As cozinhas para delivery (nome mais adequado ao que se atribuiu "dark kitchen") surgiram recentemente na cidade de São Paulo, no período da pandemia, como empreendimentos voltados à produção e entrega de refeições na moradia dos paulistanos. Afinal, quem não quer que um pedido chegue rápido e quente à sua casa?
Do ponto de vista da regulação urbana, as cozinhas para delivery são totalmente compatíveis com o Plano Diretor Estratégico (PDE; lei municipal 16.050/14) e com o zoneamento (lei 16.402/16), pois tais normas incentivam a mescla de usos nos bairros, buscando aproximar a moradia dos serviços e também dos empregos.
E, para fazer com que essa mistura de usos ocorra de forma harmônica, a legislação existente já definiu um conjunto de regras que estabelecem limites e controle das incomodidades que podem ser geradas em relação à vizinhança.
Hoje, para aprovação de um empreendimento de cozinhas para delivery, é necessário adotar pelo menos os seguintes procedimentos e obedecer às seguintes regras que constam da lei de zoneamento e de diversos decretos regulamentadores (além de outras normas a serem observadas, como o Código de Obras e Edificações):
1 - Para a construção da edificação, é necessário solicitar alvará de aprovação e execução da obra, observando todos os parâmetros de parcelamento, uso e ocupação dos lotes que constam da lei de zoneamento;
2 - A atividade "cozinhas para delivery" pode ser enquadrada em dois grupos de atividade, conforme o porte: nR1-1 (comércio de abastecimento de âmbito local com dimensão de até 500 m2 de área construída computável) ou nR2-3 (comércio de abastecimento de médio porte, com dimensão de mais de 500 m2 até 2.000 m2 de área construída computável);
3 - A partir do enquadramento feito, devem ser observadas as condições de instalação dos usos: vagas para veículos, vagas para bicicletas, espaço de carga e descarga, vestiário para usuários de bicicleta, largura da via etc. Por exemplo, devem ser previstos espaços internos para estacionamento das motocicletas dos entregadores;
4 - Após a obra realizada, devem ser providenciados os equipamentos e instalações do sistema de segurança e solicitado o AVCB (Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros) e também deve ser solicitada uma licença de funcionamento para a atividade de administração das cozinhas e uma licença para cada empresa se instalar numa cozinha individual;
5 - É no pedido da licença de funcionamento que são avaliados os parâmetros de incomodidade e solicitada solução técnica para o atendimento da legislação pertinente e das normas técnicas aplicáveis para fins de controle de ruído, vibração associada, radiação, odores, gases, vapores e material particulado;
6 - Também deve ser solicitada a licença junto à Vigilância Sanitária.
Como se vê, a legislação urbanística já dispõe de elementos suficientes para proporcionar o adequado controle das cozinhas para delivery, dispensando a elaboração de regulamentação específica. As eventuais externalidades negativas geradas em alguns empreendimentos já realizados podem (e devem) ser sanadas com a adequada aplicação da lei e das regras já existentes.
Inclusive sobre esse aspecto, é importante ainda esclarecer que a legislação vigente dispensou as cozinhas para delivery da elaboração do Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) e do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) justamente porque não possuem o porte necessário para tal exigência.
Enfim, a cidade de São Paulo não precisa de mais leis e de mais burocracia para aquilo que já está suficientemente regulamentado.