quarta-feira, 6 de novembro de 2019

Em derrota para base de Doria, CPI recomenda investigar agentes públicos e ex-secretário de SP, OESP

Tulio Kruse, O Estado de S.Paulo
06 de novembro de 2019 | 20h46


Em uma derrota da base aliada do governador João Doria (PSDB) na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), que investigou a maior fabricante estatal de remédios do País, a Fundação para o Remédio Popular (Furp), aprovou relatório que recomenda abertura de inquérito contra o ex-secretário estadual de Saúde Giovanni Guido Cerri, titular da pasta entre 2011 e 2013, na gestão Geraldo Alckmin (PSDB). 
Até poucas horas antes da aprovação do documento, tucanos tentavam evitar a inclusão do nome de Cerri no relatório, mas foram derrotados por 6 a 1, com voto favorável até de um deputado do PSDB. 

CPI da Furp
Sessão da CPI que ouviu o ex-secretário Giovanni Guido Cerri, em setembro Foto: Marco Antonio Cardelino/ALESP
O relatório também recomenda o encerramento da Parceria Público-Privada (PPPentre a Furp e a empresa CPM, controlada pela farmacêutica EMS e o indiciamento de três ex-funcionários da fundação acusados de receber propina durante a construção da uma fábrica de remédios em Américo Brasiliense, no interior paulista.  
De acordo com a comissão, a PPP teria causado prejuízos de R$ 56 milhões por ano aos cofres públicos. Cerri se tornou sócio da concessionária que assumiu o trabalho da Furp, três anos depois de assinar, como secretário estadual, a PPP.
O ex-secretário diz que não houve favorecimento à empresa, e que sua participação na PPP se limitou à entrega da lista de remédios que seriam fabricados através da parceria. Ele ressalta que a maior parte do contrato de concessão foi elaborado pela COmpanhia Paulista de Parcerias (CPP), e que sua assinatura foi feita em conjunto com outros secretários estaduais. "Não existe nenhuma relação entre a PPP e uma sociedade feita três anos depois", disse. 
Fonte de forte preocupação para o governo, a CPI da Furp teve sua última sessão suspensa três vezes desde anteontem quando começou a apreciar seu relatório final. O documento apresentado pelo relator, deputado Alex de Madureira (PSD), desconsiderou uma série de recomendações feitas por seus colegas em sub-relatórios preliminares. 
Membros da CPI reagiram e apresentaram um documento alternativo – essa foi a versão aprovada por parlamentares do PSL, PL, DEM e PT e PSB, além do próprio partido do governo. O único a votar contra foi o próprio Madureira. 
“Os deputados esqueceram até de ideologia e resolveram prestar um serviço ao Estado”, disse o presidente da comissão, Edmir Chedid (DEM).
Durante a leitura do relatório alternativo, Madureira chegou a deixar a sessão da CPI. Ele foi seguido por uma equipe de TV e um funcionário da Furp, e questionado sobre o abandono da reunião. Voltou em seguida e acompanhou a leitura do documento. As empresas citadas não comentaram o relatório da comissão. Só em 2018, a Furp produziu quase 530 milhões de medicamentos para a rede pública. 
Uma das linhas condutoras do relatório é o encerramento da PPP, apontada como responsável por prejuízos de R$ 56 milhões ao ano para os cofres estaduais, e a recuperação financeira da Furp. Essa recomendação contraria a possibilidade de extinção da entidade, que já foi cogitada por Doria e seu atual secretário de Saúde, José Henrique Germann Ferreira. 
Em nota, a empresa responsável pela administração da fábrica, CPM afirmou que o contrato da PPP “está vigente e que vem cumprindo todas as suas determinações”. “Qualquer mudança  dependerá de um novo acordo entre as partes”, ressaltou a CPM.

JBS perde R$ 3 bi na Bolsa com possível perda de imunidade de irmãos Batista, FSP

SÃO PAULO
As ações da JBS chegaram a cair 7% na desta terça-feira (5) com a notícia de que o procurador-geral da República, Augusto Aras, pediu ao ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), o fim da imunidade criminal dos irmãos Batista, concedida no acordo de delação premiada de 2017.
Joesley Batista
O empresário Joesley Batista pode perder a imunidade criminal concedida no seu acordo de delação premiada - EVARISTO SA / AFP
Ao fim do pregão, os papéis amenizaram o recuo em 3,8%, maior queda da Bolsa, e fecharam cotados da R$ 28, menor valor desde agosto deste ano. Com a queda, a empresa perdeu R$ 3 bilhões em valor de mercado.
Em documento enviado a Fachin nesta segunda (4), Aras pede a homologação das rescisões dos acordos de delação premiada dos ex-executivos da JBS Joesley Batista, Ricardo Saud, Wesley Batista e Francisco de Assis e Silva em 2017. 
O procurador baseia seu pedido em supostos crimes cometidos pelos executivos após o acordo de delação premiada. O pedido foi formulado originalmente pelo ex-procurador Rodrigo Janot e reafirmado por Raquel Dodge com base nos mesmos argumentos.
"Ao invés de adentrarem um espaço de conscientização e redenção pela prática de incontáveis delitos ao longo de suas vidas, escolheram fazer mais do mesmo: continuar delinquindo. Tudo com o intuito de potencializar seus ganhos no acordo que viria a ser filmado", diz Aras em sua manifestação. 
Ele cita que os executivos deixaram de informar espontaneamente ao Ministério Público Federal (MPF) a possível conduta ilícita por parte do ex-procurador Marcello Miller. 
Segundo relatório da PF (Polícia Federal), Miller teria feito jogo duplo durante a elaboração dos acordos de delação de executivos da JBS. O documento aponta que ele teria recebido R$ 1,8 milhão da J&F Investimentos, grupo que controla a JBS, por meio do escritório Trench Rossi Watanabe quando ainda integrava a equipe da Procuradoria-Geral da República (PGR), para atuar como advogado de um escritório contratado pela J&F Investimentos.
Aras também pontua que Joesley Batista e Ricardo Saud demoraram quase quatro meses após a primeira delação para indicar ao MPF o pagamento de R$ 500 mil ao senador Ciro Nogueira (PP-PI) em troca do seu apoio à então presidente da República, Dilma Roussef, por ocasião do impeachment.
Eles enviaram provas do pagamento ao MPF em 31 de agosto de 2017. No entanto, tal pagamento ocorreu em 17 de março daquele ano, antes da delação firmada em 3 de maio.
Por fim, o procurador cita as investigações a Wesley e Joesley Batista por insider trading, uso de informações privilegiadas para a obtenção de ganhos no mercado financeiro. Os irmãos teriam tido ganhos ilegais com a venda e a recompra de ações da JBS e com negociações de contratos de dólar na época da delação premiada. 
No dia que a conversa entre Joesley e o ex-presidente Michel Temer (MDB), parte da delação, foi divulgada, a Bolsa despencou e o dólar disparou. A data passou a ser conhecida no mercado financeiro como Joesley Day.
O pedido de Aras ainda precisa ser analisado pelo STF e não exclui a validade do material coletado na delação.
Procurada, a assessoria da J&F disse que a empresa não comentaria o pedido de Augusto Aras.
Outro fator para a queda das ações nesta terça (5) foi a intimação pela PF a ex-presidente Dilma, aos senadores Renan Calheiros (MDB-AL) e Eduardo Braga (AM), líder do MDB e ao do ministro Vital do Rêgo, do Tribunal de Contas da União (TCU), a prestarem depoimentos no inquérito que apura se a JBS fez doações ilícitas de R$ 40 milhões a políticos na campanha eleitoral de 2014.
As medidas foram autorizadas por Fachin, que também autorizou o cumprimento de mandados de busca e apreensão contra pessoas ligadas aos citados na investigação.
Segundo o inquérito sobre o caso, a JBS disponibilizou para o PT uma conta no exterior, cujos recursos foram usados para bancar campanhas em 2014, ano em que Dilma disputou, com sucesso, a reeleição.
Os detalhes da operação não foram divulgados, pois a investigação tramita em sigilo.
As apurações se baseiam nas delações premiadas de executivos da J&F, holding que controla a JBS, do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado e do ex-ministro Antonio Palocci (Fazenda e Casa Civil), entre outros.
Outro lado
Em nota, o ex-procurador Marcello Miller afirma que o relatório da PF apenas insinua que o valor de R$ 1,8 milhão veio da J&F. Segundo o advogado, o escritório TRW não recebeu nenhum valor da empresa, cancelando todas as faturas que emitiu antes que fossem pagas.
Miller também destaca que o relatório da PF não aponta nenhuma transferência de valores da J&F para o TRW e que emails constantes do inquérito indicam que a origem do dinheiro pago a Miller pelo escritório era dos fundos do próprio escritório.
Segundo o advogado, o valor de R$ 1,8 milhão corresponde à soma exata de verbas contratuais que ele tinha direito quando se desligou do TRW. 
Ele diz ainda que “nem mesmo o MPF utilizou as conclusões e as insinuações da PF na ação penal que moveu contra minha pessoa, trancada em setembro passado pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região”.