A decisão do Comitê de Direito Humanos da ONU sobre o julgamento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi uma lição para o Brasil e, em particular, para o Poder Judiciário e para o Ministério Público.
O teor das 35 páginas, subscritas por profissionais independentes e de elevada reputação internacional, pode até representar uma reparação de cunho moral; a decisão, contudo, está longe de reparar a indignação de quem se sente injustiçado.
Além de um julgamento desvirtuado do ponto de vista jurídico —por ser conduzido com o objetivo de efetuar uma persecução política, não penal—, segundo o comitê da ONU, descobre-se que o despautério não ficou apenas constrito às salas dos tribunais brasileiros. Eivada de lisura foi, também, a periclitante atuação do governo Jair Bolsonaro (PL), que não hesitou em efetuar diversas investidas junto aos integrantes do comitê para impedir um resultado favorável ao ex-presidente.
A Delegação Permanente do Brasil em Genebra envidou renitentes e vergonhosos esforços, buscando interferir nos trabalhos do comitê que analisava a procedência da postulação de Lula. A diplomacia brasileira foi mobilizada para atuar na desconstrução da defesa do ex-presidente —competência legal que não lhe cabe.
A instrumentalização do Itamaraty pelo governo Bolsonaro não apenas atentava contra o legítimo direito ao contraditório sobre a parcialidade da atuação de agentes públicos, mas, sim, buscava obstruir o avanço dos trabalhos do comitê da ONU.
Torpe, ideológica e indecorosa, a diplomacia do atual governo expôs o Brasil a mais um capítulo obsceno nas relações internacionais —exime-se aqui o atual embaixador brasileiro à frente daquela delegação, que nada a ver teve com o início da empreitada. Não bastasse a desonra ao Estado brasileiro e ao seu povo, por meio de discursos presidenciais anódinos que, desde 2019, da maior tribuna geopolítica (a das Nações Unidas), fazem o Brasil se envergonhar diante do mundo, a diplomacia bolsonarista ornamentada com o seu inapagável requinte de hipocrisia e de incompetência colocou-se a prestar um serviço de afronta ao devido processo legal.
Apesar de a atuação diplomática contra o recurso do ex-presidente Lula não ter inspirado seriedade e tampouco credibilidade, é a imagem do país nos corredores da ONU que saiu desgastada. Tratava-se de uma nova persecução política por meio do aparato, desta vez, do Poder Executivo.
Além de uma política exterior desfocada do interesse nacional, a decisão dos integrantes do comitê da ONU representa uma repreenda ao Brasil. Quando as instituições e agentes públicos se aproveitam de instrumentos e dispositivos travestidos com colorações da legalidade para subjugar os direitos civis e políticos de seus concidadãos, colocam a segurança jurídica em risco.
A vitória moral nas Nações Unidas de Lula, do PT e de seus competentes advogados já repercute nos principais centros de pensamento, nos EUA e na Europa, como caso concreto de "lawfare". Além de ser uma decisão histórica, é uma vitória de todos que acreditam na democracia.
O povo, que busca um futuro governo de viés mais democrático e menos autoritário, mais humano e menos aterrador com a saúde pública, mais preocupado com a geração de emprego e menos com "motociata", mais focado na inclusão econômica e na redução da desigualdade do que em indultos que subvertem a ordem jurídica e o Estado de Direito, sabe que a escolha não será difícil.
Do finado ex-chanceler ao atual chanceler, as linhas da política exterior são praticamente as mesmas. Qualquer mudança concreta e real, enfim, somente se dará com a chegada de um novo mandatário ao Palácio do Planalto a partir de 2023.
Precisamos de um Poder Judiciário e de um Ministério Público livres de justiceiros e desimbuídos de ideologias, de uma diplomacia séria, profissional e digna de sua história e tradições —e o Brasil precisa, mais cedo do que nunca, de um novo presidente que dê rumo ao país e que resgate a sua normalidade democrática e credibilidade internacional.
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