quinta-feira, 6 de julho de 2023

Thiago Amparo- Por trás do deepfake da Elis, FSP

 Não quero lhe falar, meu grande leitor, das coisas que aprendi nos comerciais da TV, por mais emocionantes que possam ser e de fato o são. Quero lhe contar, em vez disso, como muitos não sobreviveram à ditadura e tudo o que aconteceu com eles, inclusive envolvendo empresas. "Na hora em que cheguei à sala de segurança da Volkswagen, já começou a tortura, já comecei a apanhar ali, comecei a levar tapa, soco", depôs um ex-funcionário da Volks.

Em 2020, a Volks se comprometeu a pagar R$ 36,3 milhões para ex-funcionários presos, perseguidos ou torturados durante a ditadura. E as aparências de hoje não enganam as complexidades de outrora. É sinal muito bem-vindo de maturidade jornalística esta Folha ter publicado no domingo (02) texto em que discorre, em detalhes, sobre o papel do jornal durante a ditadura militar, incluindo as ambiguidades e incertezas ali abertas.

Tecnologia seduz, porém ainda não foi capaz de tornar a filosofia obsoleta, mas sim imprescindível. Na revista acadêmica Filosofia e Tecnologia, alguns desses questionamentos emergiram. Qual é o conhecimento que deepfakes transmitem, pergunta um autor. Seria o mal específico do deepfake a possível rejeição do conteúdo pela pessoa, já falecida, pergunta outra autora. Os desejos da família suprem ou não os desejos de quem já não pode mais oferecer a sua vontade? A quem atribuir direitos autorais?

Preservar a memória é melhor do que sonhar. Eu sei que se emocionar é uma coisa boa, mas também sei que qualquer imagem é menor do que a vida de qualquer pessoa, mesmo no país que faz da amnésia o seu hino nacional. Pode-se gostar do comercial esteticamente ou não; A pergunta da qual não podemos nos esquivar é se, apesar de termos feito tudo que o fizemos, a nossa imagem sobreviverá a nós ou não, contando vil metal. Falta inteligência à artificial para resolver as dúvidas éticas que os deepfakes impõem; apresentá-las faz, de nós, humanos e não máquinas.

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