quinta-feira, 7 de novembro de 2019

Lance solo da Petrobras traz efeito negativo no curto prazo, dizem analistas, FSP

Especialistas afirmam que o impacto no caixa da petroleira será forte no quarto trimestre

SÃO PAULO
lance solo da Petrobras no megaleilão do pré-sal nesta quarta-feira (6) trará efeitos negativos para a petroleira no curto prazo, afirmam analistas. Segundo eles, além da obrigatoriedade do pagamento de 100% do valor devido até o dia 27 de dezembro --que traz dúvidas sobre como a companhia fará o remanejamento do seu caixa --, também houve frustração quanto ao desvio da atual estratégia de redução do endividamento.
valor arrecadado pelo leilão ficou em R$ 69,9 bilhões, abaixo do previsto pelo governo. O consórcio formado pela Petrobras e as duas petroleiras chinesas, CNOOC e CNODC, pagará R$ 68,2 bilhões pelo direito de explorar a área de Búzios, a maior descoberta de petróleo do país. Sem concorrentes, ofereceu lance mínimo de 23,24% em óleo para o governo. Nos leilões de pré-sal, o bônus de assinatura é fixo e a disputa se dá pela oferta de petróleo ao governo durante a vida útil dos contratos. Os chineses contribuirão com 10% desse valor e pagarão R$ 6,8 bilhões.
Do montante a ser pago pela Petrobras, aproximadamente R$ 34 bilhões virão de uma compensação do próprio governo federal pela renegociação do contrato da cessão onerosa de 2010, restando R$ 35 bilhões a serem pagos pela petroleira.
O logo da Petrobras é visto nas cores verde e amarelo em uma parede cinza
A Petrobras adquiriu duas das áreas no megaleilão do pré-sal - Sergio Moraes/Reuters
De acordo com o analista da XP Investimentos Gabriel Francisco, o valor pago no leilão se refere a um desembolso para investimentos por parte da petroleira e afetará o caixa da companhia apenas no quarto trimestre e de maneira pontual.
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“O que desapontou um pouco o mercado foi o fato de essa decisão estar longe das expectativas que existiam sobre o direcionamento que seria dado ao valor em caixa. Mantê-lo em sua integridade seria um posicionamento muito conservador, mas esperava-se que grande parte desses recursos continuasse voltada para o abatimento de dívidas. Esse desembolso muda temporariamente essa dinâmica”, explicou.
A Petrobras encerrou o terceiro trimestre deste ano com R$ 55 bilhões em caixa. Desse total, Gabriel Francisco afirma que apenas aproximadamente R$ 25 bilhões (70% do total a ser pago pela petroleira nos dois blocos de óleo e gás) estão alocados no Brasil.
Após o leilão, o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, afirmou que não elevará a dívida da companhia e que fará uso de caixa para o pagamento do bônus da assinatura na aquisição dos blocos.
Segundo o analista da Ativa Investimentos Ilan Arbetman, as dúvidas sobre como a Petrobras remanejará seu caixa para cumprir com o pagamento das arrematações também pesam entre os investidores.
“Há uma incógnita na área financeira da companhia no curto prazo, já que se desfazer de mais da metade do montante em caixa é algo considerável. Ainda é preciso entender como a Petrobras planeja fazer esse pagamento em uma tacada só”, diz.
“A estratégia de melhor gestão de caixa e de custos não mudaria daqui para frente, mas também precisamos considerar que quando uma empresa arremata um bloco de petróleo, além de não existir nenhuma contribuição imediata no curto prazo, há também todo um processo de campanha exploratória, construção de novas plataformas ou afretamento que precisará acontecer”, acrescenta Francisco.
Por outro lado, ainda que o pagamento da aquisição pela Petrobras ainda traga incertezas, os analistas destacam que a compra dos dois blocos traz um forte potencial operacional no longo prazo.
Isso, inclusive, explicaria o entusiasmo mostrado por Castello Branco no final de outubro, quando afirmou que entraria para ganhar no leilão referente ao bloco de Búzios. Dos quatro campos, Búzios tem 70% da produtividade.
“Operacionalmente falando, o potencial de angariação de receita para a Petrobras é muito alto com a aquisição desses dois blocos, já que representa um salto produtivo para a companhia. E é isso que nos faz crer que essa pausa na estratégia de otimização e queda de alavancagem é momentânea”, completa Arbetman.
Ao final do pregão de ontem na Bolsa de Valores brasileira, a ação da Petrobras esteve entre as mais negociadas do dia, oscilando entre uma queda de 5% e uma alta de 2%. Encerrou a sessão praticamente estável, com alta de 0,2% e cotada a R$ 29,71.

Preço alto do megaleilão do pré-sal tira petroleiras privadas da disputa, FSP


RIO DE JANEIRO
O elevado preço e incertezas sobre o valor do ressarcimento à Petrobras afastaram os investidores privados do megaleilão do pré-sal, realizado nesta quarta-feira (6), que terminou com apenas duas das quatro áreas vendidas, sem concorrência e pelos lances mínimos exigidos.
A estatal brasileira e as chinesas CNOOC e CNODC, controladas pelo governo daquele país, foram as únicas a apresentar oferta. O resultado frustrou expectativas de arrecadação, que ficou em R$ 69,9 bilhões, cerca de 34% abaixo do esperado, e desagradou a investidores na Petrobras, cujas ações preferenciais chegaram a cair 5% durante o dia.
Ainda assim, o resultado foi comemorado pelo governo. “Tinha quatro áreas, foram vendidas duas, foi um sucesso”, disse o presidente Jair Bolsonaro ao deixar o Palácio da Alvorada na noite desta quarta.
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“Sem frustração, estamos fazendo nosso trabalho, o dinheiro é bem-vindo”, afirmou.
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Plataforma de petróleo de Peregrino, no Rio de Janeiro, operada pela Equinor; até 2020,12 novas plataformas iniciam operação no Brasil. - Ricardo Borges - 24.out.19/Folhapress
Presente no leilão, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, disse que o resultado “é um motivo de muito orgulho para o governo”, lembrando que foi a maior arrecadação de um leilão de petróleo no país.
A relevância do evento para o governo podia ser medida na lista de presenças: Albuquerque, o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas, a secretária especial do PPI (Programa de Parcerias e Investimentos), Martha Seiller, o ministro do TCU (Tribunal de Contas da União) Raimundo Carreiro e o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), entre outros.
Mesmo com arrecadação abaixo dos R$ 106 bilhões previstos, a entrada dos recursos vai ajudar o governo a reduzir o déficit fiscal de 2019 para algo entre R$ 80 bilhões e R$ 90 bilhões, ante os R$ 139 bilhões projetados inicialmente.
“É o maior evento fiscal do país em 2019”, disse o secretário especial da Fazenda, Waldery Rodrigues. Segundo ele, o reforço de caixa permitirá o descontingenciamento de recursos de setores como defesa, educação e saúde.
A arrecadação do leilão será dividida entre estados e municípios segundo acordo feito pelo governo para aprovar a reforma da Previdência. A União ficará com R$ 23 bilhões; estados e municípios dividirão, cada grupo, R$ 5,3 bilhões. Localizado em frente às reservas, o Rio terá R$ 1,1 bilhão.
Outros R$ 34 bilhões serão repassados à Petrobras, como ressarcimento por mudanças no preço do petróleo após assinatura do contrato da cessão onerosa, em 2010, que cedeu à estatal o direito de produzir 5 bilhões de barris em quatro áreas do pré-sal em troca de ações para o governo no processo de capitalização da estatal.
No leilão, foram oferecidas reservas adicionais descobertas pela Petrobras nessas quatro 
áreas. Foram vendidas só as que estavam na mira da estatal.
O consórcio formado pela Petrobras (com 90% de participação) e pelas duas petroleiras chinesas (com 5% cada uma) pagará R$ 68,2 bilhões pelo direito de explorar a área de Búzios, a maior descoberta de petróleo do país. Sem concorrentes, ofereceu lance mínimo exigido de 23,24% em óleo para o governo.
Nos leilões de pré-sal, o bônus de assinatura é fixo e a disputa se dá pela oferta de petróleo ao governo durante a vida útil dos contratos.
Sozinha, a Petrobras levou a área de Itapu, que tinha bônus de R$ 1,7 bilhão, também com lance mínimo de 18,15% em óleo para o governo. Não houve lance pelas áreas de Sépia e Atapu.
Esse foi o primeiro leilão do pré-sal desde a oferta da área de Libra, em 2013, sem ágio sobre 
o percentual de óleo entregue a governo durante a vida útil. Foi também o leilão com o maior encalhe em relação ao número de áreas oferecidas —com ofertas para metade delas.
Com as ofertas, a Petrobras terá que desembolsar até o fim do ano R$ 29 bilhões em bônus, já descontando os R$ 34 bilhões do ressarcimento.
O compromisso refletiu na avaliação do mercado sobre a situação financeira da estatal. “A predominância da empresa nas ofertas sinalizou um desvio pontual na estratégia atual de redução do endividamento”, afirmou Gabriel Fonseca, da XP Investimentos.
Em entrevista após o leilão, o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, disse que a empresa não tomará novos empréstimos para pagar os bônus. “Mesmo com esse investimento, a Petrobras não acabará o ano com elevação de dívida”, afirmou.
As ações da estatal se recuperaram e fecharam o pregão em alta de 0,2% —as preferenciais, mais negociadas— e queda de 0,43% —as ordinárias.
Para especialistas, a ausência de empresas privadas no leilão reflete incertezas com relação ao ressarcimento que os vencedores devem fazer à Petrobras por investimentos já feitos nas áreas. Segundo maior produtor de petróleo do país, Búzios já tem quatro plataformas em operação, por exemplo.
“Qual é o valor do ressarcimento, como será negociado? Nada disso está definido”, diz o advogado Paulo Valois, do escritório Schmidt, Valois, Miranda, Ferreira & Agel.
Consultora da FGV (Fundação Getulio Vargas) e ex-diretora da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), Magda Chambriard acrescenta outros dois fatores: a opção do governo por receita no curto prazo, ao elevar o bônus de assinatura, e o fato de que as maiores petroleiras do mundo já adquiriram diversos ativos do pré-sal nos leilões anteriores.
O diretor-geral da ANP, Décio Oddone, disse que uma das propostas feitas ao governo previa bônus de R$ 52 bilhões, com óleo lucro mais alto.
“Se fosse usado esse, talvez estivéssemos comemorando a venda das quatro áreas, mas com arrecadação menor.”
Nesta quinta (7), o governo realiza outro leilão do pré-sal, com a oferta de cinco áreas exploratórias com bônus total de R$ 7,85 bilhões. São ativos mais baratos, embora com maior prazo para início da produção.
Para o governo, será um teste para avaliar se o risco do ressarcimento de fato afugentou os investidores.
No leilão desta quarta, apenas 7 dos 14 inscritos apareceram —deles, só três fizeram ofertas. Antes mesmo da oferta, duas empresas já haviam anunciado desistência, a britânica BP e a francesa Total.
Segunda maior produtora de petróleo no Brasil, a anglo-holandesa Shell foi uma das que se inscreveram mas não chegaram a participar. Presente ao evento, o presidente da Shell Brasil, André Araújo, disse que a empresa considerou as áreas caras.
Ele não descartou, porém, participação no leilão de quinta. “Amanhã é amanhã. É um novo dia, são novos blocos.”
Oddone minimizou a ausência das petroleiras estrangeiras e disse que os resultados ficaram dentro do esperado. Mas admitiu que as incertezas sobre o ressarcimento podem ter sido um obstáculo para atrair mais empresas.
O resultado do megaleilão turbina o lobby de petroleiras por mudanças nas regras do pré-sal. Após a oferta, a secretária de Petróleo e Gás do MME, Renata Isfer, afirmou que o governo decidiu apoiar projeto do senador José Serra (PSDB-SP) que acaba com a participação estatal nos contratos do pré-sal e com a preferência à Petrobras na região.
Segundo ela, o apoio é parte de um processo de revisão de regras do setor de petróleo. O texto de Serra acaba com o chamado polígono do pré-sal, área de 149 mil quilômetros quadrados criada em 2010.
Dentro dela, os contratos de exploração de petróleo devem ser de partilha da produção. Esse tipo de contrato determina a participação da estatal PPSA (Pré-sal Petróleo S.A.) nos consórcios vencedores.
Além disso, garante à Petrobras escolher áreas que quer operar, ou seja, gerenciar as atividades do consórcio. “Queremos ter o direito de decidir caso a caso. Tem áreas em que não vale a pena ter partilha. Além disso, a partilha afeta a atratividade”, afirmou Isfer.
Colaborou Talita Fernandes, de Brasília