Foi uma eleição reveladora. As previsões das raposas políticas, em grande medida, não se concretizaram. O presidente Bolsonaro saiu fortalecido e na ascendente para o segundo turno. No Congresso, a esquerda estagnou e houve notável avanço da direita. A polarização política foi refletida na composição parlamentar, porém com nítida vantagem da direita, que passou a liderar tanto Câmara quanto o Senado.
Houve um festival de derrotas da velha política e de percebidos traidores do presidente Bolsonaro. Não se elegeram Orlando Silva, Ivan Valente, Paulinho da Força, Collor, Requião, Vicentinho, Cesar Maia, José Serra, Álvaro Dias, Alessandro Molon, Eduardo Cunha, Marcelo Ramos, tampouco Luiz Henrique Mandetta, Joice Hasselmann, Alexandre Frota e os irmãos Weintraub. Adicionalmente, Ciro Gomes foi amassado, e o PSDB perdeu relevância.
Por outro lado, entre os 10 deputados mais votados, figuram apenas 2 de esquerda e 5 ou 6 com credenciais liberais sólidas. A Lava Jato foi exaltada, com votações expressivas de Sergio Moro e Deltan Dallagnol no Paraná.
O mercado reagiu muito positivamente. A queda do dólar de R$ 5,40 para R$ 5,17 foi em grande medida reflexo da constatação de que os planos da extrema esquerda de revogar reformas do governo Temer e Bolsonaro —como o teto de gastos, a reforma trabalhista, o marco do saneamento e a extinção do imposto sindical— sofrerão oposição ferrenha no Congresso.
A pior mancha na eleição foram as pesquisas. Os institutos mais bem avaliados até recentemente erraram de maneira vexaminosa. Perderam a credibilidade para o segundo turno e talvez definitivamente. Este tema será pauta por período prolongado.
Entre as novidades da política, a federação de PSOL/Rede cresceu e superou a importante cláusula de barreira, mas o Novo foi um dos derrotados e reduziu a menos de metade sua participação no Congresso. A exceção foi a espetacular vitória de Romeu Zema para o governo de Minas Gerais.
O erro estratégico do Novo ocorreu entre 2019 e o início de 2022. O fundador, João Amoêdo, amparado pela cúpula, optou por uma oposição sistemática ao governo, com foco no impeachment do presidente. A ideia era enquadrar o partido inteiro. Os mandatários, liberais genuínos, foram perseguidos como inimigos e, em onda macarthista, foram tachados de "bolsonaristas" por não embarcar nessa cruzada pelo impeachment.
Em lugar de focar uma frente anti-PT, o Novo optou por combater diretamente a onda bolsonarista em busca de eleitores de direita.
O partido rachou, e, depois de longa depuração, foi construída uma nova governança em 2022. Era tarde demais. Muitos antibolsonaristas saíram do partido, mas não tiveram êxito no domingo (3). Outros permaneceram, mas preferiram não se posicionar a favor da pauta liberal do governo: também foram mal. Restaram os liberais pragmáticos como Marcel van Hattem e Gilson Marques, que souberam equilibrar as necessárias críticas com o apoio a pautas liberais. Tiveram votações muito expressivas.
O PSOL, por outro lado, se posicionou ideologicamente à esquerda do PT e apoiou Lula como representante da frente esquerdista. Aparentemente, aprendeu a lição das derrotas acachapantes de Marina Silva em 2014 e de Ciro Gomes, que peitaram o PT na busca do eleitor de esquerda e extrema esquerda. O PSOL formou quadros e cresceu com identidade própria, distinta do PT.
O Novo implicitamente demonstrou indiferença entre uma agenda liderada pelo PT e a agenda Bolsonaro/Guedes: ficou com imagem de isentão. A direita viu traição, enquanto a centro-esquerda seguiu percebendo o Novo como parte da frente do governo. Acabou espremido pelos flancos.
A nova governança do partido é promissora, mas terá decisões difíceis a tomar. Os liberais merecem uma casa para chamar de sua, mas é preciso reconstruí-la.