quarta-feira, 15 de maio de 2019

Governo está perdido no meio de suas próprias cortinas de fumaça, FSP

Bolsonaro busca distrações absurdas para encobrir retrocessos e falta de rumo

O partido do presidente se empenhou. Enquanto monarquistas batiam boca com o movimento negro numa sessão alusiva à Lei Áurea, Eduardo Bolsonaro gravava tudo com o celular. O líder do PSL dançava, fazendo corações com as mãos, e o deputado da família real subia à tribuna para relativizar a escravidão e defender a princesa Isabel.
O governo Jair Bolsonaro se perde no meio de suas próprias cortinas de fumaça. O presidente e seus aliados insistem em buscar distrações absurdas para encobrir retrocessos reais e esconder o fato de que não conseguem levar adiante políticas públicas importantes para o país.
O presidente Jair Bolsonaro durante evento da Caixa Econômica Federal, em Brasília, neste mês
O presidente Jair Bolsonaro durante evento da Caixa Econômica Federal, em Brasília, neste mês - Pedro Ladeira/Folhapress
No momento em que bolsonaristas se curvavam à realeza só para irritar ativistas rivais, o ministro da Educação defendia o congelamento de despesas nas universidades e o presidente mantinha firme seu decreto que expandiu o porte de armas.
Sem enxergar o caminho pela frente, a turma do Palácio do Planalto bate de cara no muro. A equipe de Bolsonaro nem viu quando deputados articularam uma convocação relâmpago de Abraham Weintraub para explicar o bloqueio do orçamento das instituições de ensino superior. A ida do ministro à Câmara no dia do protesto contra a política educacional tende a desgastar o governo.
Nos últimos dias, o Congresso também se movimentou para modificar o ato de flexibilização das armas de fogo e trabalhou para retirar o Coaf das mãos de Sergio Moro.
Ao acumular derrotas, o bolsonarismo reclama que velhos políticos impedem o presidente de implantar o programa vitorioso nas urnas. Não consegue, porém, explicar um corte de gastos severo ou o sentido do decreto que formaliza o bangue-bangue. Também não conta aos eleitores que o governo mal se mexeu para defender a vontade de Moro.
Na última semana, Bolsonaro disse que alguns reveses são como “tsunamis”. Faltou dizer que, quando entra em brigas inúteis e leva o país por estradas perigosas, é ele quem provoca os terremotos que dão origem às ondas de devastação.
Bruno Boghossian
Jornalista, foi repórter da Sucursal de Brasília. É mestre em ciência política pela Universidade Columbia (EUA).

Brasil, o país do passado, FSP

Escolas e universidades param nesta quarta (15) para protestar contra o corte de verbas para educação e pesquisa na administração federal. O movimento é correto e tem todo o meu apoio. É importante para a democracia que o governo Bolsonaro (ou qualquer outro governo) encontre oposição e que ela seja feita por setores relevantes da sociedade, não por alas rebeldes do próprio bolsonarismo, como vinha ocorrendo até aqui.
Isso dito, os protestos não vão mudar o fato de que o dinheiro público, se não acabou, tornou-se bem mais escasso. Não dá para esperar que, num contexto em que faltam recursos até para assegurar o funcionamento de hospitais, verbas de educação e pesquisa sejam mantidas intocadas. Há, porém, modos melhores e piores de restringir orçamentos.
Aumentar o nível de exigência para financiar projetos ou para conceder bolsas, por exemplo, é algo que faria todo sentido. Mas o governo, ao ideologizar a questão e emburrecer o debate em torno do que merece ou não aportes oficiais, escolheu um caminho péssimo, que pode legitimamente ser repudiado.
No fundo, o que estamos discutindo é se o Brasil deve ser o país do futuro ou do passado. Destinar verbas para educação e para a ciência (incluindo as humanidades) sinaliza uma aposta no futuro. Priorizar gastos em Previdência e mesmo em saúde (velhos ficam mais doentes do que jovens) indica comprometimento maior com o passado.
Não estou, obviamente, sugerindo que deixemos os idosos ao deus dará ou que o SUS pare de atender às moléstias típicas da terceira idade. Compromissos assumidos precisam ser honrados, e o cuidado que uma sociedade dedica a seus membros mais vulneráveis diz muito sobre o seu grau de civilização. Ainda assim, nosso perfil de investimentos —Previdência, 13% do PIB; saúde, 10%; educação, 6%; e pesquisa; 1,3%— sugere que o Brasil anda mais preocupado com o passado do que com o futuro. É uma pena.


Hélio Schwartsman
Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".