, a médica e seus colegas descobriram que ratos que usavam suas patas para cavar comida tinham taxas de hormônio de estresse menores e eram melhores na resolução de problemas em comparação com ratos que recebiam comida sem precisar cavar.

Ela vê algumas semelhanças em estudos com pessoas, que descobriram que uma série de atividades manuais —como tricotar, cuidar do jardim e colorir— estão associadas a benefícios cognitivos e emocionais, incluindo melhorias na memória e atenção, bem como reduções nos sintomas de ansiedade e depressão.

Esses estudos não determinaram que o envolvimento das mãos, especificamente, merece crédito. Os pesquisadores que estudaram o ato de colorir, por exemplo, especularam que isso poderia promover a atenção plena, o que poderia ser benéfico para a saúde mental. Aqueles que estudaram tricô disseram algo similar. "O ritmo e a repetição de tricotar um padrão familiar ou estabelecido eram calmantes, como meditação", disse Catherine Backman, professora emérita de terapia ocupacional na Universidade da Colúmbia Britânica, no Canadá, que examinou a ligação entre tricô e bem-estar.

No entanto, Backman disse que a ideia de que trabalhar com as mãos poderia beneficiar a mente e o bem-estar de uma pessoa parece plausível. Tarefas práticas que envolvem totalmente nossa atenção —e até mesmo nos desafiam levemente— podem melhorar a aprendizagem, acrescentou.

Lambert tem outra hipótese. "Com a depressão, as pessoas experimentam algo chamado de impotência aprendida, onde sentem que não importa o que façam, nada nunca funciona", disse ela.

Ela acredita que trabalhar com as mãos é estimulante para o cérebro e que isso poderia até ajudar a combater essa impotência aprendida. "Quando você se esforça e pode ver o produto disso, como um cachecol que você tricotou, acho que isso constrói um senso de realização e controle sobre o seu mundo."

Alguns pesquisadores se concentraram nas possíveis repercussões de substituir tarefas manuais relativamente complicadas por tarefas mais básicas.

Em um pequeno estudo com estudantes universitários publicado em janeiro, pesquisadores noruegueses compararam os efeitos neurológicos da escrita à mão com a digitação em um teclado. A escrita à mão foi associada a uma atividade cerebral "muito mais elaborada" do que a escrita no teclado, descobriram os pesquisadores.

"Com a escrita à mão, você tem que formar essas letras intrincadas fazendo movimentos de mão e dedo finamente controlados", diz Audrey van der Meer, uma das autoras do estudo e professora de psicologia na Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia. Cada letra é diferente, explicou ela, e requer uma ação manual diferente.

Van der Meer afirma que o ato de formar uma letra ativa memórias distintas e vias cerebrais ligadas ao que essa letra representa (como o som que ela faz e as palavras que a incluem). "Mas quando você digita, cada letra é produzida pelo mesmo movimento de dedo muito simples, e como resultado você usa todo o seu cérebro muito menos do que quando escreve à mão", acrescentou ela.

O estudo da autora é o mais recente de uma série de esforços de pesquisa nos quais ela e seus colegas descobriram que escrever e desenhar parecem engajar e exercitar o cérebro mais do que digitar em um teclado. "Habilidades que envolvem o controle motor fino das mãos são excelentes treinamento e superestímulo para o cérebro", disse ela.

"O cérebro é como um músculo, e se continuarmos a retirar esses movimentos complexos de nossas vidas diárias —especialmente movimentos finos dos dedos— esse músculo pode enfraquecer."

Embora mais pesquisas sejam necessárias, Van der Meer sugere que a subutilização do cérebro poderia eventualmente levar a déficits na atenção, na formação de memória e também resolução de problemas.

Mas assim como o tricô e colorir, alguns especialistas questionam os mecanismos subjacentes em jogo.

"Com algumas dessas pesquisas, acho difícil dissociar se é o movimento físico das mãos que está produzindo um benefício, ou se é a concentração ou desafio cognitivo envolvido", disse Rusty Gage, professor do Instituto Salk de Estudos Biológicos em San Diego.

Gage estuda como certas atividades podem estimular o crescimento de novas células no cérebro. "Eu acho que se você está realizando um trabalho complexo que envolve tomar decisões e planejar, isso pode ser mais importante do que se você está usando suas mãos", disse ele.

Dito isso, os benefícios de muitas atividades práticas não estão em dúvida. Junto com a jardinagem e artesanato, pesquisas apontam que atividades como fazer arte e tocar um instrumento musical também parecem nos beneficiar de alguma forma.

"Nós evoluímos em um mundo tridimensional para interagir com esse mundo através de nossas mãos", diz Lambert. "Eu acho que há muitas razões pelas quais trabalhar com nossas mãos pode ser vantajoso para nossos cérebros."


sábado, 6 de abril de 2024

Ministério Público cria grupos de combate ao crime organizado, FSP

 


BRASÍLIA

O Conselho Superior do Ministério Público Federal aprovou na última terça-feira (2) a criação de grupos de combate ao crime organizado e contra o tráfico internacional de pessoas, em iniciativa que se alinha à prioridade dada pelo procurador-geral da RepúblicaPaulo Gonet, ao tema.

Procurador-geral da República, Paulo Gonet, tem como prioridade combate ao crime organizado
Procurador-geral da República, Paulo Gonet, tem como prioridade combate ao crime organizado - Pedro Ladeira/Folhapress

Um dos grupos, que vai tratar especificamente de tráfico de pessoas e contrabando de migrantes, atuará em investigações e processos relacionados a esses crimes e poderá ter apoio da polícia judiciária.

Também foi criado um grupo de combate a crimes cibernéticos e praticados com uso de tecnologia da informação, que dará suporte aos procuradores responsáveis em investigações e processos criminais para identificar, prevenir e reprimir esse tipo de delito.

Desde que tomou posse, Gonet decidiu adotar medidas para melhorar o combate a organizações criminosas.

Em março, ele se reuniu com o novo secretário nacional de Segurança Pública, Mário Sarrubbo, para tratar do tema. O procurador-geral defende novas abordagens para enfrentar o problema.

O odor putrefato de Lavender em Gaza, FSP

Faz duas semanas que esta coluna deplorou a tecnologia de drones a sanitizar a matança de palestinos pelo Estado de Israel. Torna-se imperioso voltar ao tema, agora, porque o mau cheiro que sopra da faixa Gaza é pior do que se pode suportar.

Antes de prosseguir, convém reafirmar o óbvio: o massacre perpetrado pelos terroristas do Hamas em 7 de outubro merece pleno repúdio. Não há insurgência ou luta anticolonial que possa justificar o assassinato raivoso de mais de um milhar de civis.

Se não vale para 1.200 inocentes, vale menos ainda para, no exercício de suposto direito de se defender, forças israelenses trucidarem em seis meses mais 32 mil habitantes de uma terra arrasada. Crianças e mulheres, na maioria.

Homem exibe passaportes britânicos, poloneses e australianos ao lado dos corpos de trabalhadores de ONG de chef famoso no Hospital Al-Aqsa, em Deir al-Balah, em Gaza - AFP

Alvejar hospitais, ambulâncias e comboios de ajuda humanitária são crimes de guerra. Mobilizar a fome como arma é uma forma de terror. Ponto.

Um ataque israelense matou sete integrantes da organização World Central Kitchen (WCK), do chef espanhol José Andrés. O presidente de Israel, Isaac Herzog, pediu desculpas, e o exército destituiu um coronel e um major, mas seria preciso muito mais para a potência militar se redimir –um cessar-fogo, para começar.

O escândalo que autoriza retomar o assunto escabroso neste espaço, em princípio reservado a temas de ciência, está em outra arma tecnológica indefensável dos combatentes vingativos: inteligência artificial. A ferramenta que dizem ser capaz de libertar a humanidade está em uso para livrar soldados de responsabilidade.

Bethan McKernan e Harry Davies noticiam no diário britânico The Guardian que forças israelenses empregaram uma base de dados baseada em inteligência artificial para selecionar 37 mil supostos integrantes do Hamas como alvos potenciais de bombardeios. O sistema se chama Lavender (sem comentários).

Os relatos foram obtidos originalmente pelo jornalista Yuval Abraham e cedidos ao Guardian para publicação em inglês. Em Israel foram veiculados na revista +972 e no boletim Local Call.

Não duvido que os funcionários da WCK tenham morrido por erro crasso do algoritmo, desses que humanos só cometem por maldade ou negligência. É certo que centenas, talvez milhares de palestinos não combatentes terão sido chacinados nesses deslizes maquinais.

Circuitos de computador não comportam tais falhas morais, nem podem ser culpados por elas. O emprego leviano da inteligência artificial na guerra, porém, seguramente foi decidido e autorizado por autoridades. Poderão elas ser julgadas por crimes de guerra, nessa inédita situação limítrofe?

"Isso não tem paralelo em minha memória", disse um oficial de inteligência que fez uso de Lavender. "Todo mundo ali perdeu alguém no 7 de outubro, inclusive eu. A máquina fez isso [matar] friamente. E isso tornou a coisa mais fácil."

Outro operador de Lavender contou que o sistema permite ganhar muito tempo. Ele dedicava coisa de 20 segundos para decidir sobre a eliminação de cada alvo, e fez isso dúzias de vezes a cada dia.

Dois dos informantes disseram que nas primeiras semanas da guerra havia permissão para matar 15 a 20 civis durante ataques aéreos a militantes de baixa patente. Os ataques eram realizados com bombas "burras", que derrubavam casas inteiras, matando todos dentro delas.

Inteligência artificial, bombas burras e soldados entorpecidos –uma combinação explosiva para os vestígios de humanidade que ainda havia no extermínio com índole genocida de crianças, mulheres e outros palestinos inocentes.