sábado, 5 de dezembro de 2020

Análise da política não é 'ciência de foguete', mas... FSP

 

George Avelino

Professor, doutor em ciência política pela Universidade de Stanford (EUA) e coordenador do Centro de Política e Economia do Setor Público da Fundação Getulio Vargas-SP (FGV Cepesp)

Com o término das eleições, este é o último artigo da coluna Voto a Voto. Durante 12 semanas, os pesquisadores do FGV Cepesp procuraram demonstrar a importância da análise baseada em evidências para a melhor compreensão das eleições e do nosso sistema político, explorando as regularidades apresentadas pelos dados.

Naturalmente, essas análises serão mais precisas quanto maior for a quantidade de dados. A boa nova é que esses dados começam a estar organizados e acessíveis.

Os artigos desta coluna também partiram de um pressuposto simples: os políticos são atores racionais e coletivamente respondem a incentivos, o que permite prever suas ações com razoável grau de acerto. Por exemplo, retornando ao primeiro artigo, a aposta foi que a pandemia, ao restringir a campanha eleitoral, daria maior vantagem aos prefeitos, encorajando-os a reverter a tendência declinante no número dos que tentavam se reeleger e eram bem-sucedidos na empreitada.

Assim, em 2020, dos 4.280 prefeitos eleitos em 2016 que poderiam se recandidatar, 3.214 (75,1%) o fizeram e, desse grupo, 1.993 (61,5%) foram bem-sucedidos. Ao longo das quatro eleições, é possível observar que a queda tanto nas tentativas de reeleição como no sucesso se reverteu em 2020, retomando padrão similar à 2008. Portanto, dadas as circunstâncias da pandemia, a reeleição dos prefeitos foi uma marca esperada destas eleições.

Além da pandemia, outro aspecto importante foi o fim das coligações para as eleições legislativas —vereadores e deputados. O fim das coligações afeta as chances dos partidos de atingirem a cláusula de barreira em 2022 para acesso aos fundos públicos, determinada principalmente pelo desempenho nas eleições para deputado federal. Como as eleições para deputados sofrem influência das eleições municipais, o fim das coligações criou incentivos para que os partidos lançassem mais candidatos, acarretando o recorde de mais de 500 mil! Ao mesmo tempo, vários candidatos estimaram que seus partidos não teriam condições de superar a cláusula de barreira em 2022 e já mudaram de partido, resultando na redução das coligações para prefeito e no número de partidos lançando candidatos a vereador. Estes últimos pontos sugerem que os políticos têm estimadores sobre o futuro e agem de acordo com eles, tal como qualquer um de nós.

Sendo assim, o que esperar para as eleições de 2022? Seria possível sugerir pelo menos dois pontos. Primeiro, como essas eleições apenas remanejaram os resultados entre os vencedores de 2016, com alguns ganhos para os partidos do centro e direita do espectro ideológico e perdas para a esquerda, a Câmara dos Deputados eleita deverá ser parecida com a atual, exceto pela esperada redução no número de partidos, determinada pela cláusula de barreira, e o encolhimento da bancada do PSL pela saída de Bolsonaro. O segundo é que alguns partidos conhecidos como o PC do B, a Rede e o Novo estão em má posição para atingir a cláusula de barreira.

Voltando ao início, sabemos ser impossível extrair da análise política a precisão que caracterizam outras ciências, particularmente as “ciências de foguete”. Entretanto, o uso de dados e pressupostos simples nas análises podem tornar a política bem mais compreensível e, esperamos, igualmente apaixonante.

Voto a Voto

Esta coluna é uma parceria da Folha com o Centro de Política e Economia do Setor Público da Fundação Getúlio Vargas (FGV Cepesp).

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