hélio schwartsmanhelio@uol.com.br
Na carta que enviou à presidente do PT, Lula cravou: “Se eu aceitar a ideia de não ser candidato, estarei assumindo que cometi um crime. Não cometi nenhum crime. Por isso sou candidato até que a verdade apareça”.
Compreendo a frustração de Lula e reputo o “jus sperneandi” (direito de espernear) como sagrado, mas receio que a declaração do ex-presidente nem sequer faça sentido. Não há vínculo necessário entre manutenção da candidatura e admissão de culpa.
Se o modelo quântico dos muitos mundos é correto, existe tanto um universo onde Lula é inocente e não sai candidato como um no qual ele é culpado e fica na disputa. Nenhuma combinação imaginável viola a lógica nem as leis da física.
Em qual universo estamos? A Justiça deu seu veredicto, mas, numa democracia, estamos obrigados apenas a acatar as decisões do Judiciário, não concordar com elas. Mesmo assim, acho difícil conceber um mundo no qual um dirigente político muito influente no governo que aceita receber presentes caros de empreiteiros seja inocente.
Não é que isso chegue a violar as leis da física, mas contraria as tendências probabilísticas. Eu e milhões de brasileiros temos sítios, mas nenhuma construtora se oferece para reformá-los de graça. O “reasonable man” dos manuais de direito tem o dever de desconfiar de tamanha generosidade.
Vale ainda observar que o relacionamento que Lula estabeleceu com empreiteiros jamais seria tolerado no PT dos anos 80, que prometia trazer a ética para a administração pública. E o fato de os militantes agora tentarem justificar as atitudes de seu líder apenas reforça a tese daqueles que sustentam que a política, em especial a política partidária, tem mais a ver com identidades do que com princípios.
E, nesse registro, aquilo que teria bastado para jogar um Maluf atrás das grades por décadas agora é insuficiente para condenar um Lula.
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