quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Desconto para todos, in O Globo


O governo federal tem declarado que a tarifa de eletricidade precisa ser reduzida e diz que dará sua contribuição pela eliminação de encargos e diminuição de impostos, referindo-se ao PIS/Cofins. Nunca houve um esforço coordenado de governo para reduzir a carga tributária sobre o serviço público de energia elétrica. Isso precisa ser valorizado e, se o esforço desse governo for exitoso, comemorado com destaque porque, na verdade, a carga tributária atual de 45% sobre a conta de luz foi construída pelo acúmulo de 36 tributos e encargos ao longo de décadas.
Sem transparência para a população, quase metade do que pagamos na tarifa (45% da conta de luz) vai para os cofres do governo, distanciando-se da relação com a geração (25%), transmissão (6%) ou distribuição de energia (24%).
Rubricas como PIS/Cofins, CCC e RGR são candidatas perfeitas para dar início a uma era de mais racionalidade econômica no que se refere à carga tributária sobre o setor elétrico. No caso do PIS/Cofins, que representa cerca de 8% da tarifa, o governo na verdade devolveria ao consumidor de energia, pelo menos parcialmente, custo extra que foi imposto, em 2003, quando se produziu um aumento tarifário efetivo próximo de 4%.
Na Conta de Consumo de Combustível (CCC, cerca de 3% da tarifa), o custo deveria diminuir com o tempo. Isso porque a CCC é um subsídio aos sistemas isolados da região Norte. Começa a ficar muito difícil justificar esse encargo se considerarmos que o consumidor tem arcado, em sua conta de luz, com o custo das linhas de transmissão para conectar tais sistemas.
No caso da Reserva Global de Reversão (1,3% da tarifa), a desoneração é quase uma obrigação porque esse encargo já perdeu sua razão de existir. O governo continua cobrando sem necessidade. O Fundo RGR acumula R$ 19 bilhões, que podem ser usados como o governo quiser.
O único sinal preocupante no discurso governamental tem a ver com os beneficiários da desoneração: grandes indústrias ou grandes consumidores de energia. Não faria sentido deixar de fora da desoneração as classes residencial e comercial de consumidores de energia. O governo poderia reduzir a conta de luz para todos, igualmente.
Claudio J. D. Sales é presidente do Instituto Acende Brasil

A batalha dos móveis contra a invasão chinesa


Coluna Econômica - 29/08/2012 Luis Nassif

Como enfrentar a invasão chinesa carregando nas costas o custo Brasil, o câmbio, os juros?
A experiência da Abimo (Associação Brasileira das Indústrias de Móveis de Alta Decoração) é um belo exemplo de luta de pequenos pela sobrevivência em ambiente inóspito.
É o que se depreende da apresentação de seu presidente, Michel Otte, no Fórum Brasilianas.
O setor tem 98% de micro e pequenas empresas; apenas 2% de grandes empresas. Emprega 260 mil pessoas, 191 mil dos quais em empresas que utilizam a madeira - que compõem 85% do setor. Os móveis de metal são trabalhados por 8% das empresas e o de colchões por 2%.
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De 2010 para cá, o saldo comercial despencou de R$ 213 milhões para R$ 28 milhões. Este ano, o setor poderá registrar déficit. A invasão é fundamentalmente chinesa.
Em 2010, o setor importou US$ 221 milhões; em 2011 passou para US$ 319 milhões; até julho deste ano, US$ 368 milhões. Desse total, US$ 140 milhões vieram da China; US$ 38 milhões dos Estados Unidos e US$ 21 milhões da Alemanha.
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Quem esperar sentado mudanças no ambiente econômico desaparecerão. Por isso o setor decidiu reagir com as armas de que dispõe.
A competição com o exterior passou a se dar em duas frentes.
Na primeira, na busca de excelência em custo. Na segunda, buscando a diferenciação, prática que vem sendo estimulada pelo próprio governo.
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Otte admite que o país deixou definitivamente de ter um custo competitivo. 85% da indústria moveleira do país trabalha com madeira maciça. O grande concorrente é o Vietnã. Em 2005, o custo médio dos salários era de US$ 195 no chão da fábrica; no Vietnã, de US$ 110 a 120. Em 2012, o custo médio brasileiro é de US$ 555 contra US$ 160 do Vietnã.
Com encargos, o custo brasileiro salta para a média de US$ 1.200, contra US$ 180 do Vietnã. Não há reforma tributária ou desoneração que resolva.
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Até agora, parte da indústria brasileira foi poupada devido aos custos de logística (para transportar móveis). A segunda barreira de entrada é a necessidade de customização para o cliente, que complica a situação para a indústria de exportação.
Aumento de custos para produtos mais simples, agregação de valor em produtos mais sofisticados, tiveram reflexos nas exportações. Em volume exportado, houve queda. Mas antes os containers transportavam móveis de 10 mil dólares; hoje em dia, de 70 mil dólares.
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Mesmo essa estratégia de diferenciação tem seus limites, diz Otto. A diferença de custo tem levado cada vez mais empresas a pensar em produzir o móvel fora, na Ásia.
No plano Brasil Maior, o setor considerou positiva a mudança de tributação do INSS – que passou a incidir sobre o faturamento.
Mas os avanços terão que se dar em outras áreas previstas no plano. A saída será estimular indústrias a investir em tecnologia, novos materiais, designer e, principalmente, foco: apesar do robusto mercado interno, não há como pretender crescer em todos os segmentos de mercado.
Recentemente, a Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos) fechou seu escritório na China: empresários que iam prospectar o mercado chinês acabavam aproveitando a estada para conseguir representações de empresas chinesas.

terça-feira, 28 de agosto de 2012

As lições não aprendidas do mensalão


Coluna Econômica - 28/08/2012 Nassif

Na sua coluna de ontem, no jornal O Valor, o respeitado Renato Janine Ribeiro publica carta enviada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Nela, FHC questiona afirmação de Janine sobre a cooptação de votos para a aprovação  da emenda da reeleição.  “Esta existiu, diz, mas por parte de políticos locais”.
Apenas constata que fez o mesmo do mesmo. Apenas, de uma forma mais “profissional”.
É importante o seu depoimento. E lembro aos leitores que o eixo de meu artigo estava na tese de que as questões de corrupção, que pareciam tão claras quando o lado do bem se opunha à ditadura, se transformaram num cipoal desde que PT e PSDB se digladiam”, conclui Janine.
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Tanto no mensalão como na votação da emenda da reeleição, o objetivo era a cooptação de parlamentares. Apenas os métodos foram diferentes.
No período FHC, a cooptação se deu através das emendas parlamentares, prática inaugurada no seu governo.
Cada emenda envolve três tipos de interesse: do parlamentar que a propôs, da empresa que será beneficiada com ela e do governo federal, a quem cabe a sua liberação.
Havia, então, uma triangulação.
  1. Os operadores do governo acertavam com os governadores o apoio da sua bancada.
  2. Em seguida, liberavam a emenda.
  3. O dinheiro chegava na ponta e o governador (e a empreiteira) fazia o acerto com seus deputados.
Esse mesmo modelo foi aplicado para derrotar o ex-presidente Itamar Franco na convenção do PMDB que pretendia lança-lo como candidato à presidência da República. A operação foi articulada pelo então Ministro dos Transportes de FHC, Eliseu Padilha.
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O chamado “mensalão” foi fruto do amadorismo inicial do PT.
FHC havia consagrado uma tecnologia de governabilidade apoiando o PSDB em um grande partido, o PFL, O PT decidiu fortalecer pequenos partidos. E o pacto passava por bancar os custos de campanha dos parlamentares. Deu no que deu.
Depois do escândalo, o PT fechou apoio do PMDB, aproximou-se do candidato a partido grande PSDB e passou a se valer da metodologia das emendas parlamentares, tal e qual o governo FHC.
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Agora se tem os dois principais partidos do país – PT e PSDB – recorrendo a métodos de cooptação que precisam ser revistos. Esse mesmo modelo é aplicado em Brasília e em São Paulo.
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Durante algum tempo justificou-se esse modelo. O país iniciava o aprendizado democrático e a questão da governabilidade era relevante, especialmente depois de um governo (José Sarney) que andou toda sua gestão na corda bamba e outro (Fernando Collor) que perdeu o mandato.
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Mas já é hora de se aprimorar a democracia brasileira. Ao tentar tirar casquinha da situação, FHC não colabora para esse aprimoramento. Nem Lula, ao minimizar o episódio.
Há um modelo imperfeito, que torna os governos reféns e, ao mesmo tempo, cooptadores de partidos políticos, assim como os parlamentares reféns dos financiadores de campanha.
O episódio será positivo se ajudar a deflagrar uma ampla discussão sobre o modelo político, a formação de partidos, o financiamento privado de campanha, a questão das emendas parlamentares.  Se usado oportunisticamente, o país não terá nada a ganhar com o episódio.