quarta-feira, 18 de julho de 2012

Sem fôlego para correr


18 de julho de 2012 | 3h 07
Rolf Kuntz - O Estado de S.Paulo
Ninguém se iluda: o Fundo Monetário Internacional (FMI) é muito menos otimista em relação ao Brasil e a outros emergentes do que parece indicar, à primeira vista, seu novo estudo sobre as perspectivas globais. O relatório destaca a desaceleração das economias brasileira, indiana e chinesa e atribui esse efeito, em parte, à crise internacional e às políticas de ajuste. Mas o recado importante vem depois. Emergentes cresceram acima da tendência histórica na última década, em parte graças à expansão do crédito e ao desenvolvimento financeiro. Mas seu crescimento potencial pode ser menor que o esperado. Nesse caso, seu desempenho será mais fraco no médio prazo. O documento ressalta, ainda, os perigos para a estabilidade financeira, num ambiente de baixo crescimento global e muita aversão ao risco. É uma herança deixada por vários anos de rápido aumento do crédito.
O alerta sobre o risco financeiro parece valer para todos os grandes emergentes, incluída a China, onde houve sinais de formação de uma bolha de crédito nos últimos anos. Mas a observação sobre o crescimento potencial parece aplicar-se principalmente ao Brasil, país com uma taxa de poupança em torno de 16% do Produto Interno Bruto (PIB), investimento inferior a 20% e baixo padrão educacional. A última novidade sobre as aventuras do país mal-educado surgiu nesta segunda-feira: 38% dos estudantes do ensino superior têm dificuldades graves de leitura e de escrita, segundo pesquisa realizada pelo Instituto Paulo Montenegro em parceria com a ONG Ação Educativa. Desde 2001 as duas entidades têm produzido um Indicador de Analfabetismo Funcional.
A referência ao crescimento potencial é muito mais relevante, no caso do Brasil, do que as projeções de expansão econômica de 2,5% neste ano e 4,6% no próximo. A estimativa do FMI para 2012 é igual à do Banco Central e superior à mediana das previsões coletadas pelo próprio BC na última pesquisa Focus, 1,9%. Essas projeções caíram por 10 semanas consecutivas, até agora, e têm acompanhado a piora de vários indicadores produzidos pelo governo e por entidades do setor privado.
O governo promete resultados melhores neste semestre e um crescimento superior a 4% em 2013. Mas qual será o desempenho econômico possível nos anos seguintes? A resposta depende do alcance da política econômica, por enquanto voltada principalmente para objetivos limitados.
A Fundação Getúlio Vargas divulgou em fevereiro, na revista Conjuntura Econômica, um artigo sobre o produto potencial da economia brasileira. O cálculo pode ser complicado e inseguro, mas ninguém pode simplesmente menosprezar o problema. Nenhuma política voluntarista será sustentável por muito tempo, nem isenta de custos muito altos. Isso é comprovado amplamente pela experiência brasileira. Mais cedo ou mais tarde - frequentemente mais cedo - acaba-se batendo num limite. A consequência pode ser inflação ou crise no balanço de pagamentos ou uma combinação devastadora dos dois efeitos.
A análise resumida no artigo da Conjuntura Econômica indicou um crescimento potencial na faixa de 3,5% a 4% ao ano. Pode-se avançar com maior velocidade durante algum tempo, mas algum desajuste logo tornará necessária uma freada. Em anos recentes, períodos de rápida expansão foram interrompidos por fortes pressões inflacionárias e pela ação corretiva do BC. Fases de intenso crescimento da demanda interna resultaram também na deterioração do saldo comercial. As compras de produtos estrangeiros tendem a crescer em fase de prosperidade econômica, mas, no caso brasileiro, o descompasso entre importações e exportações tem sido muito sensível. Isso ocorreu antes da crise de 2008 e voltou a ocorrer nos últimos dois anos.
Desta vez, a causa principal do descompasso ficou mais evidente: a indústria brasileira tem sido incapaz de competir tanto no exterior quanto no mercado interno. A valorização do dólar, mais de 20% desde o último trimestre do ano passado, foi insuficiente para mudar o quadro. O problema ultrapassa amplamente a questão cambial. Também vai muito além das carências de produtividade, qualidade e inovação das empresas. As principais ineficiências estão fora dos muros das fábricas e das cercas das fazendas. Se esse é o quadro, é um erro insistir numa terapia de estímulos ao consumo e benefícios fiscais de alcance limitado.
Crescimento potencial e capacidade competitiva são denominações do mesmo problema. Além dos economistas do FMI, muitos outros analistas já perceberam os entraves da economia brasileira. Daí o falatório, recorrente nos últimos tempos, sobre a redução das expectativas, no exterior, em relação ao B dos Brics. Mas isso é conversa de quem ainda se preocupa com o PIB. A presidente Dilma Rousseff parece haver superado essa fase.
* JORNALISTA

Licitação fracassa e deixa mais longe fim do Minhocão


Tiago Dantas - O Estado de S.Paulo
Discutida desde 1993, a demolição do Elevado Costa e Silva, o Minhocão, ficou ainda mais distante. A gestão Gilberto Kassab (PSD) esperava que a Operação Urbana Lapa-Brás, apresentada em maio de 2010, provocasse a retirada do viaduto. A licitação que escolheria uma empresa para desenvolver o projeto, porém, fracassou. O único consórcio que se interessou pela empreitada foi desclassificado no fim do mês passado.
3,4 km de polêmicas: Kassab lançou proposta em 2010 - Helvio Romero/AE
Helvio Romero/AE
3,4 km de polêmicas: Kassab lançou proposta em 2010
O grupo formado pela multinacional CNEC-WorleyParsons e a americana Aecom, responsável por projetar as intervenções do Projeto Nova Luz, que prevê a reurbanização da cracolândia, no centro, não atingiu a pontuação mínima exigida em uma das fases do certame. Arquitetos e urbanistas acreditam que não há tempo para nova licitação ser feita até o fim do ano. A Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano diz que avalia como viabilizar os estudos necessários para fazer, por conta própria, o projeto da Lapa-Brás. "A demolição do elevado é uma das diretrizes da operação. A decisão final sobre essa intervenção específica está atrelada ao desenvolvimento de um projeto urbanístico para a área", informou, em nota.
Quem mora ou trabalha na Avenida General Olímpio da Silveira, na Água Branca, zona oeste, acha difícil que a estrutura de 3,4 km desapareça da paisagem. "São Paulo tem de ter mais ruas, não menos. Onde vão colocar todos esses carros? O elevado é útil ao trânsito", argumenta o taxista Oswaldo de Lima Carvalho, de 41 anos. "A gente se acostumou com o elevado na porta de casa. É muito bom poder dar uma corrida aqui à noite ou andar de bicicleta aos domingos. Mas isso não quer dizer que estamos contentes com o Minhocão aqui, porque durante a semana toda é um inferno", diz a professora de música Iara Bressanin, de 35, que vive há dez perto da Estação Marechal Deodoro.
Moradores reclamam que o trânsito faz barulho e suja as casas. Também dizem que a estrutura atrai moradores de rua e usuários de droga que querem se abrigar de frio e chuva.
Polêmica. Embora possa melhorar a qualidade de vida da população, a demolição do Minhocão não deve ser considerada "crucial", na opinião do urbanista Kazuo Nakano, do Instituto Polis. "Há uma tendência internacional de se desconstruir estruturas como essa." Segundo ele, criar jardim suspenso no elevado seria solução interessante.
Já para o arquiteto Valter Caldana, coordenador do curso de Arquitetura e Urbanismo do Mackenzie, o fim do Minhocão é "imprescindível". "O elevado impõe um limite à qualidade de vida. Há uma área de 700 metros dos dois lados do viaduto que é afetada." Caldana defende que a demolição não precisa estar ligada à operação urbana. Mas a proposta da Prefeitura é que, por meio da operação, a linha férrea seja enterrada entre Barra Funda e Brás, o que abriria espaço a uma nova ligação leste-oeste. Dessa forma, o Minhocão poderia ser demolido.

terça-feira, 17 de julho de 2012

Otimismo das famílias atinge 2º melhor resultado em 12 meses


Beatriz Bulla, da Agência Estado
SÃO PAULO - Desaceleração da economia nacional, descrença em uma melhora no cenário externo, rebaixamento da previsão dos analistas de expansão do PIB para 1,90%, alto nível de endividamento e sinais de que o País não está reagindo aos pacotes de estímulo apresentados pelo governo. Nenhuma das notícias recentes parece ter afetado ainda o grau de otimismo das famílias brasileiras, de acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
O Índice de Expectativa das Famílias (IEF), calculado mensalmente pelo Ipea por meio de pesquisa em 3.810 domicílios de 214 municípios espalhados por todos os Estados, mostra que, em junho, o otimismo nacional com a situação socioeconômica do Brasil subiu 1,5 ponto na comparação com maio e chegou a 68,5 pontos. O resultado é o segundo maior dos últimos 12 meses, perdendo apenas, em 0,5 ponto, para o mês de janeiro deste ano, quando o índice marcou 69 pontos. O resultado de junho deste ano é 4,4 pontos superior aos 64,1 registrados ao mesmo mês de 2011.
"No geral, há uma boa expectativa das famílias, que se sentem seguras em seus empregos e se sentem com potencial de crescer no futuro. Muitas famílias estão sem altos graus de endividamento e mantendo o emprego. Não é um endividamento solto e não é um endividamento sem emprego", disse a presidente do Ipea, Vanessa Petrelli Côrrea, explicando o otimismo nacional.
A maioria das famílias consultadas no IEF de junho (53%) afirmou não ter dívidas. Apesar de ser 0,5 ponto porcentual inferior ao resultado de maio, o indicador ainda é positivo. Em regiões do País como Centro-Oeste e o Sudeste, o número é ainda melhor. No primeiro caso, 88,8% das famílias declararam não possuir dívidas. No Sudeste, o número chega a 59,9%. Dentre os que declararam possuir dívidas, cerca de 1/3 dos entrevistados no País disseram não ter condições de quitar plenamente as dívidas. No total nacional, 69% das famílias responderam não possuir contas em atraso.
Quanto ao emprego, 80,2% das pessoas disseram se sentir seguras com a ocupação do responsável pelo domicílio. O resultado é inferior ao apresentado em maio (82,8%), mas segue alto. A expectativa de melhoria profissional do responsável pelo domicílio cresceu, passando de 39,8% em maio para 41,4% em junho.
Com emprego e sem dívidas, o momento parece propício para o consumo, de acordo com a pesquisa do Ipea. A maioria das famílias (60,2%) disse que agora é um bom momento para adquirir bens duráveis. O resultado variou negativamente 0,4 ponto porcentual com relação ao mês anterior, mas a porcentagem de famílias que disseram não considerar o momento ideal para consumir bens duráveis vem diminuindo desde setembro de 2011, quando o índice era de 41,1%, e chegou em 35,3% em junho deste ano. "Muita gente diz que não está muito endividada. E as pessoas acham que estão seguras em seu emprego. Elas consideram que ainda têm condições de consumir", disse a presidente do Ipea.
Economia e situação financeira
A expectativa das famílias para a economia nacional nos próximos 12 meses, um dos critérios usados pelo Ipea para medir o otimismo, continuou em queda. O índice passou de 66,8% de famílias que disseram acreditar que o Brasil passaria por melhores momentos em maio para 65%. Em abril, o índice marcava 68,3%. Com relação ao longo prazo, contudo, a percepção das famílias subiu em junho. Na leitura mais recente do IEF, 63% das famílias se disseram otimistas com a economia brasileira para os próximos cinco anos, ante 62% de respostas positivas registrados em maio.
A percepção sobre a situação financeira piorou em junho. Em maio, 77,8% das famílias pesquisadas indicaram estar melhor financeiramente hoje do que há um ano. Em junho, o número caiu para 75,5%. Para o próximo ano, 85,3% das famílias têm expectativas positivas sobre a situação financeira. O resultado é 0,5 ponto superior ao registrado em maio (84,8%).
Regiões
A análise por regiões mostra que o Centro-Oeste puxou o indicador de otimismo das famílias no País. A região apresentou alta de 6,5 pontos em junho ante maio, passando de 79,5 para 86,0 pontos, um salto que faz a expectativa da região ser considerada como de grande otimismo. O Sudeste, apesar de recuar 0,2 ponto no índice, é a segunda região com maior otimismo (69,9 pontos). Na sequência vêm as regiões Sul (66,8 pontos) e Nordeste (65,3 pontos). O Sul teve alta de 1,3 ponto na comparação com maio e o Nordeste recuou 0,2. O Norte do País entrou na casa do que o Ipea considera como otimismo, ao subir 3,2 pontos em junho, passando de 59,5 pontos em maio para 62,7.
Para o Ipea, resultados entre 60 e 80 pontos são considerados otimistas. Abaixo de 60 pontos, a instituição divide as respostas entre grande pessimismo (0 a 20 pontos), pessimismo (20 a 40 pontos) e moderação (40 a 60 pontos). Acima do grau de otimismo, entre 80 e 100 pontos, a expectativa das famílias é classificada como grande otimismo.