quinta-feira, 16 de maio de 2019

Aos 50 anos, TV Cultura passa por transformação conceitual e administrativa, fsp



Nova grade terá conteúdo mais pop, promessa de novas plataformas de exibição e comando de empresário velho conhecido do governador




Marcelo Tas apresenta Provocações na TV Cultura
Marcelo Tas apresenta nova versão do "#Provocações", programa criado por Antonio Abujamra - Divulgação
Gustavo Fioratti
SÃO PAULO
Com um novo norte comercial e busca por audiência, o governo João Doria iniciou uma reformulação conceitual e administrativa da TV Cultura, que completa 50 anos. A data será comemorada nesta quarta-feira (15), e ganhará cerimônia no Theatro Municipal de São Paulo.
Desde que o ex-prefeito de São Paulo assumiu o governo, a programação da emissora vem passando por reformulações. Na semana que vem, José Roberto Maluf, executivo com trajetória no setor privado e amigo do governador, deve assumir a presidência da Fundação Padre Anchieta, que administra a TV.
O cenário ainda em formação indica que a TV Cultura deve ficar mais pop e passe a agregar ao modelo atual novas plataformas de exibição. 

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“Hoje não faz mais sentido pensar a operação de um grupo de comunicação apenas como canal de TV”, diz o secretário de Cultura e Economia Criativa, Sérgio Sá Leitão.
“Pensaremos a TV Cultura como uma curadoria de conteúdos que possam ocupar diversos meios e plataformas, incluindo a TV paga, o YouTube, o streaming e aplicativos.”
A intenção, segundo ele, é não perder o foco da qualidade da programação —ele recusa o termo “comercial”— e apostar cada vez mais em conteúdos independentes e cada vez menos no que é criado dentro da própria emissora. 
Prenunciam-se ainda novas formas de publicidade, patrocínio e parcerias comerciais, incluindo a chance de “branded content”, que são conteúdos gerados por empresas na promoção de suas marcas.
Em 2018, de um orçamento geral de R$ 156 milhões, R$ 108 milhões tiveram como origem o próprio estado. No balanço de 2017, o último disponibilizado no sistema da Fundação, uma auditoria apontou um “elevado grau de dependência com o Estado”, pois “parcela substancial das suas receitas são oriundas de dotações governamentais”.
Ainda neste ano, para sua nova grade, a TV Cultura anunciou 20 estreias entre abril e maio. Entre elas, está o reality “Cultura, o Musical”, em que jurados avaliam o trabalho de intérpretes do teatro cantado. Também o “Escala Musical”, com entrevistas de músicos —Fafá de Belém, Otto, Karol Conka, Fernanda Abreu estão na lista. 
Na ficção, houve no fim de abril a estreia da série “Genius: A Vida de Einstein”, que foi produzida originalmente pela National Geographic. Para a noite desta terça (14), ocorreria o lançamento do novo #Provocações, sob comando de Marcelo Tas. 
Para chegar ao nome do novo presidente, a fundação contratou um headhunter —sinalizando que o processo de escolha primaria pela independência da emissora. Diversos nomes passaram pelo processo de seleção: entre os mais cotados, estavam o ex-diretor de negócios internacionais da Globo, Ricardo Scalamandré, e Helena Bagnoli, que tem no currículo passagem pela TV Cultura e pela revista Bravo!.
A uma semana da votação do conselho artístico para a eleição do novo presidente, que entra no lugar de Marcos Mendonça, Maluf é apresentado em candidatura única, pois apenas ele reuniu no conselho subscrições suficientes para concorrer ao cargo. 
Maluf, que por enquanto não quer dar entrevista, trabalhou para o Grupo Doria. Desde 1999, sua amizade com o atual governador era assunto de jornais. Naquele ano, a Folha registrou que o então empresário organizaria jantar para homenageá-lo.
Nos bastidores, diz-se que Doria, sem perder influência dentro da emissora, não queria um político para a cadeira. Evitaria, portanto, o perfil do atual presidente, que foi quadro histórico do PSDB e secretário estadual de Cultura entre 1995 e 2002. Teria contado para a escolha de Maluf o perfil ligado ao setor privado.
Entre funcionários da TV Cultura, a possibilidade de um direcionamento comercial da grade causa preocupação. 
O currículo de Maluf é bem avaliado por diversos conselheiros da fundação —e existe grande probabilidade de que não haja oposição a sua eleição na semana que vem. Além de ter passado pela Band e pelo SBT, Maluf preside o Grupo Spring de Comunicação, que edita a revista Rolling Stone, hoje publicada só na internet.
O conselho que elegerá o novo presidente é o mesmo que foi criticado por Augusto Nunes, ex-apresentador do Roda Viva, em julho do ano passado.
O jornalista disse ao programa Pingue-Pongue com Bonfá, exibido no YouTube e comandado por Marcelo Bonfá, que era pressionado para que fossem convidadas figuras políticas para o programa. “Falavam: ‘Tem que chamar o ministro da Educação, o das Comunicações, o da Saúde’”, exemplificou, na conversa. 
Procurado na época pela Folha, Mendonça disse que as escolhas dos entrevistados para o programa eram sempre pautadas por relevância jornalística. “Somos mantidos pelo estado. E temos total independência.”
A independência da programação da cultura é pauta antiga. A emissora foi criada em 1960 pelo Diários Associados e comprada em 1969 pelo governo do estado por meio da Fundação Padre Anchieta. Um dos momentos mais críticos de interferência política na sua programação foi entre 1979 e 1982, na gestão de Paulo Maluf.

DESTAQUES ENTRE AS ATRAÇÕES ANUNCIADAS

#Provocações 
Marcelo Tas assume o posto de Antônio Abujamra, morto em 2015. Entre os convidados da nova temporada, já no ar, estão Ciro Gomes e Danilo Gentili
Escala Musical 
Nos episódios, dois nomes da música se encontram. Participam artistas como Fafá de Belém, Tetê Espíndola e Karol Conka
Cultura, o Musical 
O programa, que estreou em abril, é um reality show com atores de musical apresentado por Jarbas Homem de Mello
Vitrine Brasil 
A atração está no ar desde abril e viajará por todo o país para contar histórias desconhecidas do interior
Agrocultura 
Voltado à agricultura, o programa recém-lançado traz reportagens sobre a economia rural
Opinião Nacional 
A atração reestreia nesta quarta (15), comandada por Ana Paula Couto. No roteiro, os assuntos que pautam a agenda do país
Fronteiras do Pensamento 
Já no ar, exibe entrevistas com nomes como o psicólogo americano Joshua Greene e o escritor angolano José Eduardo Agualusa
Sala de Cinema 
Pareceria com a SPcine, a programação estreou em maio e traz traz 36 longas de ficção e documentários
Casakadabra 
O programa infantil vai ao ar no sábado (18) e remete a ‘Castelo Rá-Tim-Bum’ ao reunir personagens em uma casa mágica
Horários e programação completa aqui 

    Ficou mais difícil subir a ladeira, FSP

    Com o fracasso da economia no início do ano, até crescer 1% se tornou um problema

    Os economistas dos dois maiores bancos privados, Bradesco Itaú, estimam que a economia tenha encolhido 0,2% no primeiro trimestre do ano, na comparação com o trimestre anterior. Deu chabu, está claro agora para todo o mundo. E daqui em diante? Angústia.
    Vai ser difícil que a economia cresça mesmo o 1% que os bancões preveem para este ano. Para chegarmos a esse miserável 1%, seria preciso que o PIB (Produto Interno Bruto) crescesse ao ritmo de 0,6% por trimestre restante de 2019 ou algo equivalente. E daí?
    Desde 2013, o ano em que tudo começou a terminar, a economia cresceu mais de 0,5% em apenas dois trimestres. Foi em 2013 e no início de 2017, quando houve uma safra excepcional e o país subia uma escadinha do buraco mais profundo da recessão.
    Improvável não é impossível. Economia não é loteria, apesar de mumunhas e mistérios do comportamento social. Difícil é entender de onde viria o impulso para essa aceleração do crescimento, que nem é visível, no momento. Os primeiros indícios são que o segundo trimestre não começou bem.
    O consumo das famílias vai aumentar de modo relevante? Em geral, não é o caso, o consumo privado não costuma dar saltos. Depende do aumento da massa de rendimentos do trabalho, que vem crescendo moderadamente, pois o desemprego mal cai, se tanto. O mercado formal de trabalho parece esfriar.
    Consumo depende também de crédito. Parece razoável acreditar que as pessoas vão tomar mais empréstimos, neste climão? Com a confiança econômica caindo, com a baderna do governo, com as notícias de que a atividade econômica é ainda mais fraca do que se estimava, mesmo com expectativas já reduzidas?
    O investimento em novas máquinas, equipamentos, instalações produtivas e moradias vai dar um salto? É da variação do investimento que dependem as viradas mais relevantes do PIB, para o bem ou para o mal.
    Dos grandes componentes da despesa nacional, também é o mais difícil de prever.
    Dadas a frustração das estimativas de crescimento, a queda do investimento público e a perspectiva falimentar para as contas públicas, parece difícil animar empresas a colocar dinheiro novo nos negócios.
    De resto, um governo que promove a desordem política e o conflito com o Congresso Nacional contribui de modo revoltante para a depressão dos ânimos.
    A despesa do governo não vai crescer, se não cair ainda mais. O investimento em obras vai à míngua. O aumento do investimento privado em infraestrutura, por meio de concessões, parece apenas um plano infalível que não sai do papel, ao contrário do previsto pela euforia privatista que começou em 2016.
    Do aumento de exportações não virá estímulo, se não ocorrer o contrário. Para piorar, Donald "Nero" Trump voltou a criar tumulto na economia mundial, o que prejudica as condições financeiras aqui dentro também (juros, dólar, ações a preços que desanimam investimentos).
    Do lado positivo, as famílias estão algo menos endividadas, na média. Em alguns mercados de empréstimos, há crédito de sobra nos bancos, a taxas de juros nos níveis mais baixos de que se tem notícia, caso do financiamento imobiliário.
    A aprovação de reformas até o terceiro trimestre deve tirar algum investimento privado da gaveta, além de levar Banco Central e mercado a reduzirem em um tico as taxas de juros. Mas esse eventual estímulo deve fazer algum efeito mesmo no ano que vem.
    O programa só acaba quando termina. Mas está difícil.
    Vinicius Torres Freire
    Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).