sexta-feira, 14 de setembro de 2018

Um pênalti por dia, Ruy Castro, FSP

Rodolfo, goleiro do Fluminense, enfrenta a dependência química com lucidez

No Maracanã, Rodolfo, do Fluminense, defende o pênalti cobrado pelo botafoguense Lindoso
No Maracanã, Rodolfo, do Fluminense, defende o pênalti cobrado pelo botafoguense Lindoso - Reprodução
Aos 38 minutos do segundo tempo de Fluminense x Botafogo no domingo (9), pênalti para o Botafogo. No placar, Fluminense 1 a 0. O alvinegro Lindoso vai bater. No arco tricolor, estava Rodolfo, goleiro que entrara no intervalo, substituindo o titular Júlio César, contundido. Rodolfo tem um drama. Aos 21 anos, em 2012, atuando pelo CRB, de Maceió, caiu no antidoping —cocaína— e tomou dois anos de suspensão. Recuperado, voltou ao futebol pelo Atlético Paranaense e, agora, está no Fluminense. Ah, sim, o pênalti. Lindoso correu para a bola e chutou forte, no canto. Rodolfo fez grande defesa, garantindo a vitória.
Até aí, apenas uma boa história de volta por cima, embora esta, quando envolve álcool ou drogas, não seja comum no futebol. Vide Jardel, ex-Grêmio, Adriano, ex-Flamengo, e Jobson, ex-Botafogo —a dependência acabou com suas carreiras. São raros os casos como o de Dinei, ex-Corinthians, e Breno, de novo no São Paulo, que se conscientizaram, deram uma nova chance a si próprios e voltaram a jogar. 
O importante em Rodolfo é que, tendo abandonado a droga há quatro anos, ele não se considera curado. E está certo. Ninguém se “cura” da dependência química —consegue, no máximo, mantê-la sob controle, um dia por vez. E, ao contrário de outros jogadores que também passaram por isso, ele não atribui seu uso da droga à morte do pai, a problemas com a noiva ou aos “fantasmas que o assolavam” —não põe a culpa em ninguém, muito menos no fantasma. 
Sócrates, médico, nunca admitiu sua dependência; Paulo Cezar Caju contou uma história charmosa para explicar a dele; e Casagrandepublicou um apressado livro de autocelebração quando, na verdade, continuava na ativa. Não sei com quem Rodolfo se tratou ou se trata. Mas, ao ouvi-lo ao fim do jogo, pareceu-me lúcido e objetivo.
Sabe que, até o fim, terá de defender um pênalti por dia.
Ruy Castro
Jornalista e escritor, autor das biografias de Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues.

As quimeras do PT, FSP

As quimeras do PT

História que Haddad e o partido estão contando nesta campanha merece reparos

“Por que a verdade não seria mais estranha do que a ficção? A ficção, afinal, precisa fazer sentido.” O chiste acima, atribuído ao escritor norte-americano Mark Twain, faz todo o sentido. Quem cria uma história precisa curvar-se às exigências da estrutura narrativa e da verossimilhança; já quem se limita a relatar fatos corre maior risco de parecer caótico e contraditório.
Gosto de Fernando Haddad. Considero-o um dos melhores quadros do PT. Mas a história que ele e o partido estão contando nesta campanha é quimérica demais para passar sem reparos.
Na narrativa petista, o país ia bem sob as administrações da legenda. Havia forte crescimento com distribuição de renda. As elites, porém, não podiam admitir que pobres enriquecessem e, por isso, decidiram desferir um golpe para tirar Dilma Rousseff do poder. Ao fazê-lo, destruíram a economia, nos lançando numa das piores recessões da história.
​E, para assegurar que o PT não voltaria, essas mesmas elites deram um jeito de montar uma farsa judicial para colocar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na cadeia. Eleger Haddad seria a única forma de resistir a esse ataque à democracia.
Simples demais para ser verdade. Entre os muitos furos na história, destaco os dois que me parecem mais graves. Não há alusão ao fato de que foram erros, alguns deles grosseiros, na política econômica de Dilma que precipitaram a crise.
Também não se menciona que o PT, ao lado de outros partidos, se envolveu em enormes esquemas de corrupção e que Lula foi sentenciado no curso de um processo regular, que correu num ambiente democrático. Mesmo que existam dúvidas sobre a suficiência das provas que o condenaram, não há como contestar que ele se meteu numa relação para lá de promíscua com empreiteiros, o que já basta para comprometê-lo no campo ético.
Sempre que a história contada por um candidato for muito redondinha, desconfie.
Hélio Schwartsman
Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".