terça-feira, 15 de agosto de 2023

Hélio Schwartsman - Invulneráveis à realidade, FSP

 A cada nova manchete, Jair Bolsonaro parece mais enrolado no caso de venda e recompra de joias que deveriam pertencer ao Estado brasileiro, mas que ele tomou para si. O que eu ainda não sei é se a legião de militares que o auxiliou nos malfeitos ficaria com uma parte do butim ou se agia só por amor à causa.

Outra questão interessante diz respeito ao impacto que as revelações terão sobre o público bolsonarista.

A suposta incorruptibilidade do suposto mito era a derradeira ilusão a que os bolsonaristas se agarravam após o capitão reformado ter traído suas principais bandeiras de campanha. O candidato pró-Lava Jato e antissistema, afinal, acabou sendo o presidente que enterrou a Lava Jato e deitou no colo do sistema (centrão). E a tão propalada honestidade estava mais na cabeça dos apoiadores do que nos fatos.

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) - Andre Borges/EPA-EFE/REX/Shutterstock

Os sinais de que Bolsonaro não era muito católico (nem evangélico) no trato da coisa pública antecedem a própria eleição: Wal do Açaírachadinhas familiarescheques do Queirozintermediações suspeitas na compra de vacinascorrupção no MEC e, é claro, as joias. Até acho que um ou outro entusiasta do mito possa agora deixar de apoiar o ex-presidente, mas não creio que veremos um movimento de massas nessa direção. Se há algo que não se deve subestimar em nossa espécie é sua capacidade para o autoengano. Sempre dá para racionalizar e inventar uma justificativa.

Vemos algo parecido nos EUA. Donald Trump vai se tornando réu numa série de processos, mas isso não parece abalar suas chances de ganhar a indicação para concorrer como candidato republicano. Pelo contrário, cada novo processo aberto contra ele se torna uma "confirmação" de que o ex-presidente é perseguido pelo establishment, o que seria mais uma razão para votar nele.

Neurocientistas às vezes dizem que a realidade é uma alucinação controlada. Concordo com a parte da alucinação, mas tenho dúvidas sobre o "controlada".

Favorito ao TCE-SP com apoio de Kassab e Valdemar é alvo em 4 ações de improbidade, FSP

 SÃO PAULO

O deputado federal Marco Bertaiolli (PSD-SP), favorito para ocupar a vaga de conselheiro do TCE-SP (Tribunal de Contas do Estado de São Paulo), é alvo da Promotoria sob suspeita de improbidade administrativa em quatro casos.

Os episódios narrados pelos promotores citam suspeitas por irregularidades e superfaturamento em contratos e processos de compras da Prefeitura de Mogi das Cruzes, no período em que era chefiada por Bertaiolli (2009 a 2016).

Após uma costura entre os presidentes do PSD, Gilberto Kassab, e do PL, Valdemar Costa Neto, ele se tornou o principal cotado para vaga que será aberta em setembro com a aposentadoria do conselheiro Edgard Camargo Rodrigues. O governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) deverá chancelar o acordo.

O deputado federal Marco Bertaiolli, cotado para assumir vaga no TCE
O deputado federal Marco Bertaiolli, cotado para assumir vaga no TCE - Instagram

O TCE tem entre as suas funções julgar as contas do governo estadual e das prefeituras. Um dos casos citados pelos promotores se baseou, inclusive, no julgamento da corte sobre irregularidades em um dos contratos.

Bertaiolli não tem nenhuma condenação, mas, se for confirmado na vaga da corte, pode ter que continuar a lidar com imbróglios judiciais da época em que era prefeito.

O deputado nega irregularidades, salienta que em três casos a ação ainda não foi aceita por não cumprirem requisitos mínimos e que as proposições só o citam por ser o ordenador de despesas.

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"No âmbito da Prefeitura de Mogi das Cruzes, onde fui prefeito por oito anos, a administração fez 2.928 contratos e administramos em recursos de hoje R$ 20 bilhões. Desses, quatro contratos, apenas quatro, tiveram uma proposta de avaliação através de uma ação", disse à Folha.

A única ação acolhida até agora é relacionada à suspeita de superfaturamento na atas de registro de preço de 2014 e 2015 para compra de carne para a merenda das escolas de Mogi, da empresa Comercial de Alimentos Famaca.

A Promotoria cita valor de ata dos produtos de cerca de R$ 7 milhões, mas pontua que pesquisa feita na Bolsa de Eletrônica de Valores estabeleceu que a compra sairia por R$ 3,7 milhões.

Os promotores ainda afirmam que "o mesmo fornecedor vendia mais barato nas suas prateleiras no varejo do que no atacado para o município". Entre os exemplos citados, está o pagamento de R$ 16,30 pelo quilo do fígado, contra o valor médio de R$ 8,58 no varejo.

A defesa de Bertaiolli sustenta que se trata da repetição de ação popular julgada improcedente e aponta que as comparações feitas pela Promotoria não são cabíveis.

No processo, a empresa envolvida no caso nega dano ao erário e diz que não foi indicada conduta dolosa nem foi apontada ilegalidade na licitação.

Uma perícia que consta do inquérito, feita por profissional nomeado pelo juízo, desqualifica a avaliação da Promotoria ao dizer que as pesquisas realizadas "foram superficiais e desprovidas de caráter técnico e científico" e que "não há o menor sentido em comparar a precificação de produtos ofertados na gôndola de um supermercado com os produtos fornecidos em decorrência dos contratos firmados".

O caso ainda aguarda julgamento. O pedido da Promotoria cobra ressarcimento R$ 3,4 milhões em danos causados ao erário, multa e suspensão dos direitos políticos.

Outra proposta de ação do Ministério Público baseia em posicionamento do TCE para a proposição de ação de improbidade por supostas irregularidades em aditamento de contrato entre a prefeitura e o consórcio Trânsito Seguro, referente a questões envolvendo a sinalização de trânsito da cidade.

Os promotores citam prejuízo de prejuízo de R$ 3,6 milhões e "ocorrência de sobrepreço, descaracterização do objeto inicial, restrição do caráter competitivo do certame, aditamentos ilegais, ‘jogo de planilha’, superfaturamento e irregularidade na execução contratual".

A defesa do deputado afirma, nos autos, que não há provas de sobrepreço na manifestação da Promotoria e que o município tomou precauções necessárias na elaboração dos valores de referência.

A Promotoria também propôs outras duas ações contra o deputado, porém em contratos mais modestos.

Uma delas é sobre a compra para uniformes esportivos. De acordo com o Ministério Público, o pregão realizado está "eivado de erros diversos" e houve sobrepreço 51% em três lotes.

Um quarto caso cita superfaturamento em atas de registro de preço para a instalação de faixas, banners, adesivos, entre outros. O prejuízo relatado é de R$ 20 mil e os envolvidos negam irregularidades.

Bertaiolli afirma que as três proposições da Promotoria, ainda em fase de instrução processual e sobre casos ocorridos há mais de uma década, não devem ser aceitas com base na nova lei sobre improbidade administrativa. Elas prescreveram, diz, e não reúnem "o caráter fundamental da improbidade administrativa, que é o dolo, a intenção de fazer".

Sobre irregularidade constatada pelo TCE em um dos casos, ele afirma que teve todas as suas contas aprovadas pela corte e que sua gestão foi avaliada como de alta efetividade.

Apesar de ser do partido de Kassab, Bertaiolli é visto como um nome mais próximo de Valdemar. O líder do PL já pediu aos parlamentares da Alesp o apoio a Bertaiolli.

Normalização do Bolsonaro argentino já começou, Nelson de Sá, FSP

 The New York Times e The Wall Street Journal ainda resistiram, falando em "extrema direita" (far right) nos primeiros enunciados sobre as prévias na Argentina. Também lembrando que o agora suposto favorito promete "eliminar a educação pública, criar um mercado para a venda de órgãos humanos, expandir a posse de armas e proibir o aborto". E que "Bolsonaro apoiou".

Mas The Washington Post e Bloomberg evitam falar em "extrema", usando só "direita". Quando muito, veem um candidato "libertário" e "outsider". A Bloomberg ouviu, do estrategista-chefe do banco brasileiro BTG Pactual em Buenos Aires, que "os investidores gostam da mensagem econômica de Javier Milei", embora temam seu "estilo agressivo" e o "risco institucional".

Reprodução/The Wall Street Journal

Também evitando menção à extrema direita, a revista The Economist se entusiasmou com a cabeleira do candidato, em sua sequência de títulos: "O rugido do leão", "Argentina pode ter seu primeiro presidente libertário" e "Milei, um radical do livre mercado".

Em editorial, o WSJ de Rupert Murdoch abandonou a cautela de seu próprio noticiário e saiu em defesa do "outsider" que incorpora a "revolta da classe média argentina" (acima) e não seria o "louco que a imprensa internacional está retratando":

"Milei é um economista que defende limites para o governo e culpa, pelos problemas da Argentina, os impostos sufocantes, a hiperregulação, os subsídios e o protecionismo. Ele quer abrir mercados, cortar gastos públicos, acabar com os controles de capital e privatizar estatais."

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Em todos os relatos, inclusive os ainda críticos, enfatiza-se que ele promete "adotar o dólar dos EUA como moeda oficial da Argentina".

Reprodução/Financial Times

NEONAZISMO SE ESPALHA

Com mapa das operações policiais antinazistas em julho, em cidades do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e São Paulo, o Financial Times destaca a reportagem "‘Um só povo, um só Reich’: grupos neonazistas se espalham pelo sul do Brasil" (acima).

Reproduz o vídeo célebre, dos "manifestantes que, nos dias tensos após a eleição, se reuniram em frente a um quartel do Exército em São Miguel do Oeste. Ao som do hino nacional, os apoiadores do derrotado presidente de extrema direita, Jair Bolsonaro, estenderam o braço direito, com as palmas das mãos abertas, em saudação".

Lembra que o brasileiro que tentou matar a vice-presidente argentina Cristina Kirchner, no ano passado, tinha tatuagem nazista. E destaca, da vereadora Ana Lúcia Martins, de Joinville: "O extremismo sempre existiu, mas há uma expressão muito mais forte dele nos últimos anos".