segunda-feira, 24 de novembro de 2014

O que significa ser adulto, por RENATO ESSENFELDER (blog)



24 Novembro 2014 | 07:58

Ser adulto é preocupar-se demasiado com o melhor a fazer, levando em consideração todas as coisas ao redor. Concentrar-se em acertar. Depois descobrir que o certo era errado, que o errado era certo, que não existem certezas nem de erros nem de acertos, que ninguém liga para a sua pontuação no grande jogo.

adultos
arte: loro verz
Quando perguntei à minha filha o que significava ser adulto, ela sorriu. Pareceu curtir o desafio: uma brincadeira. Parou por um segundo, em plena avenida Paulista, deixando o picolé derreter silenciosamente sobre as mãos pequenas.
No sol está quente, mormente, quente demais.
– Ser adulto é ter mais liberdade. Você pode sair e tomar uma cerveja com os seus amigos, e eu, não. Mas é também ter mais responsabilidades. Como você está comigo, não pode tomar cerveja com os seus amigos. É estranho, ser adulto.
Satisfez-se com a própria argumentação. Depois, ao picolé.
Ao vencedor, os sorvetes.
A vida é cheia de estranhezas e contradições. Antes regra do que exceção, estão por toda a parte, em todas as idades. Na vida adulta, talvez a contradição maior seja essa adivinhada por uma criança de 11 anos: a liberdade de tudo versus compromissos concretos ou abstratos. Honra? Responsabilidades.
Mas há mais contradições. E ironias.
Fazer o melhor nem sempre é fazer o que desejamos. Aliás, para a maioria dos mortais, nunca o é. Todos os manuais imprimem em letra dourada “trabalhe com o que gosta e nunca mais terá de trabalhar”, mas, no fim do mês, ser adulto é pagar as contas,  o que raramente pode ser feito com cachorros, mojitos, jazz e literatura.
Fazer o que gostamos de fazer é um luxo bem-vindo, mas no mais das vezes uma utopia; vencer a loteria. É preciso fazer, contudo. Sempre. Imóveis estão os cadáveres, a vida exige movimento contínuo.
E não nos enganemos: a vida pode sorrir, mas não se dobra aos nossos caprichos. Ela simplesmente diz: é preciso seguir.
Aconteça o que acontecer, é preciso seguir. O sentido da vida é este: em frente.
No caminho, fazemos o melhor possível. O desejo vai ao lado, sussurrando delícias. Dizendo: você pode também isto. Atracar nesta ilha, embebedar-se, refestelar-se com os seus amigos. Mas a alma, sábia e ranzinza, sabe que é uma armadilha. Sabe o que é preciso.
Ser adulto é às vezes triunfar sobre sussurros, sibilos e ambições: fazer o melhor possível. Às vezes, fracassar. Em todo caso, responsabilizar-se. Porque o melhor possível do homem jamais é coisa alguma ante a vida – que, de ombros, lixando as unhas no infinito, segue sua marcha imperiosa.
Ser adulto é fazer o melhor possível, e toda sorte de sacrifícios, sabendo-os em vão. Aí a contradição se complica. Não basta sacrificar o desejo pelas necessidades da honra, é preciso fazê-lo sabendo-se errado. E depois repetir-se exaustivamente “fiz o melhor”, como o rei que repete “sou o rei”, o poeta que diz “sou o grande poeta” ou o aluno que retruca “sou o bom aluno”. Todos enganando-se sistematicamente, reiteradamente, como máquinas enferrujadas.
Ser adulto, adultecer, é preocupar-se demasiado com o melhor a fazer, levando em consideração todas as coisas ao redor. Concentrar-se em acertar.
Depois esperar a velhice chegar. Descobrir que o certo era errado, que o errado era certo, que não existem certezas nem de erros nem de acertos – e ninguém liga para a sua pontuação no grande jogo.
Descobrir que foi tudo em vão, menos aquele desejo descalço sussurrado à beira da estrada. 
Então, compreender.
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De barco e Bilhete Único, da revista Apartes- CMSP

Lei da Câmara prevê rios e represas incorporados ao sistema público detransporte coletivo de São Paulo
Gisele Machado | gisele@camara.sp.gov.br
FUTURO - O Rio Pinheiros corta São Paulo de norte a sul e terá uma das hidrolinhas
Caio  Pimenta/SPTuris
Os maltratados rios e represas de São Paulo são lugares “extraordinários”na opinião doespecialista em infraestrutura fluvial Alexandre Delijaicov. A descrição é pouco usual,principalmente por se referir a águas que, “em alguns pontosnão são líquidasmas uma pasta”,nas palavras do próprio acadêmico. O estudioso, no entantoleva em conta o protagonismo queas águas paulistanas  tiveram e podem voltar a ter na cidade.
HIDROLINHAS - Jair Tatto apresentouproposta que cria as duas primeiraslinhas da cidade
Gute Garbelotto/CMSP
Essa importância históricaperdida nas últimas décadaspode serretomada por meio da Lei 16.010/2014, proposta pelo vereadorRicardo Nunes (PMDB) e promulgada em junho. A legislação prevêincorporação do Sistema de Transporte Público Hidroviário deSão Paulo (STPHSPà rede de transporte coletivoOu seja, opaulistano poderá navegar por rios e represas da cidade e pagarcom o Bilhete Único que os portos estarão integrados aosistema de ônibusmetrôs e trens.
Delijaicovque é arquiteto da Prefeitura de São Paulo, professordoutor e coordenador do Grupo Metrópole Fluvial da Faculdadede Arquitetura e Urbanismo (FAUda Universidade de São Paulo (USP), diz que o STPHSP poderia ser composto por cincopotenciais hidroviasuma no Rio Tietêduas no Rio Pinheirosumana Represa Guarapiranga e outra na Represa Billings.
A via do Rio Tietêsozinhateria 30 quilômetros de extensão, amaior entre as três hidrovias lineares que devem integrar osistema paulistano. Nos rios os trajetos serão feitos em linha reta,mas nas represas nãoentão é quase impossível calcular a extensão e quantidade das travessias. “Nos lagos (represas), a possiblidade de ligações é ilimitadalembra uma teia de aranha”explicaDelijaicov, um dos profissionais que deram subsídios à elaboração da lei.
AUTOR - Projeto de Ricardo Nunes criou sistema hidroviário
interligado ao Bilhete Único
Comunicação Ricardo Nunes
LINHAS AQUÁTICAS
Quem tem condições financeiras paracomprar uma embarcação e pagar pelaancoragem sabe o valor de cortar caminho. Aadministradora Renata Maynard leva hoje 13minutos para chegar ao trabalho de jet ski,pela represa Guarapiranga, em vez deperder 2 horas e meia todos os dias em seuautomóvel na Estrada do M’Boi MirimEla foiouvida pela equipe do portal da CâmaraMunicipal de São Paulo (CMSP). Seu pai, oempresário Ricardo Maynard, é outro quedesistiu do asfaltotambém vai trabalhar de jet ski, na Capela do Socorro, e chega emapenas 10 minutos“Aproveito a paisagem eainda tenho segurança”conta. De carro,levava pelo menos 1 hora e 40 minutos.
Para a mesma reportagem, a equipe do portal fez um testeÀs 10 horas de uma sexta-feira, emperíodo de férias escolares, um dos repórteres percorreu de ônibus em 1 hora e 15 minutos os10,4 quilômetros que separam o Jardim Horizonte Azul, no extremo sul de São Paulo, do bairro de Santo Amarotambém na zona sul. O trajeto foi feito pela congestionada Estrada do M’Boi Mirim. No mesmo dia e horáriooutro repórter fez o deslocamento de lancha, a uma velocidade média de 35 km/h, e levou 17 minutos.
A Lei 16.010 determina que o STPHSP tenhadeslocamentos que prezem pela economia,segurançaeficiênciaconforto e rapidez. Ofluxo das embarcações deverá ser “constantee regular”. “Do ponto de vista imediato eprático, a legislação poderá beneficiar cercade 2 milhões de pessoas que vivem embairros da zona sulcomo GrajaúPedreira eJardim Ângela”acredita o vereador RicardoNunesautor do projeto.
Até o fechamento desta edição, a Prefeituranão tinha regulamentado a lei e decididocomo vai operacionalizar o sistemaMas o Plano Diretor Estratégico (PDE) do Município,aprovado pela CMSP e promulgado em julhopelo prefeito Fernando Haddad (PT), adiantaalgumas exigências sobre o que os portos depassageiros devem terserviços públicos eproximidade com trensmetrôsônibus,cicloviasserviços de compartilhamento deautomóveis e estacionamentosalém dearticulação com ofertas de moradia popular.
Um dos pontos positivos é que ainfraestrutura para navegação depassageiros exige gastos mínimos. “O cais e a atracagem são muito simples, [requerem]apenas um deque de madeira”diz Delijaicov.Não seria necessário aprofundar os leitosdos rios quepara o transporte depessoas, no máximo 1 metro do casco fica submersoTampouco é preciso fazer desapropriaçõesconstruir eclusas para levar o passageiro de uma estação a outraAssim como no sistemametroviáriosão as pessoas que se locomovem entre os pontos.
As cinco potenciais hidrovias a integrar o STPHSP são indicadas pelos estudos do GrupoMetrópole Fluvial: Rio Tietê, Rio Pinheiros inferior (das imediações da estação de trem Ceasa atéUsina Elevatória de Traiçãona altura da estação de trem Vila Olímpia), Rio Pinheiros superior (desde a estação Vila Olímpia até a Billings) e represas Bilings e Guarapiranga. As duas primeiraslinhas podem surgir de projetos de lei (PLs) em tramitação na CMSP. O PL 136/2013, do vereadorJair Tatto (PT), cria a travessia entre M’Boi Mirim e Capela do Socorro, separados pela represaGuarapiranga. O PL 267/2013, proposto também pelo petistaliga Grajaú e Pedreiraque estãoem margens opostas da represa Billings.
TIETÊ - Ônibus anfíbio navegou o rio canalizado para divulgar evento náutico
Divulgação Boat Show
Com as iniciativasTatto pretende reduzir a vulnerabilidade social de quem mora às margens dasrepresas“Essas regiões não oferecem empregos suficientes para todos os moradores, e por issomaior parte deles enfrenta horas de trajeto todos os diasgerando inclusive danos à saúde”. Para Delijaicov, as duas travessias propostas pelo vereador poderiam funcionar como um primeiroteste do sistema hidroviário, com dois barcos em cada trecho. “As linhas propostas são as maisurgentesmas deveria haver uma também no Canal Pinheiros e outra no Tietê”observa oespecialista.
LONDRES - Na capital inglesa, as hidrovias foram
recuperadas nos anos 1960
Carolline S. C. Rocha
ROTERDÃ - No primeiro plano, táxi aquático em águas holandesas
Wagner Correa
O Grupo Metrópole Fluvial tem transmitido à Prefeitura os detalhes dos portos que imagina para a cidade. Eles teriam centros de cultura, lazer, assistência social, saúde, educação ambiental focada na reciclagem e educação esportiva voltada ao remo e navegação a vela. “Seria uma praça de políticas sociais que, por estar na beira do canal ou lago navegável, passaria a ter um papel importantíssimo para mudar a mentalidade da sociedade, do cidadão, visando à preservação da qualidade ambiental urbana, ao bem-estar coletivo e individual”, diz o coordenador do grupo, Alexandre Delijaicov.
A ideia é que os cais sejam ponto de encontro natural e prazeroso entre os paulistanos, que lá poderão acessar vários serviços públicos. Enquanto os pais usam o corredor aquático para trabalhar ou estudar, por exemplo, os filhos aprendem esportes hoje reservados à elite. “Quem veleja ou rema são os filhos, netos e bisnetos dos diretores de empresas alemãs e suecas que se instalaram na cidade. Essa injustiça social tem que ser superada através do fomento, a toda a população, do direito de remar e velejar”, defende Delijaicov.
NAVEGAÇÃO NO TIETÊ
Em 17 de setembro, um ônibus anfíbio navegou pelo Tietê, como parte das atrações do evento São Paulo Boat Show. Uma das passageiras, Marlene Maia Matos, de 80 anos, chegou a nadar naquelas águas nos anos 1940. “Aprendi a nadar no Tietê, tomei água do rio quando tinha 10 anos. É muito triste estar navegando por ele nestas condições hoje”, contou emocionada.
A questão que muitos paulistanos fazem é: será possível utilizar águas tão poluídas, que lembram esgoto a céu aberto? Para Delijaicov, a melhor saída para despoluir é exatamente voltar a navegar. Primeiramente porque a poluição é inofensiva para os barcos e os passageiros não terão contato com a água. Além disso, o uso tornará mais evidente a necessidade de cuidar dos rios e represas. “A hélice vai enroscar no sofá [atirado à água] no primeiro dia. Com três ou quatro horas diárias de limpeza e manutenção do sistema, como no metrô, não vai enroscar mais”, diz o professor, adepto da teoria de que “quem usa cuida”.
Nas horas dedicadas à manutenção do sistema aquático, entrariam em cena os barcos limpadores, nos moldes dos usados em países como França e Holanda, que utilizam bastante o meio fluvial. São embarcações que aspiram a água, peneiram a superfície com uma escumadeira, escovam as paredes dos canais e retiram objetos maiores, como as bicicletas comumente encontradas nas hidrovias holandesas.
RAPIDEZ - Ricardo Maynard vai de jet ski ao trabalho,
pela Guarapiranga, em 10 minutos
Luiz França/CMSP
Com um sistema rodoviário saturado, “a cidade poderá sair na frente na construção de uma alternativa eficiente, barata e ambientalmente adequada” de transporte, diz o vereador Ricardo Nunes. Os Estados Unidos e alguns países da Europa, por exemplo, possuem hidrovias regionais, interligando cidades. Projetos para sistemas hidroviários urbanos, dentro de uma cidade, no entanto, são raridade no mundo.
A “infraestrutura azul” paulistana pode ser uma ótima solução, até mesmo revolucionária para os transportes na capital. Mas vai além. “Não pense que o sistema hidroviário municipal é um projeto setorial de transporte. É também, mas toda hidrovia urbana é um projeto de desenvolvimento urbano”, diz Delijaicov.

Sistema confortável e sustentável

De acordo com os especialistas que vêm elaborando a implementação do Sistema de Transporte Público Hidroviário de São Paulo (STPHSP), as embarcações utilizadas deverão ser movidas a eletricidade, para não poluir o meio ambiente. Também não haverá poluição sonora, já que os barcos serão silenciosos. As cabines deverão ser fechadas com vidro e terão ar-condicionado, proporcionando conforto aos passageiros e protegendo-os do mau cheiro. Os vidros também evitarão que se atirem objetos na água. Todos os viajantes terão de fazer os percursos sentados e os barcos maiores vão acomodar no máximo 200 pessoas, de modo que o embarque e o desembarque não demorem.
As embarcações serão controladas por robôs, com pilotos para situações de emergência. “Pode parecer estranho, mas não é algo banal, como um barco feito no quintal”, diz o professor Alexandre Delijaicov, coordenador do Grupo Metrópole Fluvial, da USP. Segundo o especialista, o preço dos veículos aquáticos é equivalente ao dos utilizados no transporte público terrestre.
Modelo na utilização do transporte hidroviário, Londres possui, atualmente, alguns barcos com acesso à internet sem fio e lanchonetes. Os roteiros feitos por eles têm vistas privilegiadas, como o trajeto entre os museus Tate Britain e Tate Modern. Apesar da importância histórica, as hidrovias londrinas passaram por um processo de abandono e foram recuperadas apenas nos anos 1960. Com a Lei 16.010/2014, espera-se que São Paulo siga o mesmo exemplo.
Isriya Paireepairit/Flickr/CreativeCommons

Quando São Paulo era navegada

Durante séculos, foi possível se deslocar pelos cursos d´água da cidade de São Paulo. No lugar onde hoje fica a Avenida Juscelino Kubitschek havia um rio por onde circulavam canoas. Até o século 19, a Rua 25 de Março recebia embarcações e a Ladeira Porto Geral tem esse nome porque já abrigou um porto. O Rio Pinheiros já foi uma rota para interligar aldeias indígenas e depois sediou regatas. O Tietê era local de recreio, com passeio em barcos por suas águas limpas e calmas, embelezadas por florestas. Em 1920, as embarcações paulistanas chegavam a 2 mil – considerando apenas as licenciadas, mas o foco nos transportes rodoviários fez esses números caírem vertiginosamente ao longo dos anos.
Em 1899 surgiu o Clube Esperia, à época voltado ao remo no então sinuoso Tietê. Outra agremiação icônica foi o Clube de Regatas Tietê, fechado em 2012 após 105 anos de funcionamento. No rio, acontecia uma famosa prova de natação, a São Paulo a Nado, com percurso de 5,5 quilômetros entre a Ponte Vila Maria e a Ponte das Bandeiras. A travessia foi realizada entre 1924 e 1944, quando a poluição começava a deteriorar aquelas águas.
Assim como ocorre com o Rio Pinheiros, o trecho paulistano do Tietê passa por um canal artificial, construído dentro do chamado leito maior do rio, que se estende pela grande área antes alagada durante as cheias. De 1937 a 1958, o Pinheiros teve seu curso revertido para geração de energia – deixou de ser um afluente do Tietê para desaguar na represa Billings.
“Invadimos, loteamos e vendemos o leito maior dos dois rios. Não faço juízo de valor, aconteceu e a cidade não vai retroceder”, diz o professor Alexandre Delijaicov, sobre as margens aterradas e hoje ocupadas por avenidas. Segundo ele, mais da metade da metrópole ocupa, atualmente, o leito maior dos rios. Dois exemplos são a Vila Guilherme e a parte baixa da Vila Maria, que estão no leito maior do Tietê, e o Jardim Europa, no Pinheiros.
Fontes: Alexandre Delijaicov, vereador Ricardo Nunes,  Clube Esperia e livro Tietê, presente e futuro

Arthur Busin, atleta do Clube Esperia, salta de trampolim no Tietê em 1927
Acervo Histórico Clube Esperia
Sede do Clube Esperia, em 1910
Acervo Histórico Clube Esperia
Regata mista no Rio Tietê, na década de 1910
Acervo Histórico Clube Esperia

Segurança pública e violência: R$ 256 bilhões anuais (no lixo ?)


Publicado por Luiz Flávio Gomes - 3 dias atrás
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01. A segurança pública e a violência custam ao Brasil R$ 256 bilhões por ano (5,4% do PIB) (levantamento do 8º Anuário Brasileiro do Fórum de Segurança Pública). A perda do capital humano (57 mil mortes anuais) significa R$ 114 bilhões. O custo governamental na área é de 1,26% do PIB (um dos mais altos do mundo e, ao mesmo tempo, um dos mais ineficientes e equivocados), porque continua altíssima a taxa de homicídios (29 para cada 100 mil pessoas). A Europa gasta com segurança 1,3% do PIB e tem taxa de 1,1 homicídio para cada 100 mil pessoas; a elite do capitalismo distributivo (países escandinavos ou em processo de escandinavização: Suécia, Dinamarca, Finlândia, Islândia, Noruega, Alemanha, Bélgica, Austrália, Nova Zelândia, Canadá, Japão, Cingapura, Coreia do Sul etc.) gasta 1% do PIB e tem 1/100 mil; os EUA gastam 1% e têm taxa de 4,7/100 mil; Chile gasta 0,8% e tem taxa de 3,1/100 mil; Brasil: 1,26% com taxa de 29/100 mil.
02. Os países menos violentos do mundo têm Gini (índice que mede a desigualdade – quanto mais perto de 0 mais igualdade, quais mais perto de 1 mais desigualdade) em torno de 0,30; EUA: 0,45; Brasil: 0,51. Somos um dos 10 países mais desiguais do planeta (isso significa capitalismo altamente selvagem e concentrador). As nações menos violentas estão no 1º grupo do IDH (índice de desenvolvimento humano), com 47 países; o Brasil está no segundo grupo, na colocação 79. Depois de 514 anos de existência construímos uma sociedade marcada pela violência epidêmica, corrupção endêmica, desigualdade obscênica, escolaridade anêmica (¾ dos brasileiros são analfabetos funcionais – veja Inaf) e fraqueza institucional sistêmica.
03. Como chegamos nesses indecentes patamares (campeão mundial em homicídios, em números absolutos – 57 mil óbitos por ano; 12º país mais violento do planeta; 1º em violência contra professores; 7º em violência contra mulheres; 16 cidades das 50 mais violentas do mundo; campeão mundial na violência ligada a futebol; 3º país na violência no trânsito, em números absolutos etc.? De 1.500 a 1529 (colônia, impérios e República Velha) a sociedade brasileira foi organizada para 1% de consumidores (o resto da população foi ignorado); de 1930 a 2002 (de Getúlio a FHC, chegamos a 20% de consumidores; o resto era puro resto); de 2002 a 2010 (Lula) alcançamos 40% de consumidores efetivos (20% da classe C mais estável, antes inexistente), 30% de vulneráveis (classe C vulnerável, que pode subir ou baixar conforme a situação socioeconômica do país) + 30% de pobres, indigentes e famintos (muitos, beneficiários do bolsa família). De 2011 para ca (Dilma) luta-se com grandes desacertos e dificuldades (baixo preço das commodities, câmbio descontrolado, diminuição do crescimento da China, inflação, corrupção, PIB baixo etc.) para que sejam mantidos os padrões consumistas da era Lula.
04. Num país com desigualdade obscênica, escolaridade, civilidade e cidadania anêmicas, fraqueza institucional sistêmica e corrupção endêmica (a Petrobras constitui somente a ponta desse iceberg secular, comandado pelo maior crime organizado do país, de natureza político-empresarial), a violência só poderia ser epidêmica (como efetivamente é: 29 homicídios/100 mil pessoas). Há várias pontes que podem ligar os problemas com as soluções. Uma delas (seguida pela Europa e, sobretudo, pelos países escandinavos ou em processo de escandinavização) é constituída de 4 pistas (no mesmo sentido): a) prioridade para a prevenção (no lugar da repressão), b) certeza do castigo (ou seja: alto nível do império da lei), c) excelente patamar de vida (estado de bem estar-social) e d) educação em período integral de alta qualidade para todos.
05. O Brasil nunca seguiu essa ponte. Sempre pegou o caminho errado e preferiu sua sombra, também constituída de 4 pistas (na mesma direção): repressão (no lugar da prevenção), edição contínua de novas leis penais mais duras (editamos, de 1940 a 2014, 157 leis penais, que nunca diminuíram a criminalidade), genocídio estatal (política de extermínio dos jovens – 2500 mortes por ano – e dos próprios policiais – cerca de 400 óbitos por ano) e encarceramento massivo aloprado (3º país com maior população carcerária do planeta – 711 mil presos; dos quais, 40% provisórios). O custo dessa política completamente errada (e errada porque a criminalidade nunca diminuiu), para o governo, é de 1,26% do PIB.
06. Quais são nossos principais desafios? Se o humano é ou deve ser um animal domesticado (Nietzsche), impõe-se domesticar melhor o animal brasileiro, para que seja profundamente alterada a cultura da corrupção, da violência, do “Você sabe com quem está falando” e do jeitinho. Tudo isso se combate com cidadania e ética. Urge ainda reduzir a extrema desigualdade entre os brasileiros (criando políticas de educação financiada, sobretudo, pelas grandes fortunas). Tudo passa, como se vê, pela educação, que gera conhecimento, ciência, tecnologia, ética e cidadania. A cidadania, por sua vez, significa civilidade, respeito às pessoas, aos animais, à natureza e ao bom uso da tecnologia, solidariedade, altruísmo, compreensão, cooperativismo e, sobretudo, respeito ao império da lei igual para todos. Enquanto não cumprirmos todos os nossos deveres de casa e ficarmos somente falando dos nossos direitos, a perspectiva futura para o Brasil coincide com o pior cenário de todos os mundos.
Luiz Flávio Gomes
Professor
Jurista e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). [ assessoria de comunicação e imprensa +55 11 991697674 [agenda de palestras e entrevistas] ]