Antes da internet, era impossível pensar na importância de um analista de mídias sociais ou de um redator especializado na experiência do usuário durante a navegação de um site. Hoje, essas e outras frentes digitais vêm absorvendo uma mão de obra que não é graduada especificamente na área, mas que se adaptou para ocupar postos de trabalho criados pela internet.
A guinada na carreira – ou “pivotagem”, como é chamada no jargão corporativo – pode até ser considerada uma estratégia de sobrevivência, já que, para especialistas, quem não se adaptar vai acabar sendo preterido no mercado de trabalho.
Por isso, vai ser cada vez mais comum encontrar gente como Egnalda Côrtes, que largou a carreira em vendas para assessorar criadores de conteúdo negros. Ou como Daniel Laurentino, que mal pegou o diploma em Design e foi programar aplicativos. Ou também Camila Gaidarji, que durante o antigo emprego percebeu um nicho de mercado se abrindo e foi estudar por conta própria sobre UX (user experience) para participar da novidade. Tem também Jéssica Souza, que descobriu a área de tecnologia durante a faculdade de Engenharia Elétrica e Eletrônica e hoje atua como cientista de dados.
Para entender a dinâmica da criação de carreiras no mundo digital, é necessário voltar à década de 1980. Foi durante a “década perdida” que aumentou a demanda por profissionais da área de computação, explica Tania Casado, professora titular da Universidade de São Paulo (USP) e diretora do Escritório de Carreiras (ECar). A principal tarefa deles, conta, era automatizar funções para auxiliar empresas a reduzir o quadro de funcionários.
As tecnologias foram ficando sofisticadas e fizeram muitas carreiras desaparecerem nos últimos 30 anos. Por outro lado, inúmeras frentes de trabalho em diferentes áreas foram criadas graças às inovações.
“Não é só o profissional que desenvolve o aplicativo que tem emprego, o que faz uso também tem”, fala Tania. A pandemia pode ter acelerado a necessidade de estar nas redes sociais e oferecer serviços online, um movimento que parece não ter volta.
Segundo o ranking dos dez profissionais mais procurados pelas empresas, feito pelo LinkedIn entre junho e julho, nove estão diretamente ligados à área de tecnologia. No começo do ano, a rede social profissional também havia divulgado uma lista com as 15 profissões emergentes no Brasil, das quais nove estavam diretamente relacionadas à tecnologia da informação (TI).
Uma das principais áreas beneficiadas por essa tendência é a de desenvolvimento de novas tecnologias. Além da criação de softwares, a expansão do mercado exige profissionais que lidem com cibersegurança, infraestrutura e análise de dados.
Entre 2007 e 2019, a quantidade de empregos em TI no País saltou de 241 mil para 472 mil. Os dados são de um estudo feito pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) com a Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação do Paraná (Assespro-PR).
Adriano Krzyuy, presidente do Assespro-PR, afirma que a TI segue crescendo porque é um vetor de desenvolvimento para os demais setores. “Você aplica a TI na medicina com a telemedicina, no varejo com o delivery, na diretrização na indústria com a Indústria 4.0”, cita.
Nessa transformação digital, o conceito de interdisciplinaridade fica mais forte. A Ciência de Dados, exemplifica Krzyuy, demanda um conhecimento em estatística profundo. “Engenheiros, por exemplo, têm um domínio fortíssimo em matemática, física e estatística. Eles teriam uma pré-disposição para migrar”, explica.
Geração redes sociais
No ano passado, os brasileiros gastaram uma média de 3h40 por dia no smartphone, segundo uma pesquisa da consultoria App Annie. O mesmo estudo revela que o tempo gasto em aplicativos de compras cresceu 30% entre 2018 e 2019 no País. Com tanta gente online, criar uma carreira na internet ou usá-la para vender mais pode ser uma solução acertada.
Tania, da USP, ressalta que o consumidor não quer mais perder tempo no trânsito para ter acesso a algum serviço. Por isso, oferecer soluções online pode abrir novas oportunidades de negócio. Para construir uma boa rede de trabalho e se apropriar do espaço oportunizado pela mídias sociais, ela diz que o profissional precisa ter agilidade, ser capaz de executar várias tarefas simultaneamente e se articular bem. “Na internet, você está mais aberto a novas conexões que exigem respostas rápidas.”
Além disso, a habilidade de interpretar as emoções e as mensagens na internet fica ainda mais importante, segundo o diretor de marketing Vinícius Taddone, pois, por mais que os chatbots tenham vindo para otimizar os serviços, ninguém gosta de ser atendido por um robô.
“É preciso ter a habilidade de fazer a leitura dos comentários nas redes sociais. Quando uma pessoa comenta com um emoji de palminha, será que ela está batendo palmas porque gostou ou está sendo sarcástica?” E essa interpretação os robôs ainda não fazem.
Vem pensar com a gente
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