sexta-feira, 13 de setembro de 2013

‘Garantista’, Celso de Mello foi severo no julgamento do mensalão

Eduardo Bresciani e Felipe Recondo - O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA - O autor do último voto dessa fase do julgamento do mensalão é um ministro que defende o amplo direito de defesa, mas foi dos mais severos julgadores dos réus do processo. Há 24 anos no Supremo Tribunal Federal e há pouco mais de seis no posto de decano - o mais antigo integrante da Corte - Celso de Mello já desempenha o papel de mediador de conflitos entre colegas. Agora, terá também o papel de voto de Minerva em uma das decisões mais difíceis da história recente do STF.
Celso de Mello já defendeu admissão de embargos no início do caso - André Dusek/Estadão
André Dusek/Estadão
Celso de Mello já defendeu admissão de embargos no início do caso
No próprio julgamento do processo, Celso de Mello defendeu a admissibilidade dos embargos infringentes, recurso previsto quando um réu é condenado pela maioria do Supremo, mas tem pelo menos o voto de quatro ministros pela absolvição. Com o quórum completo, a Corte conta com 11 integrantes.
"O STF , em normas que ainda vigem, reconhece a possibilidade de impugnação de decisões do plenário dessa corte (...) não apenas em embargos de declaração mas também embargos infringentes do julgado, que se qualificam como recurso ordinário (...) na medida em que permitem a rediscussão de matéria de fato e a reavaliação da própria prova penal (...) E com uma característica: a mudança de relatoria", afirmou o decano em 2 de agosto de 2012.
Durante o julgamento, Celso de Mello se mostrou dos mais severos juízes do processo, ao votar pela condenação dos acusados de envolvimento no esquema de compra de votos. Partiu dele a crítica mais aguda ao mensalão e, especialmente, ao ex-ministro José Dirceu, apontado como o chefe da quadrilha.
"Nada mais ofensivo e transgressor à paz pública do que a formação de quadrilha no núcleo mais íntimo e elevado de um dos Poderes da República com o objetivo de obter, mediante perpetração de outros crimes, o domínio do aparelho de Estado e a submissão inconstitucional do Parlamento aos desígnios criminosos de um grupo que desejava controlar o poder, quaisquer que fossem os meios utilizados, ainda que vulneradores da própria legislação criminal", afirmou.
Garantista. Em mais de duas décadas no Supremo, Celso de Mello sempre se mostrou um enfático defensor das garantias dos acusados e do amplo direito de defesa. Por isso, seus votos no julgamento do mensalão surpreenderam advogados. Alguns ministros chegam a dizer, reservadamente, que o decano tem preconceito em relação ao PT.
Indicado pelo ex-presidente José Sarney (PMDB-AP), ele foi procurador-geral da República antes de ser indicado à Corte, em 1989. De personalidade reservada, sofreu pressões de lado a lado nas últimas semanas.
O ministro Gilmar Mendes, nos últimos dias, passou horas no gabinete do decano tentando convencê-lo a mudar de opinião. Celso de Mello também se reuniu com Ricardo Lewandowski, favorável aos embargos. O autor do voto de desempate, que pouco usa a internet e não costuma atender telefone celular, estará sob pressão. Mas confrontado com a situação, afirmou: "Eu conheço (minha responsabilidade)".

País do faz de conta - ZUENIR VENTURA


O GLOBO - 24/04
O Brasil é mais impressionista do que um quadro de Monet. Está sempre dando a impressão de uma coisa, quando é outra. Como escreveu Merval Pereira ontem, citando o ministro Joaquim Barbosa, é o nosso jeito de "não fazer as coisas fingindo que está fazendo". É o país do faz de conta. Em certas áreas então, como na Justiça, a realidade é uma ilusão de ótica mais que enganadora. O nosso Código Penal, por exemplo, não permite que o "cumprimento das penas privativas de liberdade" seja superior a 30 anos, mas isso não impede que as pessoas sejam condenadas a 50, 100 anos de prisão e até mais. O resultado na prática é que, além da clássica forma de impunidade, existe outra, essa original: condena-se com rigor excessivo, mas se pune com tolerância máxima, quando se pune. O nosso mais famoso bandido, Fernandinho Beira-Mar, foi condenado recentemente a 80 anos, e suas penas somadas chegam a 200 anos de reclusão. Mas ele vai cumprir quanto do que deve? Com certeza, nem 10%, considerando-se os benefícios que em geral são concedidos.

O caso mais recente é o do júri do Massacre de Carandiru: dos 26 policiais julgados, 23 receberam sentenças de 156 anos de prisão pela morte de 13 dos 111 detentos daquela penitenciária de triste memória. A pena impressionou os jornais estrangeiros. Que país rigoroso! Até a Anistia Internacional celebrou o resultado, recebendo-o como um sinal de que no Brasil a "Justiça não irá admitir abusos cometidos pela Estado contra a População carcerária".

Claro que a condenação foi um dado positivo, inclusive porque contraria o pensamento bárbaro de parte da população, para quem "bandido bom é bandido morto". Mas não se pode esquecer que depois de aguardarem o julgamento em liberdade por 20 anos, esses 23 réus ainda vão permanecer livres por muito tempo. Há quem acredite que nem presos eles serão, pois haverá apelações e recursos a instâncias superiores. "Só para chegar ao Supremo", calcula o diretor da ONG Conectas, Marcos Puchs, "esse caso levará dez anos". Sem falar que a demora pode levar à prescrição dos crimes. Moral da história: em certos casos, a presunção de inocência funciona em favor da impunidade até quando as provas já condenaram.

O governo já fez passar na Câmara, faltando o Senado, um projeto que seria para evitar a proliferação de partidos. De fato os temos demais - de aluguel, de venda, de fachada. Mas, fazendo de conta que é para moralizar a política, tudo indica que o expediente tem um alvo certo: Marina Silva. Sua pré-candidatura, segundo as pesquisas, é a que mais ameaça a de Dilma.


quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Noite de confrades, da Coluna da Sonia Racy


12.setembro.2013 | 1:06
Foto: Guilherme Gonçalves/ABL
“Não estamos diante de uma elite que sabe e de um povo que desconhece. O momento é de respeito à pluralidade das identidades culturais e de reconstrução das instituições, para que elas captem e representem o sentimento e os novos interesses da população. Só assim poderemos manter acesa a chama da liberdade, do respeito à representação e da autoridade legítima e evitar que formas abertas ou disfarçadas de autoritarismo e violência ocupem a cena”.
Foi assim, para um lotado Salão Nobre do Petit Trianon, que Fernando Henrique Cardoso encerrou discurso – de exata uma hora – de posse na ABL, anteontem, no Rio. Para ouvidos e olhos atentos dos mais de 200 convidados, entre os quais Alckmin, Aécio, Serra, Marco Aurélio Mello, Henrique Eduardo Alves e Gilberto Gil. Foi, aliás, a primeira vez que o cantor prestigiou uma posse na Academia.
Ausências mais sentidas? Eduardo Paes e Sérgio Cabral – que cancelaram a presença a poucos minutos do início do evento e fizeram o staff da ABL correr para tirar seus nomes das saudações iniciais da cerimônia. Mas já era tarde para desmontar todo o aparato de segurança montado pela PM na porta da Casa de Machado de Assis. Temendo manifestação contra os representantes do Executivo do Rio, a tropa de choque da Polícia fechou a rua que dá acesso à ABL.
Os “imortais” foram obrigados a desembarcar de seus carros a cerca de um quarteirão da entrada principal e caminhar fardados até a sede, levando, ao pescoço, o valioso colar dourado dos acadêmicos. “Para garantir a segurança de alguns, vocês estão colocando em risco a segurança de outros, como eu”, reclamou o “imortal” Tarcísio Padilha, de 85 anos, a um dos policiais.
FHC já falava há meia hora quando o presidente da Câmara dos Deputados chegou – coincidência ou não, no momento em que o ex-presidente iniciou o trecho mais político de sua fala. “O corporativismo que renasce e passa do plano político ao social é o cupim da nossa democracia. Se somarmos impulsos populistas, temos um sistema político enfermo.”
“Um discurso de estadista. Ele falou dos últimos acontecimentos sem paixão, mas com profundidade”, disse Ellen Gracie. A ex-ministra do STF chegou ao Salão Nobre do Petit Trianon quando todas as cadeiras já estavam ocupadas, e houve corre-corre para acomodá-la. “É a popularidade do homenageado”, brincou.
Na outra ponta do salão, Serra encontrou um lugar vago embaixo da caixa de som. Ficou ali por dez minutos, até que foi socorrido e acomodado em uma das cadeiras reservadas aos imortais.
No coquetel, copo de uísque na mão, Marco Aurélio Mello foi abordado por uma senhora, que cobrou o julgamento do chamado mensalão mineiro, que envolve políticos do PSDB. “Quero saber se no mensalão de Minas Gerais vai ter esse fuzuê todo, a opinião pública toda em cima, porque querem matar o PT”, afirmou a senhora, dizendo-se fã de Lula e Dilma. “A opinião pública não influencia o juiz. A senhora certamente não fecha os olhos para desvio de conduta. Temos de aguardar e confiar no Judiciário”, respondeu o ministro – salvo por outro convidado que pedia foto a seu lado.
Enquanto FHC recebia os cumprimentos, sua namorada, Patrícia Kundrát, cuidava para que o mais novo “imortal” não ficasse desamparado. Chegou a parar um garçom e pediu que levasse champanhe e água ao “presidente”. Sorria, agradecia os elogios e posava para as fotos, num longo azul-petróleo.
Embora tenha um sorriso tatuado no braço, Patrícia não sorria o tempo todo. Fechava a cara sempre que assediada por jornalistas. “Imprensa, não. Obrigada, mas imprensa, não”, repetia. /THAIS ARBEX