terça-feira, 24 de maio de 2022

Cassação de vereador que disse 'coisa de preto' vira meta de chefe da Câmara de SP, FSP

 Carlos Petrocilo

SÃO PAULO

Presidente da Câmara Municipal de São Paulo, o vereador Milton Leite (União Brasil) se juntou às centenas de pessoas que, na manhã de quinta-feira (19), pediam a punição do seu colega Camilo Cristófaro (Avante), acusado de racismo.

A poucas horas do início da sessão da Corregedoria que aprovou a abertura do processo que pode cassar ou afastar temporariamente Cristófaro, Leite subiu em um caminhão de som estacionado em frente à Casa e agitou os manifestantes. "Não vamos admitir em nenhum lugar atitudes racistas."

Desde o dia em que Cristófaro afirmou "não lavaram a calçada, é coisa de preto" em uma sessão da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) dos Aplicativos, o presidente da Câmara, que se declara negro, tem como uma das prioridades cassá-lo.

Close de Leite, que apoia a cabeça sobre as mãos cruzadas, em sinal de preocupação
O presidente da Câmara Municipal de São Paulo, Milton Leite (União Brasil) - Danilo Verpa - 7.mar.2018/Folhapress

Ele tem se articulado para isso, se reunindo com os demais parlamentares e depositando confiança na pressão da opinião pública em ano de eleições.

​A ficha com as confusões de Cristófaro é extensa. Ele acumula mais de dez pedidos de investigação na Corregedoria, sendo dois por denúncias de racismo cometidas, respectivamente, em 2018 e 2019.

Isolado na Casa, Cristófaro partiu para um ataque virtual contra o presidente, além de gravar vídeos com aliados e assessores negros para negar que seja racista.

O vereador investigado abastece uma lista de transmissão pelo WhatsApp com reproduções de notícias que veiculam expressões racistas ditas pela apresentadora Ana Maria Braga e o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Luís Roberto Barroso. Ambos usaram o termo "inveja branca".

O presidente da Casa já teria exposto o seu desejo, inclusive, ao prefeito Ricardo Nunes (MDB). Segundo a legenda de um vídeo compartilhado por Cristófaro, Leite disse a Nunes que iria "mandar o Camilo embora". O prefeito balança a cabeça em sinal de aprovação.

O parlamentar do Avante disparou o vídeo em sua lista de transmissão e ao grupo da Câmara, que reúne os 55 parlamentares.

"O presidente da Câmara Municipal se diz o dono da egrégia Casa e da Corregedoria", escreveu Cristófaro. "Pura campanha política para ele e seus filhos, será que ninguém enxerga isso?"

Leite contra-atacou com áudios aos vereadores paulistanos. "Perco qualquer coisa nesta vida, mas não a dignidade e o respeito diante da minha raça", falou o presidente.

"Não é Vossa Excelência exibindo vídeo ou áudio para quem quer que seja que vai me frustrar ou [me fazer] deixar de trabalhar para cassar o seu mandato, porque Vossa Excelência desrespeitou uma lei vigente neste país."

Filho do presidente da Câmara paulistana, o deputado federal Alexandre Leite (União Brasil) foi quem protocolou uma das quatro denúncias contra Cristofáro à Corregedoria em razão da expressão "coisa de preto".

O deputado classificou a atitude do parlamentar como indecente, desrespeitosa e criminosa. "Temos de ser enérgicos, contundentes e intolerantes no combate ao racismo e, por isso, recomendamos a cassação do vereador."

As outras três denúncias à Corregedoria foram apresentadas pelas vereadoras Luana Alves (PSOL) e Sonaira Fernandes (Republicanos), que são negras, e por uma moradora de São Paulo.

Na queda de braço, Leite levou o primeiro round ao emplacar a vereadora Elaine Mineiro (PSOL), da bancada coletiva Quilombo Periférico, como a relatora do caso na Corregedoria.

A Corregedoria é um órgão independente, e a escolha do relator é uma prerrogativa do corregedor-geral, o vereador Gilberto Nascimento Júnior (PSC). Segundo a assessoria de Nascimento Júnior, Leite o consultou somente para saber quem estaria à frente no rodízio para assumir a relatoria do caso de Cristófaro. O corregedor, então, respondeu que seria a vez de Elaine e confirmou que a indicaria.

Outra solicitação do presidente ao corregedor foi a de agilizar o processo, que costuma se estender por meses. Empossada como a relatora na terça (17), Elaine apresentou dois dias depois o seu relatório pedindo a cassação ou a suspensão do mandato. O caso de Cristófaro, inclusive, entrou de última hora na pauta da reunião da Corregedoria na quinta.

Cristófaro chegou a pedir a suspeição de Elaine, mas o órgão recusou.

Minutos após os vereadores decidirem, por 6 votos a 0, pela abertura do processo que pode levar à cassação, Leite confirmou que a votação no plenário será nesta terça (24).

Conforme o regulamento da Câmara, o relatório de admissibilidade, elaborado por Elaine, precisa ser aprovado por maioria simples (28 dos 55 vereadores).

Caso isso ocorra, Cristófaro será convocado a apresentar a sua defesa.

A Corregedoria, então, deverá decidir se mantém Elaine para conduzir o relatório que pode sugerir a cassação, a suspensão ou a absolvição do vereador. Dessa vez serão necessários dois terços dos votos da casa, o equivalente a 37 vereadores.

Os únicos parlamentares cassados pelo legislativo paulista foram Vicente Viscome e Maeli Vergniano, ambos em 1999. Viscome foi acusado de ser um dos comandantes da Máfia dos Fiscais, na gestão Celso Pitta (1993-1996), e morreu em novembro de 2021. Já Maeli perdeu o mandato pelo uso indevido de um carro cedido por uma empreiteira que realizava coleta de lixo na cidade.

Erramos: o texto foi alterado

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