sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

Dos agrotóxicos às secas e inundações, WASHINGTON NOVAES*, O Estado de S.Paulo


O Brasil utiliza vários dos já banidos na União Europeia pelos graves impactos na saúde


08 Dezembro 2017 | 03h00
É muito preocupante: segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o Brasil é o país que mais consome agrotóxicos no mundo; mais de dois terços dos alimentos produzidos aqui são contaminados por esses agentes; nossos solos recebem, junto com sementes e mudas, “uma quantidade até 5 mil vezes maior de agrotóxicos que a permitida na Europa”, conforma recente estudo da pesquisadora Larissa Mies Bombardi, do Laboratório de Geografia Agrária da USP. Muitos dos ingredientes ativos consumidos no País já são proibidos nos Estados Unidos, na União Europeia, na China e no Canadá. Só entre 2000 e 2012 a venda de agrotóxicos no Brasil cresceu 288%. Monoculturas como a da soja concentram 80% dos produtos tóxicos agrícolas (Henrique Koifman, 30/11).
Mesmo na Europa, entretanto, o problema está presente. A polêmica mais recente está na renovação para uso, por mais cinco anos, do herbicida glifosato. No Brasil são muitos os projetos nessa área. E “oito brasileiros se intoxicam a cada dia com os produtos liberados”, pois nossa legislação na área é muito mais permissiva do que a europeia, por exemplo. Temos 504 agrotóxicos de uso permitido (Repórter Brasil, 2/12/17) para o café, cana-de-açúcar, citros, milho, soja, dos quais 30% proibidos pelos europeus estão na lista dos mais vendidos por aqui.
São muitos os produtos liberados entre nós, a ponto de já respondermos por 20% do que é comercializado mundialmente: entre 2000 e 2014 o consumo brasileiro passou de 170 mil toneladas anuais para 500 mil. Nos Estados do Rio Grande do Sul, do Paraná, de Goiás e de Mato Grosso o consumo do herbicida glifosato está entre 9 e 19 quilos por hectare – e o consumo excessivo pode causar câncer de mama, necrose de células e redução do tempo de vida dos animais. A França já anunciou que banirá o glifosato até 2022. O país ainda permite até 2 quilos por hectare e a média brasileira está entre 5 e 9 quilos por hectare. O consumo maior de agrotóxicos no Brasil, entretanto, não aumentou a produção nacional de alimentos por hectare.
Os estudos na área informam que trabalhadores rurais são as principais vítimas de contaminação. Depois deles, moradores próximos de plantações, principalmente pulverizadas (no Estado de São Paulo 75% da área plantada é pulverizada). De acordo com a sanitarista Telma de Cássia dos Santos Nery, em entrevista recente a Sucena S. Resk (Instituto Humanitas Unisinos, 4/12), 24% dos anos perdidos por incapacidade e 23% das mortes prematuras no mundo podem ser atribuídos à exposição a riscos ambientais e ocupacionais “evitáveis”. A poluição do ar causou 8 milhões de mortes precoces em 2015 e é hoje a principal causa de mortes por complicações cardiorrespiratórias, entre elas arritmia, enfarte do coração e derrame cerebral – relacionadas com o meio ambiente e câncer do pulmão. No Estado de São Paulo o número de mortes (11.200 em 2015) causadas pela poluição é maior que o de óbitos provocados por acidentes de trânsito (2.867), câncer de mama (3.620) ou aids (2.922).
Nesse contexto, entre os principais fatores ambientais estão os problemas causados por consumo, uso de e exposição a substâncias químicas, principalmente agrotóxicos. O Brasil é o maior consumidor mundial desses produtos, desde 2008/2009. A Organização Mundial da Saúde e o Instituto Nacional do Câncer já têm informado que os agrotóxicos são cancerígenos. E que o Brasil utiliza regularmente vários deles, alguns banidos na União Europeia por causa dos graves impactos na saúde humana. Já o SUS lembra que o gasto do Ministério da Saúde com tratamentos contra câncer cresceu 66% nos últimos cinco anos: R$ 2,1 bilhões em 2010 e R$ 3,5 bilhões em 2015. O número de doentes em tratamento no SUS passou de 292 mil em 2010 para 393 mil em 2015. Segundo outros estudos, para cada dólar gasto na compra de agrotóxicos, US$ 1,28 deve ser aplicado nos custos externos com tratamento de saúde; mais de 60% no tratamento de trabalhadores em plantações de cana-de-açúcar. Outros complicadores ainda: a área pulverizada no Estado de São Paulo é de 11,82% do total, 30% dos agrotóxicos utilizados são contrabandeados, a fiscalização apontou a presença de usuários em áreas de controle ambiental.
Os problemas no campo não se resumem a questões derivadas dos agrotóxicos. O Cerrado, por exemplo, perdeu nos últimos 15 anos 263 mil quilômetros quadrados – uma área equivalente à do Estado de São Paulo. Causas apontadas: expansão desordenada da fronteira agropastoril, incentivo insuficiente às pesquisas em defesa do bioma. Segundo o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, é preciso aumentar as áreas de proteção, ampliar a defesa dos recursos hídricos, explorar melhor o potencial farmacológico e dos cosméticos das plantas do cerrado.
Tudo isso adquire ainda um caráter de urgência, dado o agravamento de fenômenos climáticos, como, por exemplo, a maior sequência de anos com seca extrema em 12% da superfície terrestre do planeta, incluído o ano passado – a maior seca nos últimos 800 mil anos. O Nordeste brasileiro não fugiu à regra. Mas não apenas essa parte do território: em quatro anos, secas e inundações afetaram 55,7 milhões de brasileiros, mais de 25% da população nacional, com perdas de R$ 9 bilhões por ano (Instituto Humanitas Unisinos, 4/12). No Nordeste, de 2013 ao ano passado, 78,4% dos 1.794 municípios da região decretaram, ao menos uma vez, situação de emergência ou calamidade pública por causa da seca extrema. Outros 2.641 municípios decretaram emergência ou calamidade pública por causa de inundações e alagamentos – fenômeno que começa a repetir-se neste final de ano. “Este ano deve se confirmar como o pior do período chuvoso, o mais seco desde 1931, quando começou a série histórica”, diz Joaquim Gondim, superintendente da Agência Nacional da Águas.
Cuidemo-nos.

quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

Mais um tombo nos juros, Celso Ming , OESP

Celso Ming, O Estado de S.Paulo
06 Dezembro 2017 | 20h45
Juros a 7% ao ano, quem diria... É o nível mais baixo desde 1999, quando começou a ser praticada a política de metas de inflação (Veja o gráfico abaixo). E deve baixar ainda mais.
O mergulho de 14,25% ao ano até estes 7,0% levou apenas 13 meses. É um tombo de grandes proporções em período curto.



O comunicado divulgado logo após a reunião do Copom não fechou questão sobre quando concluir o atual ciclo de baixa, que começou em outubro de 2016. O texto ainda admitiu que pode cair mais, moderadamente. Caso não sobrevenham surpresas ruins, isso programa outro corte, de 0,25 ponto porcentual, em fevereiro.
Há três meses, o Banco Central vem preparando os espíritos para certo período de estabilidade, que, em princípio, é o nível de juros neutros, aquele que não produz nem inflação nem desinflação, na meta que é de 4,0% ao final de dezembro de cada ano. Mas até agora a inflação veio mergulhando mais fundo do que o Banco Central e o mercado projetaram.

Copom
Há possibilidade, ainda, para mais um corte em fevereiro, a primeira reunião do Copom de 2018 Foto: Beto Nociti/Banco Central
Nesta sexta-feira sai a inflação de novembro e aí ficará mais claro se o piso da meta (os 4,5% no ano menos a área de escape, de 1,5%) terá sido furado ou não. Com uma inflação nos níveis de agora, os juros básicos (Selic) em 7% ao ano indicariam que o custo real do dinheiro (descontada a inflação) continuaria alto demais. Uma coisa é juro real de 4% ao ano quando a inflação é de 10% e outra, bem diferente, quando fica em torno dos 3%.
Embora em seu nível mais baixo, estes ainda são juros excessivos quando comparados com os que prevalecem nos Estados Unidos e na área do euro: de 1,25% em 12 meses, para os norte-americanos, e zero por cento, para os europeus, ao ano. Falta conferir até que ponto essa inflação bem mais baixa veio para ficar ou se é apenas soluço temporário. A principal causa da inflação – a desordem das contas públicas – ainda não foi removida. E o grande risco de recaída grave é a falta de reformas, diz o comunicado.
Em 2012, a Selic também despencou, quando foi a 7,25%. A diferença é a de que naquela vez os juros caíram artificialmente, por ordem da presidente Dilma, sem que o comportamento da inflação tivesse criado condições técnicas para isso. Desta vez, os juros vêm caindo naturalmente, na cola da inflação também desmaiante.
Mesmo levando em conta que os juros na ponta do tomador de crédito não caíram na mesma proporção, não dá para negar que o custo do financiamento vem caindo e deverá seguir caindo, tanto para as empresas como para pessoas físicas. E, na medida em que ajuda a reduzir os custos de produção, este é fator adicional que ajuda a derrubar a inflação.
O impacto macroeconômico mais importante desse tombo dos juros acontece nas contas públicas. Embora a dívida pública continue crescendo, seu custo (em juros) vai caindo à metade. E há também o efeito sobre os subsídios no crédito, especialmente nos de longo prazo concedidos pelo BNDES. A Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) está fixada, há sete meses, em 7,0% ao ano. Como até agora o Tesouro vinha pagando mais do que isso para levantar recursos repassados ao BNDES que cobrissem o rombo das contas públicas, esse crédito vinha embutindo um subsídio. Na medida em que a Selic se iguala à TJLP, esse subsídio vai sendo zerado.
O outro efeito macroeconômico acontece nas aplicações financeiras. Acabou o tempo de retorno abundante, na maior moleza. Com o novo patamar dos juros, para obter um rendimento melhor será preciso arriscar mais: ou aplicar dinheiro em negócio próprio ou em ações, em ouro, em moedas. Nessas condições, qualquer um está sujeito a tropeços. O aplicador tem agora de reaprender a administrar as finanças pessoais num regime de inflação e juros bem mais baixos.

quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

Expectativa x realidade, Vera Magalhães, O Estado de S.Paulo

Vera Magalhães, O Estado de S.Paulo
06 Dezembro 2017 | 03h00
A expectativa de que a convenção do próximo sábado fosse a aclamação da pré-candidatura de Geraldo Alckmin à Presidência não do PSDB, mas da República, vai esbarrando na realidade de um partido para lá de dividido.
Por enquanto, fracassaram as investidas de bombeiros como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso de dissuadir o prefeito de Manaus, Arthur Virgílio, de manter a postulação por prévias na sigla. Embora ninguém leve a sério nem sequer a real disposição do ex-senador de disputar a Presidência, ele quer se manter em evidência pelos próximos meses para depois engatar uma candidatura ao governo do Amazonas ou ao Senado.
Mesmo o esperado e já combinado anúncio do apoio de João Doria Jr. ao padrinho depois de meses em que mediram forças esbarra em outra questão: o que o prefeito de São Paulo dirá quando questionado sobre uma eventual candidatura ao governo? A pesquisa Datafolha que mostrou a deterioração de sua popularidade contribuiu para que aliados de Doria o aconselhassem a ser o mais discreto possível em se tratando de planos políticos.
Por fim, existe uma saia-justa instalada na sigla com a insistência de Aécio Neves em comparecer à convenção. Como tucanos têm punhos de renda, ninguém pediu abertamente ao mineiro que arranje uma desculpa e não vá a Brasília. Assim sendo, o mais provável é que Alckmin, além de não ser aclamado, ainda tenha de posar para a tradicional foto com braços levantados ao lado do presidente licenciado do partido.
MINAS
Tucanos temem acordo de Aécio com Pimentel
Aliados de Geraldo Alckmin temem que Aécio Neves feche um acordo informal com o governador Fernando Pimentel em Minas para facilitar o caminho de ambos à reeleição. O PSDB apoiaria a candidatura ao governo do deputado Rodrigo Pacheco pelo DEM, mas sem se empenhar. Aécio está sendo encorajado a buscar novo mandato no Senado, pois uma candidatura a deputado seria vista como admissão de culpa na Lava Jato. Alckmin, que precisa ter em Minas uma votação capaz de compensar a dificuldade que terá no Nordeste, teme ser rifado caso a aliança branca avance.
PREVIDÊNCIA
Governo descarta esperar eleição para votar texto
Setores do empresariado fizeram chegar ao governo a ideia de que, caso não haja segurança no placar de votação da reforma da Previdência, seria melhor aguardar as eleições para votar uma proposta mais dura no final da gestão Michel Temer. Sem a pressão das urnas, deputados reeleitos ou não estariam livres para votar. O governo descarta a ideia: acha que quem se reeleger vai querer reabrir a discussão com o próximo presidente para valorizar o passe. “Ou vota agora ou não vota”, diz um palaciano.
CANDIDATO OU NÃO?
PT e defesa de Lula contam com TV para criar fato consumado
A cúpula do PT e a defesa de Lula traçaram um cronograma segundo o qual é possível manter sua candidatura pelo menos até a primeira quinzena de setembro com sucessivos recursos jurídicos. Avaliam que, após a estreia do petista no horário eleitoral de TV, sua impugnação seria vista como interferência excessiva no processo e, assim, poder-se-ia criar um fato consumado.