quinta-feira, 6 de outubro de 2011


Os impasses da União Europeia

Coluna Econômica - 06/10/2011
A crise europeia é tipicamente fruto da falta de estadistas no continente. Nos anos 60, a Europa do pós-guerra emergia com gigantes à frente de seus países, criando o Mercado Comum Europeu, base da futura integração econômica do continente.
Mais tarde, nos anos 90, o Acordo de Lisboa consolidou as bases da União Europeia. Haveria moeda única. Para tal, seria preciso regimes fiscais e desenvolvimento homogêneos. Criou-se, então, um fundo destinado a estimular o desenvolvimento das regiões mais atrasadas.
O vandalismo financeiro dos últimos anos levou a um vórtice de endividamento que, agora, vem cobrar a conta. É aí que se entra nas características atuais da crise.
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No fundo, toda a discussão é sobre quem paga a conta. O sistema bancário pretende que sejam aportes de países mais desenvolvidos e o sacrifício dos países endividados. Fazem parte dessa frente os presidentes do Banco Central Europeu, do Banco Mundial e parte do FMI.
Já os países – especialmente França e Alemanha – querem uma divisão da conta, na forma de perdão de parte da dívida grega – procedimento mais que usual nas negociações bancárias. Os bancos resistem, com receio de criar precedentes quando tiverem que renegociar dívidas de economias maiores, como Itália e Espanha.
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É fato claro, óbvio, indiscutível que a Grécia não tem condições de bancar as condições exigidas pelo FMI e pelos países da União Europeia. São condições leoninas, politicamente inexequíveis e economicamente ineficientes.
A meta a ser perseguida por todos é a relação dívida/PIB grego.
Vamos a alguns pequenos exemplos sobre o que pode acontecer .
1. Imagine que a dívida grega seja de 150 e o PIB grego de 100. A relação dívida/PIB é de 150%.
2. O PIB cai 5% e a dívida sobe 8% (como efeito do custo da rolagem.). O PIB cai para 95 e a dívida sobe para 151,2. Só nesse movimento (quase inercial) a relação aumenta para 159%.
3. Mais: a queda da arrecadação sempre é maior que a queda efetiva do PIB. Suponha que a arrecadação caia 10%. Significaria 10% a mais no montante da dívida (caso conseguisse empréstimos adicionais). E aí a relação dívida/PIB saltaria para 175%.
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Estou apresentando grandes números – não especificamente os números da Grécia – para demonstrar a impossibilidade de qualquer ajuste fiscal recessivo, ou qualquer saída que não contemple um imenso deságio na dívida grega.
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Vai acabar saindo, seja pela constatação da impossibilidade da Grécia pagar sua dívida, seja pelo fato de que não interessa a nenhum dos países líderes da União Europeia romper os laços de solidariedade continental. A Alemanha tem uma economia sólida. Mas sem a União Europeia, sem nenhuma chance de competir com os Estados Unidos ou os gigantes asiáticos.
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Bündchen também discrimina os homens



Na Folha de S. Paulo, 5/10/2011
*Fausto Rodrigues de Lima, Promotor de Justiça do Distrito Federal
Para a campanha referida, o marido ideal precisa ser o provedor; caso contrário, não pode ter uma mulher linda e disponível para o sexo
Para gastar todo o dinheiro do marido e conseguir sua compreensão, a mulher brasileira precisa lhe conceder sexo. O ensinamento de uma campanha da lingerie Hope, protagonizada por Gisele Bündchen, causou justa indignação a ponto de aSecretaria de Políticas para as mulheres pedir sua suspensão.
Essa e outras manifestações sexistas escamoteiam faceta pouca explorada: o homem também é discriminado. Ora, para a campanha referida, o marido ideal precisa ser o provedor; caso contrário, não pode ter uma mulher linda e disponível para o sexo. Como um cão no cio, necessita de sexo a todo momento e a todo custo. Não deve se importar com a satisfação da parceira; basta que ela finja prazer.
Se analisarmos comerciais dirigidos aos homens, veremos que, nessas peças, eles são tratados como crianças abobalhadas. Os de cerveja os perfilam como tipos pouco inteligentes, fazendo (e rindo de) piadas idiotas, e com um só objetivo na vida: sexo. Um recente comercial da Volkswagen mostra um pai com vergonha do filho pois o menino, além de não surfar ou tocar guitarra, ainda não “pegou” uma garota.
Como todo projeto de dominação e preconceito, a discriminação de gênero, embora baseada numa suposta inferioridade feminina, atinge a todos, porque cria regras “naturais” para o comportamento dessa ou daquela pessoa, baseando-se apenas em seu sexo. Adeus, individualidade e diversidade.
No mundo que se convencionou chamar masculino, não há lugar para poesia, para emoções. Sensibilidade é uma capacidade indesejável, ligada a tudo o que é considerado inferior, ou seja, ao feminino.
A educação dirigida aos meninos é completamente diferenciada. Bonecas são brinquedos educativos para as futuras mamães, mas causam horror se manipuladas por meninos. O “instinto materno” é aprendido desde a infância, mas não se ensina o paterno (não à toa, se considera tão natural as mulheres ficarem com os filhos numa separação).
Homem não chora, é autossuficiente, não demonstra fragilidade e não leva desaforo pra casa. Se ele se irrita, agride pessoas, deve ser compreendido, porque, afinal, é apenas um. homem, infantilizado pela família e pela sociedade. Enquanto mulheresdividem com outras medos e frustrações, o homem se fecha. Do ambiente familiar, repleto de emocionalidades, resta a ele fugir. O bar e o álcool são o refúgio viril que a sociedade lhe dá.
É preciso rever certos conceitos. Isso passa pelos meios de comunicação de massa, que reforçam estereótipos e criam outros, à guisa de fazer “piadas inocentes”.
Nós, homens do século 21, somos seres pensantes. Não queremos prover ninguém, almejamos unir esforços. Se por acaso nossa renda for insuficiente ou nula, que nos respeitem. Gostamos, sim, de sexo, mas não pensamos nisso 24 horas por dia. Nos interessa o futebol mas também o balé, a música, a arte, a poesia. E choramos, sim.
Por isso, pedimos ao Conar que suspenda a propaganda da Hope e outras ridículas, não só por ofenderem nossas mães, filhas e esposas, mas por nos agredirem profundamente enquanto homens.

*FAUSTO RODRIGUES DE LIMA é promotor de Justiça do Distrito Federal e coautor do livro “violência doméstica – A Intervenção Criminal e Multidisciplinar”

quarta-feira, 5 de outubro de 2011


Áreas críticas na capital

24 de setembro de 2011 | 3h 06
O Estado de S.Paulo
O Shopping Center Norte foi construído em terreno onde antes havia um lixão. Durante anos foram ali despejados lixo doméstico e, acredita-se, também dejetos industriais. Conforme relatório da Cetesb, a concentração de metano no local atinge níveis que superam 5% da composição do ar, o que indica risco de explosão, até mesmo dentro das lojas. Pela área do centro de compras - que, além do shopping, reúne o Lar Center, o Expo Center Norte e o supermercado Carrefour - circulam 800 mil pessoas diariamente.
Há anos, a Cetesb adverte e multa os responsáveis pelo empreendimento, tentando levá-los a adotar medidas que afastem o risco de explosão no local. Em 2009 e 2010, a companhia emitiu duas autuações contra o Center Norte. Sem sucesso. Em maio passado, foi emitida multa no valor de 500 Unidades Fiscais do Estado de São Paulo (Ufesps) e, em agosto, os responsáveis foram novamente autuados em 1.000 Ufesps por não cumprimento das exigências feitas.
Diante da inércia da direção do shopping, a Cetesb incluiu o local em sua lista de áreas contaminadas críticas, passou a aplicar multas diárias e determinou que até o dia 25 seja apresentado à Prefeitura de São Paulo laudo técnico que ateste a implantação de sistema de extração de gases, de planos de monitoramento, comunicação e gerenciamento de risco e contingência. Caso as exigências não sejam cumpridas, o local poderá ser lacrado.
Há motivos de sobra para essa atitude rigorosa. Há dois meses, técnicos da Cetesb detectaram gás metano na área das 311 lojas existentes no Center Norte. Medidas urgentes foram exigidas, para dissipar os gases das galerias de telefonia, de águas pluviais, de fios elétricos, de esgoto e dos depósitos das lojas. Nada foi feito e, conforme o diretor de controle e licenciamento ambiental do órgão, Geraldo do Amaral Filho, existe risco de explosão nesses pontos.
Não há mais por que contemporizar, considerando-se que a área do Center Norte já havia sido inserida no Banco de Áreas Contaminadas em 2004, como informa a Cetesb em seu portal. Sete anos de espera e nenhuma medida foi tomada pelos empreendedores, nem mesmo neste ano em que o local foi incluído no grupo de áreas críticas. Cabe agora aos órgãos de Controle e Uso do Solo e ao Ministério Público do Estado de São Paulo a interdição do local, caso as exigências não sejam atendidas.
Nos últimos anos, não têm faltado estudos e advertências sobre as áreas contaminadas em todo o Estado. O último relatório da Cetesb aponta a existência de mais de 2,9 mil pontos críticos. A atividade mais poluidora é a dos postos de combustível, vindo em seguida a das indústrias. O controle dessas áreas é de grande importância para que se evitem problemas de saúde para a população e o comprometimento da qualidade das águas. Além da sua identificação, o apoio da Cetesb permitiu que mais de 900 desses locais fossem descontaminados.
A desconcentração industrial iniciada a partir de meados da década de 70 deixou na cidade de São Paulo um grande número de terrenos abandonados e contaminados. E muitos desses locais se tornaram pontos nobres no mapa imobiliário. A especulação passou por cima da segurança e edifícios foram erguidos aceleradamente sem a mínima preocupação com a qualidade ambiental.
Um dos casos mais conhecidos é o do Condomínio Residencial Barão de Mauá, no Parque São Vicente, no município de Mauá, construído em um antigo aterro industrial clandestino. Há dez anos, uma explosão em caixa d'água subterrânea chamou a atenção para o problema. De lá para cá, os moradores dos 54 prédios vivem em constante alerta. A Cetesb espera por medidas concretas dos responsáveis que, até agora, não cumpriram as suas exigências. Por isso, ela recomendou há poucos dias a remoção de 1,7 mil famílias que vivem no local.
Ou as exigências da Cetesb, nesse e em outros casos semelhantes, são prontamente atendidas ou não haverá como evitar tragédias.