Sexta-feira, antevéspera de votação. Guilherme Boulos, a estrela vermelha da eleição, pegou Covid. Algumas pessoas sextando, outras fritando Paulo Guedes. Os remediados compravam coisas para este Natal pobrezinho naquela promoção importada dos Estados Unidos.
Pouca gente normal presta atenção às estatísticas de emprego, ainda menos em uma sexta-feira assim. No máximo, viram aquelas manchetes satisfeitas com as palavras “recorde” ou “desemprego histórico”, essas coisas.
Mas tinha notícia menos ruim naqueles números deprimentes do IBGE. Pela primeira vez desde o começo da epidemia, aumentou o número de pessoas com algum trabalho (em 798 mil); até o emprego formal aumentou. Pelo terceiro mês seguido, aumentou o que os economistas chamam de “massa salarial”, a soma dos rendimentos do trabalho de todo o mundo naquele mês (pelo critério de rendimento efetivo).
O desemprego não aumentou? Sim, para 14,6%, o tal recorde, de fato horrível. Mas taxa de desemprego é uma proporção: o número de pessoas que procuram trabalho, sem sucesso, dividido pelo número de pessoas na força de trabalho (grosso modo, as empregadas mais aquelas à procura de emprego, sem sucesso).
É um número essencial sobre o trabalho, mas não o único. Além do mais, a taxa de desemprego vai ficar por aí, em torno de 14%, no ano que vem. Mas o número de pessoas com trabalho pode aumentar (assim como o número de pessoas procurando emprego).
Em setembro, a massa salarial ainda estava R$ 22 bilhões abaixo do que era no mesmo período do ano passado (queda de mais de 10%). Mas esse buraco ainda é coberto pelos pagamentos de auxílios emergenciais e do Benefício Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda (o BEM).
Até aqui se tratou do copo “meio cheio”, na verdade umas gotas de chuva limpa no copo muito sujo da crise.
De maio a agosto, o governo pagou, em média, R$ 49,7 bilhões por mês de auxílio emergencial e BEM. Em setembro, R$ 27,5 bilhões. Em outubro, R$ 24,1 bilhões. Em janeiro, desse total vão sobrar só os R$ 3 bilhões do Bolsa Família (incluído nessa conta). Até lá, para não haver um baque no consumo e um tombo muito ruim na vida dos mais pobres (tombo haverá), a massa salarial tem de crescer para compensar o buraco deixado pelos auxílios.
Problemas:
1) os próprios auxílios ajudam a criar trabalho. Não se sabe qual será o ritmo de recuperação do emprego com a redução desses pagamentos;
2) muita empresa não está demitindo porque fez contratos de estabilidade temporária ao reduzir salários (em parte pagos pelo BEM). Quando acabar esse prazo, o que vai ser? Nota-se pelas estatísticas do emprego formal que o número de demissões anda anormalmente pequeno (trata-se aqui do Caged, registros de admissões e demissões, não os do IBGE);
3) os trabalhadores que mais perderam emprego na epidemia foram os informais (empregados sem carteira ou por conta própria sem CNPJ) e os domésticos (1,6 milhão a menos de empregos, queda de 26% desde o início da epidemia, um massacre). São justamente os mais pobres, os que dependem mais do auxílio e os que terão dificuldades de arrumar algum bico até que a epidemia se dissipe. É o copo cheio e sujo de desigualdade, que vai piorar;
4) apesar da melhora de setembro, o número de pessoas ocupadas ainda era 11,2 milhões menor que em fevereiro e 11,3 milhões menor que em setembro do ano passado;
5) faltam na prática só três semanas, até o Natal, para se arrumar algum auxílio para os novos pobres e miseráveis.
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