O GLOBO - 05/03
Uma das principais preocupações dos pais modernos, e dos avôs, é o uso que a geração de Alice, minha neta, está fazendo do iPad
Na coluna anterior, tratei do tema abordado pelo livro “Foco — A atenção e seu papel fundamental para o sucesso”, do psicólogo americano Daniel Goleman. O meu “foco” agora são as crianças e os jovens, ou melhor, o que as ferramentas digitais estão fazendo com sua atenção. Uma das principais preocupações dos pais modernos — e dos avôs — é o uso que a geração de Alice, minha neta, está fazendo do iPad. Ela tem pouco mais de 4 anos e domina os segredos dessa máquina que, para mim, é inexpugnável. Não entende que possa existir gente que não entende o que ela entende tão bem. É capaz de permanecer horas seguidas diante de uma dessas telinhas, sem se levantar do sofá. Quando cansa, muda de posição, deita e até de cabeça pra baixo fica. O remédio foi conscientizá-la de que era preciso restringir o uso. Não deve ser a única de sua tribo.
Mas e Eric? Com um ano e cinco meses, sem ainda falar e mal começando a andar, já sabe qual botão apertar com seu dedinho indicador para ligar e que comando acionar para obter esse ou aquele joguinho. Aí para de chorar, de pedir colo, de incomodar. Se deixar, fica como a irmã — fascinado, hipnotizado, anestesiado. Para os pais em geral, nada mais cômodo. Ou confortável, para usar a palavra que Alice acaba de descobrir e que serve para tudo (“pode entrar na piscina que a água tá confortável”). Não existe o mundo aqui fora. Toda atenção se concentra ali. Aquele é o único foco — exagerado, prejudicial.
“As crianças de hoje”, informa Goleman, “estão mais conectadas a máquinas e menos a pessoas como jamais aconteceu na história da humanidade. Já vi um garoto escrevendo uma mensagem enquanto andava de bicicleta”. De acordo com uma pesquisa, o jovem médio americano recebe e envia mais de cem mensagens de texto por dia, cerca de dez a cada hora acordado. E, no entanto, a interação pessoal é indispensável. “O circuito social e emocional do cérebro de uma criança aprende através do contato e das conversas com os que encontra durante o dia.” Ou seja, horas passadas com gente são mais úteis do que diante de uma tela digitalizada.
Por um lado, é admirável a capacidade que os adolescentes têm de receber diversos estímulos e processá-los ao mesmo tempo. Enquanto ouvem música nos fones, mantêm a TV ligada, postam mensagens, enviam torpedos, acionam o Instagram. Por outro lado, a prática tem um custo: a dispersão e a preguiça mental retardam o raciocínio, privilegiando o reflexo em vez da reflexão. A principal vítima é o hábito da leitura. Uma professora contou sua experiência, que talvez não seja única. Um livro que há cinco anos fazia sucesso numa turma é hoje considerado difícil. Os alunos alegam que gastam muito tempo para ler uma página. Segundo ela, a atenção deles agora só suporta textos “curtos e picotados”. Livros, nem pensar.
Uma das principais preocupações dos pais modernos, e dos avôs, é o uso que a geração de Alice, minha neta, está fazendo do iPad
Na coluna anterior, tratei do tema abordado pelo livro “Foco — A atenção e seu papel fundamental para o sucesso”, do psicólogo americano Daniel Goleman. O meu “foco” agora são as crianças e os jovens, ou melhor, o que as ferramentas digitais estão fazendo com sua atenção. Uma das principais preocupações dos pais modernos — e dos avôs — é o uso que a geração de Alice, minha neta, está fazendo do iPad. Ela tem pouco mais de 4 anos e domina os segredos dessa máquina que, para mim, é inexpugnável. Não entende que possa existir gente que não entende o que ela entende tão bem. É capaz de permanecer horas seguidas diante de uma dessas telinhas, sem se levantar do sofá. Quando cansa, muda de posição, deita e até de cabeça pra baixo fica. O remédio foi conscientizá-la de que era preciso restringir o uso. Não deve ser a única de sua tribo.
Mas e Eric? Com um ano e cinco meses, sem ainda falar e mal começando a andar, já sabe qual botão apertar com seu dedinho indicador para ligar e que comando acionar para obter esse ou aquele joguinho. Aí para de chorar, de pedir colo, de incomodar. Se deixar, fica como a irmã — fascinado, hipnotizado, anestesiado. Para os pais em geral, nada mais cômodo. Ou confortável, para usar a palavra que Alice acaba de descobrir e que serve para tudo (“pode entrar na piscina que a água tá confortável”). Não existe o mundo aqui fora. Toda atenção se concentra ali. Aquele é o único foco — exagerado, prejudicial.
“As crianças de hoje”, informa Goleman, “estão mais conectadas a máquinas e menos a pessoas como jamais aconteceu na história da humanidade. Já vi um garoto escrevendo uma mensagem enquanto andava de bicicleta”. De acordo com uma pesquisa, o jovem médio americano recebe e envia mais de cem mensagens de texto por dia, cerca de dez a cada hora acordado. E, no entanto, a interação pessoal é indispensável. “O circuito social e emocional do cérebro de uma criança aprende através do contato e das conversas com os que encontra durante o dia.” Ou seja, horas passadas com gente são mais úteis do que diante de uma tela digitalizada.
Por um lado, é admirável a capacidade que os adolescentes têm de receber diversos estímulos e processá-los ao mesmo tempo. Enquanto ouvem música nos fones, mantêm a TV ligada, postam mensagens, enviam torpedos, acionam o Instagram. Por outro lado, a prática tem um custo: a dispersão e a preguiça mental retardam o raciocínio, privilegiando o reflexo em vez da reflexão. A principal vítima é o hábito da leitura. Uma professora contou sua experiência, que talvez não seja única. Um livro que há cinco anos fazia sucesso numa turma é hoje considerado difícil. Os alunos alegam que gastam muito tempo para ler uma página. Segundo ela, a atenção deles agora só suporta textos “curtos e picotados”. Livros, nem pensar.