quarta-feira, 13 de julho de 2011

O financiamento dos partidos


07 de maio de 2011 | 0h 00
- O Estado de S.Paulo
A democracia não tem preço, mas tem custo. Como a existência de partidos políticos é essencial para a democracia e exige dinheiro, a questão do financiamento da vida partidária se torna uma das mais complexas e delicadas para o funcionamento dos sistemas democráticos de governo, principalmente porque, em qualquer lugar do mundo, a relação política/dinheiro implica sempre problemas muito delicados, para dizer o mínimo. Nos países em que as instituições democráticas se assentam sobre bases mais sólidas, qualquer que seja a modalidade de financiamento partidário adotado - público, privado ou misto -, a regulamentação, a transparência e a fiscalização garantem a legitimidade do sistema.
No Brasil, este é um dos maiores nós em que a atividade político-partidária está enredada, porque, além de o modelo misto de financiamento em vigor estar sob permanente questionamento, a regulamentação é confusa, a transparência é muito relativa e a fiscalização, deficiente.
A receita dos partidos políticos brasileiros provém, basicamente, de três fontes: doações de pessoas físicas e jurídicas; fundo partidário, provido pelo governo; e contribuição paga pelos filiados. A maior aberração desse sistema, contudo, está no fato de que o grosso dos recursos doados às legendas provém de pessoas jurídicas, de empresas, o que acaba se constituindo numa porta escancarada para a corrupção. Seria ingênuo imaginar que essas doações são feitas sem pensar em algum tipo de contrapartida. Segundo levantamento divulgado pelo TSE, do total de R$ 722,7 milhões de receita obtidos em 2010 pelos 12 maiores partidos políticos, R$ 507,9 milhões, mais de 70%, foram doações de empresas. Além disso, das quase 20 mil empresas que declararam ter feito doações aos partidos, cerca de 4 mil, 20% delas, desrespeitaram o limite legal máximo e fizeram doações num total de R$ 142 milhões, superiores a 2% de seu faturamento bruto informado no ano anterior. Tanta generosidade não é motivada, certamente, por espírito cívico.
Além da natural propensão de doadores e beneficiados de serem discretos nessas transações, a lei deixa brechas que são exploradas em prejuízo da desejável transparência no financiamento dos partidos. Na prestação de contas devida ao TSE, os partidos identificam os doadores de recursos. Mas não são obrigados a revelar o destino específico desse dinheiro, que em sua maior parte não é usado diretamente pela direção nacional da legenda, mas repassado a diretórios regionais e municipais e também diretamente a candidatos. Assim, descartado o caso de uma doação feita diretamente ao interessado, é impossível saber qual candidato foi beneficiado pela doação de uma empresa.
Do fundo partidário, os 12 maiores partidos receberam em 2010 pouco mais de R$ 173 milhões. E a receita proveniente da contribuição de filiados foi de R$ 7,7 milhões. Por outro lado, o levantamento do TSE revela que o montante de doações feitas aos partidos por pessoas físicas não chegou à casa dos R$ 26 milhões em 2010, o que é pouco mais de 5% do total de recursos cedidos às legendas no âmbito privado.
Esses números revelam que o financiamento partidário no Brasil está ainda muito distante do modelo preconizado por estudiosos como o mais adequado ao exercício pleno de um sistema político-eleitoral que tenha na transparência a maior garantia de sua legitimidade. Esse modelo é o do financiamento privado feito exclusivamente pelas doações de pessoas físicas, em limites estabelecidos pela lei. É um sistema que cria um vínculo forte entre os partidos e seus eleitores e elimina os inconvenientes do financiamento público, sempre vulnerável ao casuísmo dos poderosos de turno, bem como acaba com a prevalência dos interesses obscuros inerentes às doações de corporações empresariais. A questão que se coloca é a de que até que ponto o cidadão brasileiro se animaria a se transformar no maior responsável pelo financiamento de uma atividade que geralmente não vê com bons olhos. Mas é preciso pensar num modelo que controle o dinheiro, e não o contrário. 

Necessidade de aporte chega a R$ 10 bi


De acordo com associação das empresas, são necessárias mais de 700 obras no País para elevar a velocidade média dos trens em até 35%

15 de maio de 2011 | 0h 00
Renée Pereira - O Estado de S.Paulo
De olho no problema da baixa velocidade nas ferrovias brasileiras, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) elaborou o Programa de Segurança Ferroviária (Prosefer), que será entregue ao Ministério dos Transportes dentro de 15 dias. De acordo com fontes do setor, o plano prevê investimentos de R$ 7 bilhões, sendo R$ 5 bilhões até 2015.
O montante será aplicado na construção de contornos ferroviários em grandes cidades, viadutos e pontes, instalação de nova sinalização, melhorias em faixas de domínio e travessias de áreas urbanas - o valor não inclui o projeto do Ferroanel de São Paulo, que há anos está em estudo pelos governos federal e paulista. Foram detectados mais de 200 locais passíveis de obras. A dúvida é de onde sairá todo esse dinheiro e quando as obras seriam iniciadas para desafogar a malha nacional.
A Associação Nacional de Transporte Ferroviário (ANTF) prevê números maiores para melhorar a produtividade das estradas de ferro brasileiras. São 728 obras num total de R$ 10,2 bilhões, afirma o diretor da associação, Rodrigo Vilaça. O volume seria suficiente para ampliar entre 30% e 35% a velocidade média dos trens no Brasil. "Mas, em alguns trechos, o indicador pode dobrar."
Embora esteja fora dos investimentos previstos, a construção do Ferroanel de São Paulo, que acabaria com a passagem de trens de carga na metrópole, poderia significar um aumento de cerca de 80% na produtividade do trecho paulista. O projeto do empreendimento está sendo refeito e está previsto para ser concluído ainda este ano.
Os R$ 10,2 bilhões deveriam ser aplicados pelo governo federal, mas as concessionárias estão dispostas a fazer o investimento. Exigem, é claro, uma contrapartida, e bem alta. Vilaça propõe que, em troca das obras realizadas, as empresas tenham um alongamento do prazo de concessão. "O mais factível seria começar de novo", diz ele. Ou seja, depois de terminar o atual prazo contratual, as companhias teriam mais 15 anos de concessão.
Obras. A necessidade desses investimentos não é assunto novo. Há alguns anos, as empresas discutem com o governo uma forma de realizar as obras. Umas das primeiras propostas apresentadas pela ANTF foi reverter o valor pago ao governo pelo arrendamento para os projetos. As concessionárias também reivindicavam o repasse de recursos da Contribuição para Intervenção do Domínio Econômico (Cide) para as ferrovias. Nenhuma das alternativas foi adotada e hoje o setor vive um momento crítico, afirma o presidente do Instituto de Logística e Supply Chain (Ilos), Paulo Fleury.
Ele destaca que, desde o início das privatizações, no fim da década de 90, muitas melhorias foram promovidas. Uma delas foi a redução do número de acidentes. Até o final de 2009, quando foi divulgado o último balanço do setor, esse índice havia tido uma redução de 80%, conforme levantamento do Ilos. O volume transportado teve um salto de 77% e o faturamento das empresas cresceu quase cinco vezes.
Mas, apesar dos avanços, as ferrovias ainda estão abaixo da necessidade, diz o secretário-geral da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), Fábio Trigueirinho. "A ferrovia precisa ser mais eficiente para atender a demanda crescente." Hoje, isso não tem ocorrido plenamente. 


terça-feira, 12 de julho de 2011

Tchau, queridinho



12 de julho de 2011 | 8h00
José Paulo Kupfer
Já é bem nítido, pelo aumento da frequência das manifestações na imprensa especializada estrangeira, que os analistas financeiros internacionais começam a se preocupar com a economia brasileira. De pouco mais de um mês para cá, pipocam artigos e editoriais a respeito da formação de possíveis bolhas de crédito no Brasil. Há seis meses, esse tipo de avaliação, agora crescentemente repetida, era impensável.
São, até aqui, na grande maioria, análises exageradas, muito centradas em modelos de avaliação transportados mecanicamente de seus atribulados mercados de origem. Do ponto de vista da regulação e da prudência, não há termo de comparação entre o sistema bancário brasileiro e os sistemas americano ou europeu, infestados de “inovações” financeiras, a partir dos quais são elaboradas essas avaliações.
Para começo de conversa, o controle exercido pelo Banco Central brasileiro sobre as instituições financeiras daqui é muito mais rígido, exigindo a observância de uma relação de pelo menos 11% entre os ativos e o capital mínimo, acima da norma internacional, que é de 8%. Nosso sistema bancário, um pouco também por essa razão, é pouco dado a “inovações” e mantém a quase totalidade dos empréstimos em carteira. Os esquemas de securitização são mínimos, assim como as possibilidades de contágio com o exterior, em virtude da inexistência de distribuição global de créditos securitizados. Se, enfim, é fato que a inadimplência vem crescendo e o crédito expandiu-se muito rápido nos últimos tempos, os atrasos ainda estão dentro de limites aceitáveis e as linhas de financiamento com maior aceleração – consignado e veículos – são as que demandam maiores garantias.
Exageros à parte, há, sem dúvida, uma mensagem que merece atenção nessas análises descabeladas. Os ventos que, nas asas de um excesso de liquidez internacional, em meio a crises potentes nos grandes mercados financeiros maduros, trouxeram para cá investidores e especuladores de todos os cantos do mundo podem estar começando a dar sinais de virada.
Não seria a primeira vez e os que têm tempo de estrada se recordarão de que, antes de ser exceção, essas viradas são uma regra no mundo financeiro global. Anos e anos de recorrentes crises da dívida externa, nas três décadas que vão da reciclagem dos petrodólares, nos anos 70, ao estouro de bolhas dos anos 90 e início do novo século, resultaram numa prosaica norma de seleção dos mercados, nos quais, a cada momento, era o caso de apostar todas as fichas ou abandonar de uma vez.
Na América Latina, Brasil, México e Argentina, as três maiores economias da região, se revezaram, nesse período, nas posições de “queridinho”, “pária” ou “limbo”, obedecendo a uma espécie de “teoria pendular da dívida”. O pêndulo oscilava para o lado de uma enxurrada de dólares numa das três economias, em geral sob o impulso inicialmente favorável da aplicação de receitas do FMI. E virava para o lado do colapso prolongado de recursos externos e do estigma na comunidade financeira internacional quando, a partir do esgotamento das políticas antes louvadas, sobrevinha uma volta da inflação, muitas vezes seguida de moratórias.
É certo que as histórias não se repetem exatamente como já ocorreram, mas quando uma economia emergente em posição de “queridinha” começa a apresentar vazamentos, não custa colocar as barbas de molho. A economia brasileira pode estar vivendo, mais uma vez, agora numa escala mais global, a velha e incômoda situação de ver o pêndulo começar a virar para o outro lado. Até por questão de prudência, o governo não deveria ficar de braços cruzados, conformado com a falta de condições estruturais completas para evitar refluxos desastrosos numa virada do pêndulo – ou relaxado, a partir de análises estáticas, com uma quem sabe enganosa blindagem das contas externas.
Faz todo o sentido, portanto, o alerta do presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, em depoimento no Congresso, semana passada, a respeito da possibilidade de viradas abruptas no mercado cambial e da necessidade de reforço da proteção, pelas empresas e pessoas, contra eventos desse tipo. A decisão de induzir, com novas regras, uma redução das apostas dos bancos em novas valorizações do real frente ao dólar, anunciada em seguida, é uma indicação bem-vinda de que a autoridade monetária está atenta aos terríveis choques que possam ser provocados por alguma versão revista e atualizada da vetusta “teoria do pêndulo”.