quarta-feira, 3 de maio de 2023

Deirdre Nansen McCloskey - A ascensão mundial do fascismo, FSP

 Eu tenho alertado vocês sobre a ascensão mundial do fascismo. Ele ama o Estado, não você. É a forma extrema de estatismo e o oposto do verdadeiro liberalismo. Na década de 1920, Mussolini colocou desta forma: "Tudo no Estado, nada fora do Estado, nada contra o Estado".

No "espectro" que algumas pessoas pensam ser tudo o que existe na teoria política, o fascismo é considerado o oposto do comunismo. É o que as pessoas pensavam na década de 1930. Está errado.

O clichê em resposta é que "os extremos se juntam em suas extremidades". O fascismo pode ser de esquerda, na Venezuela, ou de direita, na Rússia.

Sua ambição é totalitária, totalmente evidente na China de Xi Jinping. Portanto, o Brasil, sendo cordial com a tentativa de Xi de formar um Terceiro Mundo contra o Norte e o Ocidente, ameaçará a democracia. Ouça bem, Lula.

Nos Estados Unidos, há um século, "um liberal" passou a significar "um social-democrata", isto é, um socialista moderado, feliz porque o Estado fica com 40% do PIB para seus propósitos. Um propósito típico é comprar um exército de que o Brasil nunca vai precisar e que os Estados Unidos usam demais.

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Nos países latinos, diferentemente dos Estados Unidos, um "liberal" significa "alguém que defende tornar os ricos ainda mais ricos, com o apoio da polícia e do Exército". Partido Liberal. Há algo estranho na água do Novo Mundo.

Você acha que eu exagero a ameaça fascista e antiliberal. Mas considere a lista de checagem do fascismo.

Uma imagem de culto do "duce" como homem forte e virtuoso; checado.

Política como teatro; checado.

Comícios em Nuremberg, comícios de Trump, demonização de adversários; checados.

Falta de interesse por compromisso ou política prática; checado.

Designação de uma minoria como "vermes"; checado.

Amor pelo poder físico machista; checado.

Fascínio por armas; checado.

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Bolsonaristas com o símbolo do partido Aliança pelo Brasil, que Bolsonaro tentou fundar - Pedro Ladeira - 21.nov.19/Folhapress

"Quando ouço a palavra cultura, pego minha arma". Propaganda como suplemento do poder físico; checado.

A Grande Mentira; checado.

Realidade ou ameaça de violência como ferramenta política: 6 de janeiro nos EUA e 8 de janeiro no Brasil; checado.

Ressentimento como tema principal; checado.

Política de identidade única à esquerda e à direita: "negro", "judeu", "burguês", "gay"; checado.

O Estado como "coisa nossa", excluindo as minorias ou, no caso das mulheres, as maiorias; checado.

Elevação do Estado à posição de santidade; checado.

Cuidado.

Tradução de Luiz Roberto Gonçalves


Mariliz Pereira Jorge - Relato de uma viciada em droga legal, FSP

 Passei uma década com dificuldade para dormir. Tive uma trégua de três anos mergulhada naquele sono ao qual só anjos sem boleto para pagar se permitem. De uns meses para cá não consigo acordar sem me arrastar da cama e esperar uma hora até que os neurônios consigam se conectar. O mesmo remédio que me tirou do inferno da insônia cobra o preço com ressaca diária.

Sou viciada em zolpidem, o remédio que virou pauta nas redações, assunto nas redes sociais, no WhatsApp, em qualquer mesa de jantar. Conheço uma dúzia de pessoas que usa, parte delas com acompanhamento médico, outra, brincando de roleta russa. Tenho experiência nos dois grupos.

Comecei com a indicação para regular o sono no ano que trabalhei num fuso diferente. Acordava às 4h15, mas não conseguia ajustar o meu relógio biológico de coruja ao amanhecer das galinhas. Funcionou. Mas o que era para ser temporário virou contínuo. Falava para mim mesma, quando quiser, eu paro. Pois é. De fato, no início, eu tomava uma meiota do comprimido e nos finais de semana deixava o sono chegar naturalmente. Mas ao menor sinal de dificuldade para dormir, minha mão seguia sorrateira até a gaveta da mesinha de cabeceira. Pronto.

Voltei ao horário que meu corpo funciona melhor, mas nada voltou a ser como antes, nem a memória. O zolpidem passou a ir para cama comigo todas as noites, se estou cansada, de férias, alegre, de pileque. Não consigo dormir sem me drogar. Ao apagar a luz, o modo zumbi é ativado e só se desarma com um comprimido inteiro.

No dia seguinte, ressaca física e moral, a promessa de procurar um médico para me desintoxicar. Falando neles, justiça seja feita, muita gente se medica por conta própria. Apesar de ser controlado, não é difícil encontrar a farmácia que faça vistas grossas para falta de receita. Adivinhe o que tem no cardápio dos traficantes, hoje, além de maconha, coca, MD etc.? Isso mesmo: zolpidem.

Alargando os ciclos, Hélio Schwartsman FSP

 Platão não era um amigo da democracia. Para ele, dar mando à turba significava pôr a ignorância no poder, o que levava à tirania. Aristóteles era um pouco menos hostil à democracia, mas não chegava a ser um entusiasta desse regime. Para o estagirita, a democracia nada mais é do que a forma corrompida do governo conduzido por muitas pessoas, o que não deixa de ser uma espécie de tirania, já que nele a lei tende a ser substituída pelas conveniências da maioria.

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O cientista político e professor Francis Fukuyama, autor de “O Fim da História e o Último Homem” - The New York Times

Para os gregos de um modo geral, associar democracia, e a própria política, à ideia de deterioração era comum. Não chega a ser uma surpresa, considerando que os gregos viam a história como um processo cíclico, em que geração e corrupção se sucedem. Foi preciso o cristianismo, o iluminismo e o ocaso de alguns regimes ditatoriais para que fosse possível vislumbrar a história como um processo linear e progressivo no qual a democracia despontaria como algo mais ou menos inevitável. Um dos defensores mais vocais dessa concepção foi Francis Fukuyama, autor de "O Fim da História e o Último Homem" (1992), no qual sustentava que as democracias liberais e o livre mercado eram a forma final da governança humana. A recessão democrática vivida por vários países, do Brasil à Itália, entre tantos outros, nos faz parar para pensar.

Não sei se a história é linear ou circular, mas acho que dá para afirmar com segurança que, se os ciclos forem suficientemente longos, isto é, maiores do que vidas individuais, boa parte das pessoas os experimentará como uma sequência de progresso cumulativo. Se isso é verdade, tão importante quanto defender os regimes democráticos de investidas autoritárias é assegurar a manutenção dos avanços tecnológicos. São eles que possibilitam um crescimento econômico capaz de pôr em estado de dormência os conflitos que trazem instabilidade a qualquer regime político. São eles que alargam os ciclos.